sábado, 2 de julho de 2011

OLANADE, O ESCULTOR CHEGOU

Por Marco Aurélio Luz




As esculturas que compõem e adornam as varandas dos palácios reais yoruba tem um valor estético e histórico. Elas também expressam variados aspectos da visão de mundo característica do reino através da arte escultórica tradicional.Foto Marco Aurélio Luz


Tive a honra e a alegria de conhecer o escultor  Fakeye durante a IIª  Conferência Mundial da Tradição dos Orixá e Cultura em 1983 realizada em Salvador.
A Iª Conferência foi realizada em Ifé cidade sagrada da tradição yoruba com a presidência do professor Wande Abimbola reitor da Universidade. Com a representação ilustre de Mestre Didi Alapini da tradicional família Axipá, o Brasil foi indicado e qualificado para realizar a próxima Conferência em Salvador.
Nessa ocasião a delegação africana, a mais representativa composta de mais de trinta líderes sacerdotais promoveu um reencontro histórico que deveras engrandeceu ainda mais a Conferência enchendo de orgulho a comunalidade religiosa africana, afro- brasileira e afro-americana.

Fakeye integra a delegação dos africanos ensejando o reencontro histórico visitando o terreiro do Gantuá ou Gantois ou ilê Iya Omi Axé Iyamasse sendo recebidos com muita alegria nos corações pelos integrantes da comunidade religiosa durante a IIª Conferência Mundial da Tradição dos Orixá e Cultura. Foto A. Ikissima.

Além das atividades no Centro de Convenções de Salvador, os reencontros se sucediam em visitas as casas de culto, ilê axé de Salvador e recôncavo, alegrando e enchendo de felicidade os corações de nossa gente. Em outra passagem de Fakeye pela Bahia encontrei-me com ele a partir de uma exposição de suas peças no ACBEU, Associação Cultural Brasil-Estados Unidos.
Convém lembrar que desde 1962 quando era artista em residência na Western Michigan University, Fakeye inicia inúmeros intercâmbios com Universidades, museus e galerias dos EUA até 1999 quando é nomeado Artista Visitante Kellog para Michigan: Smithsonian exposição retrospectiva.



Catálogo da Exposição de Fakeye no ACBEU (Salvador Bahia)

 Quando estive com Fakeye era grande a minha admiração especialmente porque iniciava meus trabalhos de escultor no âmbito da arte sacra tradicional nagô.
Então fui me aproximando muito a vagar até que fui convidado a visitá-lo na moradia que o estava abrigando em Salvador. Era num conjunto de apartamentos debruçado na Av. Vasco da Gama. Foi nessa ocasião que tive a felicidade de adquirir uma magnífica peça de um oxê Xangô.


Coluna
Escultura de Fakeye

Foto disponível em Smithsonian Natural History web: African Voices.


Oxê Xangô
Escultura de Fakeye
Foto disponível em Smithsonian Natural History web: African Voices.
A partir de então em outra ocasião tive a coragem e a ousadia de lhe apresentar também um oxê Xangô, de minha autoria. Ele observou com cuidado e admiração e depois de alguns segundos, que pra mim pareciam horas, ele perguntou-me qual era aquela madeira...?


Oxê Xangô escultura de Marco Aurélio Luz
Foto M.A.Luz

Ora aquela madeira era um retalho de Pau Paraíba sobra da fábrica de tamancos de Seu Mário Oba Telá lá na roça do Ilê Axé Opô Afonjá onde, com as influências de Mestre Didi Alapini meu pai e de meu irmão Nézinho Alabê iniciei minhas andanças pelo mundo das esculturas.
Tão entusiasmado eu estava, e sabendo que Fakeye desde 1978 era docente da Universidade de Ifé, ou Obafemi Awolowo University, que me interessei em procurar me aprimorar num aprendizado indo para lá; mas aí ele me tranqüilizou dizendo:

-“Vá fazendo as esculturas, quando estiver com umas vinte já vai estar bem”...

Desde então tenho seguido seus conselhos, e também estudando e observando a estética da tradição, vivenciando os valores da visão de mundo milenar que se expressa através de complexa simbologia.
Lamidi Fakeye Olonade nasceu em 1928 em Orangun, Nigéria. Foi-lhe dado o nome de Olonade que significa, o escultor chegou. Ele constitui a sexta geração de escultores da arte tradicional yorubá.
O nome Fakeye como é mundialmente conhecido, é um nome de família originado de um título recebido por seu bisavô que foi escultor e babalawo. Esse título refere-se ao sacerdócio de Ifá dedicado ao oráculo, e foi concedido pelo rei o direito das gerações seguintes usá-lo como nome de família.


 Lamidi Fakeye Olonade
 Foto disponível em Smithsonian Natural History web: African Voices.


As obras de Fakeye estão espalhadas pelo mundo desde África. Suas esculturas têm um tratamento complexo e bastante detalhado com sutis e cuidadosas terminações com muita figuração geométrica. Elas possuem o mais das vezes dimensões imanentes e transcendentes que envolvem a simbologia que atravessa o cotidiano da gente yorubá.
Seu estilo único é muito complexo, as peças são muito trabalhadas e adornadas, leves sutis e elegantes.
Fakeye nos deixou em 2009, mas nos legou uma obra magnífica que está sendo herdada e continuada por seus parentes descendentes, Akin Fakeye, Akeen Fakeye, e Lukman Fakeye.
Aproveito então para saldar o mestre Lamidi Fakeye Olonade:

 Olorun ko si pu re.

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