quarta-feira, 16 de outubro de 2013

ALAPINI BABA AWA A NKI OO

Por Felix Ayoh'OMIDIRE
Ile-Ifé, Nigéria.

 

  
Mãe Senhora, Iyalorixá Oxun Muiwá

Ha! Erin wo! Erin mawo o! Mestre Didi Alapini, omo Mae Senhora lo nile yi igi da!
Ka too r'erin o digbo,
Ka too r'efon o dodan,
Ka too tun reeyan alawo dudu bii ti Mestri Didi laarin awon iran eniyan dudu ni Latin América, o dorun alakeji.
Mestre Didi, boo dele o kile o,
Boo dona o beere ona,
Ma jokun, ma jekolo o, omo Asipa nilee Ketu, ohun tiwon ba nje lajule orun nii koo bawon je...

Os nossos mais velhos na tradição iorubana ensinam que a morte (iku) não é o fim da existência, se não uma mudança de estado - mudando de mortal para imortal, e, no caso de iniciados, de omo orixá para um ancestral que será responsável doravante para vigiar e velar desde o orum (o além) os passos de seus descendentes que permanecem neste plano (o aiye).
 Eis a nossa consolação maior diante do falecimento do nosso baba Mestre Didi Alapinni, guia e guardião da tradição nagô-iorubana na Bahia e sacerdote-mor do culto aos Egungun. 



Mestre Didi Axipá, Alapini

Portanto, quem saiu vencedor do encontro entre Mestre Didi e iku (a morte) no ultimo dia 6 de outubro foi o grande sacerdote Alapinni, pois a partir dessa data, o filho de Mae Senhora hoje integra o panteão dos orixás e ancestrais do nosso povo. De agora em diante, as múltiplas Ile Axe da Bahia e de todo o Brasil já contam com mais um ancestral de grande peso para defende-las e guiar seus esforços na promoção e preservação dos valores da tradição nagô-iorubana nos quatro cantos dessa nação. Além do mais, lembremos, como mais um consolo nosso, que o nome original da terra africana, de onde saiu os genitores Axipa de Mestre Didi no reino iorubano de Ketu chama-se "Kosiku", ou seja, não ha morte!
Portanto, para pessoas como Mestre Didi, a morte não existe! 
Como se costuma dizer quando falece um rei entre os povos nagôs da atual Republica do Benim (antigo Daomé, onde se localiza hoje o reino de Ketu), o rei não morre, ele simplesmente "volta para Ile-Ife" a casa de seus pais, a origem do mundo iorubano.



Escultura Tradicional representando os Reis de Ifé, Oni Ifé

Por isso também que a passagem de grandes personagens costuma ser ocasião de grande festividade no meio de seus descendentes, pois, para nos iorubanos, tal morte e' uma festa! O canto que mais se ouve nas ruas em tais momentos, e que ora cantamos para acompanhar o translado definitivo de Mestre Didi é: 
 

Ile lo lo tarara,
Ile lo lo tarara,
Baba re'le o,
Ile lo lo tarara!
Mestre Didi re'le o, 
Ile lo lo tarara!
Oko Juanita re'le o 
Ile lo lo tarara!,
Omo Osunmuyiwa re'le o,
Ile lo lo tarara!
Baba Inaicyra re'le o, 
Ile lo lo tarara!
Omo Asipa Borogun re'le o, 
Ile lo lo tarara!






Opo Baba N'lawa, replica da escultura de Mestre Didi no Rio Vermelho 
Foto: M.A.Luz

 
Neste momento em que todos lamentamos profundamente a morte física do Alapinni, temos que nos lembrar dessa profunda filosofia da nação iorubana: As lágrimas que derramamos são lagrimas de gratidão para a plenitude da vida levada pelo nosso querido Baba que hoje terá maiores condições de velar pelo nosso bem-estar coletivo. 
Aproveitamos o momento para mandar, em nome dos lideres do culto e da tradição aqui na iorubalandia os nossos sentimentos mais sinceros para todos os entes queridos que Mestre Didi deixou neste ato de retorno definitivo ao Ile eterno para se juntar aos orixás e ancestrais. Em nome do Awise Wande Abimbola, em nome do Embaixador Olabiyi Babalola Yai, em nome do Alaketu (rei de Ketu), em nome do Ooni Adimula Okunade Sijuade (rei de Ile-Ife), em nome do Alaafin (rei de Oyo), enfim, em nome de todos nos filhos e filhas, irmãos e correligionários no Axe que tivemos a maior bem-aventurança de conhecer e conviver com o grande Mestre Didi, aprendendo de sua grandiosa e generosa fonte de sabedoria iorubana, mando aos familiares e descendentes no Axé do agora querido ancestral Alapinni Didi, os nossos pêsames. Ojo a jinna sira o! Axé!. 


* Imagens de Internet

MORTE, ORIXÁ IKU

Por Marco Aurélio Luz
Elebogi ati Oju Oba




Cortejo Funerário ao Mestre Didi
                                           
O que eu aprendi sobre Morte, orixá Iku foi na ambiência do culto aos Eungun, ancestres e ancestrais masculinos , e do culto aos orixá, princípios e forças cósmicas que regem o universo de acordo com nossa tradição religiosa nagô, principalmente através da convivência com meu pai , o Alapini, sacerdote supremo, Mestre Didi.
Foi assim que aprendi que ye ati iku okan naa ni vida e morte são uma coisa só. Quando viemos a esse mundo o aiye, já sabemos que um dia retornaremos ao orun, o além.
Nós só temos essa vida e temos que aproveitá-la da melhor maneira possível aproveitando do destino que constitui nossa passagem, nossa viagem procurando o nosso bem de estar nesse mundo.
 De acordo com os itans os contos da cosmogonia, escolhemos nosso destino antes de chegar nesse mundo. Pode-se escolher bons ou maus destinos que regem Ori, a Cabeça e o Orí Inu o interior da Cabeça, nossa parte interligada ao orun. A escolha depende da interação com Ajala, orixá antigo que faz boas e más cabeças e pode ajudar em se optar por uma com um bom destino que permita realizar a viagem sem muitas atribulações.
A energia sagrada que dá dinamismo e impulsiona os destinos chamamos axé. O conhecimento e o modo como se promove e se fortalece o axé é atribuição dos ilê axé, as casas de axé onde se constitui a religião e se celebram os rituais necessários e as iniciações sacerdotais.
O axé é força vital circulante que pode aumentar ou diminuir conforme a realização dos rituais que constituem a tradição religiosa.
Nessa tradição quanto mais se cuida e se mantém os rituais necessários melhor será o fluxo dos destinos. Manter a tradição é a forma de ter o axé dos destinos individuais e comunitários fortalecidos.
Daí que a participação comunitária é essencial na manutenção do ilê axé que garante a dinâmica do ciclo vital.
A comunidade é hierarquicamente organizada de acordo aos valores que visam a proteger e expandir a tradição.
Iku, Morte, orixá masculino não possui assentamento, está sempre em volta do mundo realizando sua missão que é de promover as restituições. Vai-se para dar vez a outros é como aprendemos.
As restituições são das matérias que constituem nossos corpos de volta a terra, ilé.
Um itan, uma história conta que no inicio da criação, Oxalá pediu a colaboração dos demais orixá para encontrarem a matéria capaz dele poder fazer os seres que iriam habitar no aiye.

Oxalá suporta o mundo
Escultura de Mestre Didi

Depois de muito procurarem e selecionarem encontraram o barro umedecido ou lama, enfim água e terra. Após retirarem um pedaço que acharam ser a melhor matéria primordial perceberam que a lama ficou vertendo água, ficou chorando. Então resolveram devolver. Contudo um orixá, Iku resolveu levar um pedaço mesmo assim. Oxalá ficou bastante satisfeito com a matéria, com a lama que iria moldar a individuação dos seres, inclusive os seres humanos.
Todavia quando contaram o que se passara ele então delegou a Iku a obrigação de restituir a matéria para que sempre se tenha o necessário para garantir a Existência.
Então uma noção de justiça é de promover essa restituição. O orixá princípio dessa matéria primordial, agua e terra é Nanan. Uma cantiga diz “ Salare Nanan olu odo” orixá da justiça que promove as restituições. E ainda “Nanan iku re” Nanan é morte.
Fun fun , a cor branca que representa a existência abstrata não concreta, não individualizada, e azul escuro, equivalente a dudu a cor preta representa o interior da terra onde se processa o mistério dos contínuos renascimentos.

Ibiri ati ejo Oxumaré
Escultura de Mestre Didi

Oxumare, filho de Nanan rege o princípio dos renascimentos caracterizado pelo arco íris, multiplicidade de cores diversidade da existência multiplicidade dos destinos em contínuo ciclo vital, emerge da terra e a ela retorna.
Aqueles sacerdotes que se dedicaram de “corpo e alma” através de sucessivas gerações na manutenção e preservação da tradição fortalecendo o axé que permita o fluxo tranquilo dos destinos serão cultuados como ancestrais e assim continuarão colaborando com os rituais que constituem a religião. Nenhum ritual, mobilizador de axé, se realiza sem a invocação dos ancestrais ilustres que integram a constelação das entidades da comunidade. Nesse sentido os ancestrais nunca morrem eles estarão sempre presentes na vida da comunidade religiosa.
No culto aos Egungun a cada ciclo ritual do calendário litúrgico eles virão para proteger e se divertir compartilhando a alegria da comunidade religiosa guardiã das tradições em seu ritmo de existência para que esse mundo não se acabe.
Ao encerrar convém ressaltar que por mais que se procure saber o que é Morte nós não saberemos. Conviver com esse mistério do existir, esse não saber, é a verdadeira sabedoria.


* Imagens da Internet