quarta-feira, 21 de outubro de 2015

II SINBAIANIDADE , UM LUZ E TRÊS SODRÉ, BAIANIDADES E AFRICANIDADES


A Mesa "Baianidades e  Africanidades"  aconteceu no dia 10 de outubro pela manhã, sob a coordenação do Doutor Marco Aurélio Luz da Universidade Federal da Bahia  tendo como expositores, o Doutor Muniz Sodré da Universidade Federal do Rio de Janeiro, o Professor Jaime Sodré da Universidade do Estado da Bahia e o cantor e compositor Raimundo Sodré.


Auditório atento as abordagens da Mesa

Marco Aurélio iniciou dizendo que aprendeu com Mestre Didi Alapini de saudosa memória, que numa cerimônia deve-se antes de mais nada saudar os ancestrais. Assim sendo, solicitou a todos os presentes que ficassem de pé e numa atmosfera respeitosa pediu licença para cantar uma cantiga em homenagem ao Alapini.



Foto ASCOM UNEB


Baba Mogba Oga Oni Xangô..
Título recebido pelo rei de Ketu
A nki o..                  
Nós o saudamos respeitosamente
Alapini ati Asogba
Sacerdote supremo do culto aos Egungun e   Sacerdote supremo do culto a Obaluaiyê





Marco Aurélio Luz coordena a mesa "Baianidade e Africanidades".



Concluída a homenagem, Marco Aurélio apresentou uma escultura de Exu Lonan destacando que nas histórias da tradição itan, Exu foi o orixá que conseguiu de Olorun que as portas do orun do além, fossem reabertas proporcionando o ciclo vital e a continuidade da existência. Isso aconteceu porque enquanto os demais orixá se apresentavam a Olorum com abundantes oferendas, Exu atendendo a determinação de Orumilá Baba Ifá, o pai do oráculo, apresentou-se apenas com uma pena na cabeça, o emblema Egan, e  seguiu na frente de todos os orixá. Foi assim que Exu se tornou o Siwaju, o que vai à frente de todos e se tornou o L´onan “O Senhor dos Caminhos”.

Dessa forma, sempre nas cerimônias religiosas ocorre o ritual de ipade, reunião, dedicado a Exu para abrir os caminhos da comunidade na expectativa de que tudo seja propício.

Exu L´Onan, escultura de M. A. Luz
Foto: Hans Olu Obi

Outro destaque que Marco Aurélio fez foi se referir a uma das cantigas em que aparece a saudação de Exu, Laroyê!!, e que também invoca o nome de Odara, o que faz acontecer coisas boas e bonitas.


Foto: ASCOM UNEB

De origem carioca, mas  vivendo na Bahia há muito tempo, Marco Aurélio ressaltou que não é apenas isso que constitui sua “baianidade”. Marco chamou atenção sobre a expressão que se refere aos nascidos no Rio de Janeiro como  “carioca da gema do ovo”.  Essa gema, nada mais  é do que  a presença da Bahia no Rio de Janeiro representada de forma magistral pela ala das baianas nos desfiles das Escolas de Samba ponto alto da cultura carioca.

Ala das Baianas
Foto disponível na internet

A imigração baiana ocorreu com intensidade nos inícios do século passado no Rio de Janeiro, a exemplo da famosa casa de tia Ciata, Iyá Kekere do terreiro de João Alabá, que acolheu e abrigou os sambistas, músicos, compositores e intérpretes, gente de ranchos e blocos. É essa pujante presença da Bahia que contribui transformando a Praça Onze numa “pequena África” no dizer de Heitor dos Prazeres, e num contexto de perseguição policial com certeza isso foi fundamental na constituição da cultura carioca.
Mãe Aninha, Iyalorixá Oba Biyi fundou no Rio de Janeiro o Ilê Axé Opo Afonjá R.J. juntamente com tia Agripina Oba Deyi, com Bamboxê Obitiko e Oba Sãiya, expandiram os valores sagrados. Muitas outras casas se difundiram. 
Na Umbanda um ponto cantado em homenagem a rainha Vovó Maria Conga assim se refere:
“O sol raiou já vai baiana/ o sol raiou nas ondas do mar/ as ondas do mar batia/ lá se vai Maria Conga feticêra da Bahia.”
Após essas considerações, Marco Aurélio passou a palavra para o professor Jaime Sodré, escritor com vários livros e ensaios inclusive sobre a obra escultórica de Mestre Didi e outro sobre o registro da imprensa baiana relativo a época da perseguição policial aos terreiros.
Jaime Sodré começou dizendo que no dia seguinte que recebeu a homenagem de Comendador do SINBAIANIDADE, divulgaram nas redes sociais e ao amanhecer já tinha uma fila de gente querendo favor... Muitos risos! Para ele a honra de ser comendador, ganha diversas interpretações inclusive na Bahia. A forma como   soou o valor da comenda no bairro da Federação deu a impressão de que ele recebeu muitos poderes.

Comendadora Narcimária Luz, comendadores Marco Aurélio Luz e Jaime Sodré e  Lúcia Oliveira professora do curso de Design da UNEB.

A sua exposição foi no sentido de apontar a variedade da “baianidade” que conforme a dinâmica dos territórios onde se expressa assume características singulares.
Assim, a cidade de Salvador, Recôncavo, sertão, a “zona do cacau”, o sul da Bahia, há predominância de contingentes populacionais negros ou indígenas que reúnem aspectos de culturas que irão constituir as “baianidades”.

Comunicação do Professor Jaime Sodré

Mesmo na cidade de Salvador, há uma variedade de modo de "SER baiano" que recebe modulações de bairro para bairro além das influências das variadas instituições que caracterizam aquelas comunidades.  Nas religiões africano-brasileiras que são matrizes na constituição da cultura, há a pluralidade. Tradições Congo, Angola, Jeje, Nagô, cada qual possui seu corpus litúrgico que estabelecem teias vigorosas pela Bahia.  O Professor Jaime Sodré ainda chamou atenção para uma falsa baianidade constituída por interesses comerciais que divulga estereótipos mundo afora. 

A pedidos Jaime Sodré cantou "A Falsa Baiana"

Para ilustrar a verdadeira "baianidade", ele lembrou da música de Geraldo Pereira “A Falsa Baiana”(1944), e a pedidos cantou a música acompanhado com palmas ritmadas pela plateia:
Baiana que entra na roda e só fica parada
Não canta, não samba, não bole nem nada.
Não sabe deixar a mocidade louca.
Baiana é aquela que entra no samba de qualquer maneira
Que mexe, remexe, dá nó nas cadeiras
Deixando a moçada com água na boca.

A falsa baiana quando entra no samba ninguém se incomoda
Ninguém bate palma, ninguém abre a roda.
Ninguém grita ôba, salve a Bahia, Senhor!
Mas a gente gosta quando uma baiana quebra direitinho
De cima embaixo revira os olhinhos
E diz eu sou filha de São Salvador!”

Dessa forma o professor Jaime Sodré encerrou a sua participação.
O coordenador da Mesa Marco Aurélio passou a palavra para o Professor Doutor Muniz Sodré, afamado autor de inúmeros livros e muito admirado.
Ele começou dizendo que há muitos anos mora no Rio de Janeiro onde trabalha e constituiu família. Disse que gosta e admira a cidade do Rio de Janeiro, e justificou que ao invés de abordar o tema “baianidade” iria desenvolver reflexões sobre a “carioquice”, ou seja, a imagem coletiva ou a alma característica da identidade do ser carioca.



Comunicação do professor Muniz Sodré 
Foto ASCOM UNEB

Para Muniz Sodré a entidade que rege os destinos do Rio de Janeiro é Exu. Por diversas razões e coincidências demonstrou que Exu está presente na regência de datas históricas desde a fundação da cidade.
Nas Umbandas, religião predominante no Rio de Janeiro, a gira ritual mais frequentado pelos fiéis é a de Exu, entidade originária do panteão dos orixá nagô.
O Exu mais solicitado é seu Tranca Rua, que rege os caminhos dos destinos, seu Sete Encruza que rege as encruzilhadas, Exu Marabô, Exu Caveira, Pomba-gira que rege a sexualidade, Sete da Lira que rege a musicalidade dentre outros. São esses Exus que constituem o imaginário coletivo carioca.
Nesse ínterim, Marco Aurélio como “carioca da gema do ovo “lembrou-se do alvoroço provocado nos tempos da ditadura por Seu Sete da Lira da mãe de santo D. Cacilda de Assis, promovendo a ida de multidões ao seu terreiro e comparecendo nos principais programas de televisão do Chacrinha e de Flávio Cavalcanti.

Seu Sete da Lira abalou a mídia.
Foto disponível na internet.

Muniz ressaltou a presença da entidade  Zé Pilintra que tem a imagem  de um negro bem vestido de terno branco, gravata e lenço vermelho, sapatos brancos, chapéu panamá lembrando o figurino da malandragem das primeiras décadas do século passado.
Zé Pilintra
Foto disponível na internet
Marco Aurélio lembrou que a figura do malandro foi cantada em prosa e verso e gerou o famoso desafio entre Wilson Batista e Noel Rosa.Outra categoria presente nas relações sociais cariocas é “otário”. Não há malandro sem otário.
Muniz prosseguiu sua exposição enfatizando então, que assim como Exu é tratado por “compadre”, para os cariocas essa categoria substitui a de amigo. “Carioca não tem amizade tem compadrio” afirmou Muniz.

Muniz Sodré e a composição da mesa

Embora a figura do malandro, tenha sido perseguida pela ideologia constituinte do Estado Republicano, combatida pelo corpo jurídico penal com a Lei da vadiagem, ela permanece no ideário carioca.
E com essas reflexões Muniz encerrou sua comunicação.
Marco Aurélio apresentou Raimundo Sodré dizendo que embora seja bastante conhecida pelo sucesso da música “A Massa”, ele possui uma vasta obra. Seu estilo emerge da musicalidade do Recôncavo e quejandos. 
Raimundo Sodré fez questão de chamar a atenção de que no dia da realização da Mesa no sábado, era um dia consagrado as Iyá Agbás, nossas venerandas Mães e ressaltou uma linda composição em homenagem a Oxum que ele compôs.
 Raimundo Sodré lembrou que nasceu após a mãe ter participado de uma roda num xirê. Ela dançou a noite toda e na manhã seguinte ele nasceu, sendo banhado pelas Iyás nas águas de Oxum.


Comunicação do cantor e compositor Raimundo Sodré
Foto: ASCOM UNEB

Raimundo Sodré falou que compôs a música “A Massa” descansando na sombra de uma árvore. Ela chegou inteira num instante de inspiração. Ele mostrou para o amigo e poeta Jorge Portugal que compôs a letra. Foi uma combinação muito certa.
O sucesso da música o levou a fazer inúmeras apresentações grande parte no interior. Muita gente fazia economia para pagar o ingresso. Um dia um menino contou o esforço que fez para comprar o ingresso, e isso o deixou muito comovido.
Disse que nunca se afastou dessa trilha, a da musicalidade de sua gente, tanto mais que nasceu logo após sua mãe ter participado de um festival religioso em homenagem ao orixá Oxum, patrona da música.
  Feita essa breve exposição Raimundo Sodré cantou emocionando a todos a música "Oração para Iyá Oxum".

Apresentação musical de Raimundo Sodré
Foto: Lúcia Oliveira

Oxum a minha mágoa
Quando se derrete em água
No meu corpo a sua água
Me lava de todo rancor
Esta dor que me entala
Quando assim perco a fala
Eu só penso no amor
Oxum- ora yê yê Yê ô
Oxum ora yê yê yê ô
Oxum a sua casa a correr
Lava a minha alma
Apara a minha dor
Sua casa sobre a areia
Me ensina a vencer
Por onde for.

 

Foto ASCOM UNEB

Finalizando as apresentações o Professor Marco Aurélio Luz  destacou que os momentos vividos naquela manhã,envolveram o público numa atmosfera Odara. 
Sem sombra de dúvidas, os momentos  singulares proporcionados pelo  II Sinbaianidade , a exemplo da    Mesa Baianidades e  Africanidades foi ODARA PUPO! Foi assim que Marco Aurélio  se referiu a Mesa.
 Odara! Culminando com a musicalidade de Raimundo Sodré ...



Plenária envolta na atmosfera ODARA
Foto ASCOM UNEB



A seguir o vídeo que  comunica o Festival de Música onde Raimundo Sodré canta,dança e interpreta "A Massa" acompanhado de músicos e percussionistas dentre eles Djalma Correia.

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