Por Marco Aurélio Luz
LIVING THEATER
Nessa ocasião no Brasil procuravam reforçar suas experiências teatrais de vanguarda estabelecendo também uma estratégia de observação da linguagem da dramatização sagrada nos cultos afro-brasileiros, especificamente a Umbanda.
Foi então que foram me encontrar para que pudessem ter acesso aos terreiros. Com eles participava também o professor Georges Lapassade da Universidade de Paris VIII. Ele era um sociólogo dedicado a uma nova linha de trabalho a Análise Institucional.
Depois de visitarem diversos terreiros, inclusive do Sr. Alcides na Rocinha, cuja entidade Exu Mangueira muito impressionara os visitantes, se reuniram para uma reflexão conjunta e avaliação.
Foi então que Lapassade muito impressionado com o que assistira nos terreiros, indagado respondeu mais ou menos assim: - "comparado com o que vi nos rituais de Umbanda os recursos dramáticos do Living Teather são uma merda" .
Foi então que Lapassade muito impressionado com o que assistira nos terreiros, indagado respondeu mais ou menos assim: - "comparado com o que vi nos rituais de Umbanda os recursos dramáticos do Living Teather são uma merda" .
Georges Lapassade
Imagem disponível em http://louisemiches.blogspot.com.br/2008/11/mais-georges-lapassade-ctait-un-charlot.html
Nesse tempo me acompanhou nas idas aos terreiros e foi se inteirando dos meus estudos que comparavam os terreiros de morro com os templos do asfalto, trocando idéias sobre análise institucional. Fazia muitas anotações e retornou para Paris com a idéia fixa de voltar para o Brasil. Por outro lado me revelou através das teorias e de sua prática provocativa o significado e o valor da Análise Institucional que me permitiram descongelar, dar elásticidade e ultrapassar o conceito de aparelho ideológico de estado de Althusser.
Meus cursos na ECO UFRJ e no IACS UFF já refletiam esses estudos e conversando com o amigo e colega Muniz Sodré estabeleci a linha: Formas de Comunicação no Brasil: A Cultura afro-brasileira.
O amigo e colega Antonio Serra do IACS/UFF subiu muitas vezes o morro em minha companhia. Ele também acompanhou as andanças e as intervenções de análise institucional do professor Lapassade.
Roberto Moura então estudante de cinema se interessou a ponto de me acompanhar nos terreiros e baseado nos meus estudos concebeu um roteiro para um filme curta metragem documentário. Juntando seus amigos formou uma equipe da qual faziam parte Murilo Salles, Roberto Foster, Ismael Cordeiro, Sergio Santos, Valéria, Monica Secreto, José Paulo e eu próprio.
Quero porém registrar que por indicação da professora Lélia Gonzales fui dar aulas de filosofia num colégio particular na Praia de Botafogo. Não sei dizer como alguns alunos souberam das “pesquisas” e me pediram com insistência que queriam visitar o terreiro de Umbanda. Levei-os ao D. Marta. Maravilhados com a experiência espalharam pela turma, no final do ano fui demitido sem que nem prá que.
Num dos retornos de Lapassade lendo meus escritos ele achou que já cabia uma publicação e dizendo ter também os dele, sugeriu um livro em co- autoria. Acabei aceitando e apresentamos os originais ao poeta Moacir Felix editor da Paz e Terra.
Ele era muito admirado e respeitado e enfrentava as pressões da censura naquela época o que já estava inviabilizando a editora bem como a co-irmã a Civilização Brasileira.
Depois de tomar conhecimento dos originais, Moacir propôs uma edição de 10.000 exemplares a ser distribuída nas bancas de jornal, o que daria um retorno rápido. Com Lapassade acordou o título O Segredo da Macumba capaz de atrair a atenção de possíveis leitores e não deixar de ser uma revelação pela abordagem original, tanto mais que nada existia sobre esse assunto na bibliografia da época.
O resultado desta combinação foi uma incrível repercussão nos meios jornalísticos e intelectuais e nos meios de comunicação de maneira geral.
Entre erros e acertos o livro marcou um momento e acendeu uma fagulha no ainda latente Movimento Negro principalmente em relação a simbologia do Quilombo dos
Palmares e ao respeito as tradições religiosas africano brasileiras e seus desdobramentos.
Palmares e ao respeito as tradições religiosas africano brasileiras e seus desdobramentos.
Apesar disso a editora foi vendida e não houve novas edições.
Por outro lado, com o interesse do diretor da ECO, professor Simeão Leal, o filme de Roberto Moura Sái Dessa Exú, foi realizado com o apoio da Embrafilme.Tanto o livro como o filme se tornaram marcos iniciais nos nossos trabalhos. Roberto dentre vários trabalhos publicou o livro sobre Tia Ciata, um ponto de refêrencia obrigatória, e também sobre Cartola e ainda Grande Otelo dentre outros escritos e filmes.
Professor Simeão Leal e Marco Aurélio Luz.
Foto Roberto Moura, Corisco Filmes
Roberto Moura e Aloisio Salles filmagem de "Sái Dessa Exu"
Foto Corisco Filmes
"Sái Dessa Exu" termina com uma bela imagem do culto ao Preto Velho na praia, o sol nascendo no mar que vai dar na África com Vovó Maria Conga cantando a cantiga que diz:
“Um dia serás reis Preto Velho/serás dono de comarca, branco chegará na minha mão e nos meus pés para gritar maleme e pedir/hoje em dia estão pedindo.”
“ O sol nasceu já vai baiana
O sol nasceu nas ondas do mar
As ondas do mar batia
Lá se vai Maria Conga feticêra da Bahia”
Eu fui convidado por Muniz Sodré a ir a Bahia visitar o terreiro de culto aos ancestrais nagô, os Egungun na ilha de Itaparica em 1973. Aí já começa uma outra história que mudou completamente a minha vida.
O Segredo da Macumba foi um ponto de partida. O início de um rompimento com sistemas ideológicos de prolongamentos neocoloniais eurocêntricos, uma irrupção vulcânica de novos valores de liberdade.
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