sexta-feira, 13 de novembro de 2009

AINDA CONVERSANDO SOBRE O QUILOMBO BURACO DO TATU

Em menos de um mês o blog da ACRA tem recebido muitas visitas que lêem, gostam, aprendem, extraem aspectos para estudos, indagam, indicam para amigos/as, aproximam-se de perspectivas importantes sobre a nossa população, etc.


Pois bem. Um dos nossos visitantes lendo sobre aspectos extraídos da pesquisa da Professora Narcimária Luz sobre o Quilombo Buraco do Tatu, comentou: “Gostaria de maiores informações sobre o Quilombo Buraco do Tatu. Por que esse nome? Enfim... Poderiam me ajudar?”


Aqui vai uma boa reflexão feita por um dos nossos importantes colaboradores, o cientista social Doutor Marco Aurélio Luz.


PANGOLIN OU TATU: ASPECTOS DA SIMBOLOGIA AFRICANA


Colaboração do Professor Doutor Marco Aurélio Luz


O animal equivalente ao tatu na África é o pangolin. Ele come insetos, evita o combate direto e diante de um ataque inevitável ele aproveita sua carapaça dura para se enroscar virando uma bola se tornando inviolável e invulnerável. O tatu, ou pangolin, possui grandes garras que lhe permite cavar extensos buracos que se constituem em rotas de fuga e esconderijo quando ameaçado.


No reino de Benin, (não confundir com o país Benin antigo Dahomé), o pangolin é elemento de grande significação simbólica. A linguagem e os valores da tradição cultural que o envolvem inspiram sábias estratégias de luta pela vida. Trajes do rei de Benin expressam essa identificação simbólica com esse animal. Também encontramos essa identificação simbólica com o pangolin nas "armaduras" dos guerreiros do reino do Benin expressas nos famosos alto relevos da arte esculpidas em bronze. A planta arquitetônica da cidade do Benin, de forma espiralada com o palácio do Oba, rei, e o mercado no ponto inicial também alude a forma esférica de defesa do pangolin.


Dessa forma como indica o símbolo Ashanti, Sankofa, "nunca é tarde para voltar e apanhar o que ficou para trás... aprender com o passado para construir o futuro”. Assim podemos ter uma idéia aproximada sobre a escolha do nome do quilombo em Itapuã (1744 e 1764) pelos nossos antepassados africanos: Buraco do Tatu.


Alto relevo em bronze arte tradicional do Benin.Guerreiros com “armaduras do pangolin”.


VALDEMAR SANTANA, AINDA UMA REFLEXÃO SOBRE O TATU.


Um aluno de capoeira de Mestre Bimba, meu amigo e irmão Muniz Sodré contou-me que certa feita em uma de suas lições o mestre perguntou aos seus alunos o que fariam se tivessem pela frente alguém os ameaçando armado com uma faca. Todos contaram suas bravatas demonstrando os golpes que dariam para livrá-los de tal situação e ainda dominar o agressor. Mestre Bimba nada disse, só ouviu.


Mas a ansiedade do grupo fez com que ousassem a pergunta inevitável:

-E o senhor Mestre o que faria?

Ao que Bimba respondeu mais ou menos assim:

-Eu? Eu saía correndo! Se insistisse procurava uma esquina para surpreender escorando...


A capoeira nasce para enfrentar um adversário melhor armado, procurando estratégias de contornar e evitar o combate de frente, para surpreender num momento mais favorável. É a inspiração da Rainha Ginga do Ndongo (Angola), a Rainha Invisível, na luta contra os portugueses escravistas, guerra de deslocamentos através dos Kilombos, acampamentos militares.


Pois, pois, como dizem os outros...


Na década de 1950 Valdemar Santana um dos maiores lutadores que o mundo já viu, discípulo de Mestre Bimba, morando no Rio de Janeiro estava na ambiência da academia de jiu-jítsu de Helio Gracie, até então tido como maior lutador do Brasil. Vai que quis o destino que Valdemar fosse enfrentar Hélio numa luta de vale tudo, sem quimono e sem rounds ,aberta ao público que lotou o ginásio de esportes. Com toda imprensa apoiando Hélio envolvida pelas ideologias racistas só esperavam a confirmação da "superioridade do branco descendente de inglês". Isso foi em 1955.


A luta tornou-se uma das mais longas que o mundo já viu. Sabendo que as armas de Hélio eram as chaves do jiu-jitsu, Valdemar adotou a tática do tatu, acocorado no chão enfeixado sobre si mesmo, não permitia uma sobra de membro que pudesse favorecer as táticas do adversário. Quando esse dava uma brecha tentando catar um braço, uma perna, um dedo, um pescoço, Valdemar punha-se de pé e forçava Hélio a persegui-lo dando um e outro golpe no contra ataque, em seguida, pronto novamente enroscado como o tatu. Depois de 3 horas e 45 minutos, com Hélio exausto e desguarnecido Valdemar desferiu a meia lua de compasso, o pé voa na cara do oponente. O adversário caiu desfalecido.


Valdemar Santana filho da Bahia, a Roma Negra como disse Mãe Aninha, Iyalorixa Oba Biyi, entra para nossa história, para nossa honra.

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