sábado, 8 de dezembro de 2012

“O SEGREDO DA MACUMBA”:40 ANOS DA PUBLICAÇÃO/O RETORNO DO REPRIMIDO PARTE 6

SÓCIO-PSICANÁLISE
A PRESENÇA DO PALMARES
Por Marco Aurélio Luz

Há pelo Brasil alguns autos dramáticos que se referem a luta dos africanos e seus descendentes contra a escravidão e pela liberdade.
Na Bahia é bastante conhecido o auto do “Nego Fugido” que acontece no Recôncavo:



Apresentação em Salvador do auto do “Nego Fugido”

Imagem disponível em http://dancasdobrasil.blogspot.com.br/2010_10_01_archive.html



Auto do “Nego Fugido”, Recôncavo Ba.




Preto Velho no alto, Caboclos em baixo apontando flexa, altar de terreiro de Umbanda,região de Ribeirão Preto, SP.
Foto M. A. Luz

Um altar num terreiro de Umbanda em Santa Rosa de Viterbo na região de Ribeirão Preto no interior de S. Paulo acendeu-me a idéia de compará-lo com um relato de Arthur Ramos no livro "O Folklore Negro do Brasil" referente a uma comemoração nas imediações da Serra da Barriga onde existiu o Quilombo dos Palmares.
Dizia ele: “No brinquedo dos quilombos a que eu assisti, em pequeno na cidade do Pilar (Alagoas) havia a cena inicial das danças dos negros, com muitos cânticos, de que guardei os seguintes:

"Folga nêgo

Branco não vem cá

Se vié o diabo há de leva

Folga nêgo

Branco não vem cá

Se vié

Pau há de leva

Folga parente

Cabôco não é gente”

Convém lembrar que o paulista bandeirante Domingos Jorge Velho contratado pela Coroa Portuguesa para combater o Palmares numa derradeira batalha, conforme Edison Carneiro:“Em épocas diferentes, computava os seus homens, ora em 800 indios e 150 brancos”... Com essas referências aproximei a macumba, um culto aos ancestrais, incluindo também a saga do Palmares e a simbologia dos chefes maiores Ganga Zumba e Zumbi.
Mas essa é uma referência de certa forma censurada, sublimada e deformada no imaginário, e Zumbi é então tido como uma entidade que “vagueia altas horas da noite. Tornou-se uma entidade indeterminada, sem forma e sem culto, identificando-se com a multidão das almas penadas, fantasmas, espíritos errantes”...
E adiante, “a Umbanda se assemelha a um sonho isto é a linguagem mais característica do inconsciente. Um sistema de mitos, símbolos e representações imaginárias que é na verdade a linguagem de uma formação social.”
Como culto aos ancestrais a Umbanda ritualiza em sua liturgia a ancestralidade africana no Brasil, caracterizada por desafios e lutas, mas também pela confraternização comunitária, e pela expressão estética sedutora, encantadora de alegria e beleza.
Convém aqui entretanto sublinhar, que as giras de Caboclo na Umbanda, creio eu, derivam ou têm uma analogia com os candomblés de Caboclo que realizam um culto aos ancestrais à maneira africana de enaltecer os fundadores de um território, os “donos da terra” no caso os primeiros habitantes do Brasil.


A PRESENÇA DO PALMARES:ESPIRITUALIDADE, ANCESTRALIDADE E HISTÓRIA.


Certa feita, mais recentemente Joel Rufino me disse a boca pequena que essa abordagem foi mais uma centelha que ajudou a acender, e concorrer para pouco mais adiante, favorecer o interesse do movimento negro em resgatar e reverenciar a memória de Zumbi e do Quilombo dos Palmares numa simbologia política de luta de afirmação. Possa ser... tanto mais que eu já tinha muitas amigas e amigos nesse processo, dentre as quais destaco as renomadas e admiradas professoras Lélia Gonzales e Beatriz Nascimento de saudosa memória. Convém observar que uma pequena bibliografia já existia com outras abordagens como o livro de Édison Carneiro, O Quilombo dos Palmares, o de João Felício dos Santos, Ganga Zumba, e ainda o enredo de 1960 da escola de samba Salgueiro campeã com o tema O Quilombo dos Palmares, e alguns ensaios do Movimento Negro a procura de uma data comemorativa da Consciência Negra como alternativa ao 13 de maio.
Convém registrar que no ano de 1.980 quando houve um ato político de retomada dos valores do Palmares pelo movimento negro na serra da Barriga, lá esteve Mãe Hilda Jitolu a Iyalorixá que sustenta as bases religiosas do bloco Ilê Aiyê e seus desdobramentos culturais. Mãe Hilda aceitou convite de Abdias do Nascimento para realizar os rituais necessários para manter em paz e em bom lugar no orun no além o espírito de Zumbi.



Mãe Hilda ladeada por Passarinho e Abdias Nascimento no caminho do Palmares




Depois desses acontecimentos o movimento negro consegue incluir a memória de Zumbi no panteão dos heróis nacionais, são feitas inúmeras homenagens, erguidos monumentos, e estabelecida uma data alusiva ao Palmares e feriado comemorativo ao Dia da Consciência Negra.

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