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PRODESE E ACRA



VIDA QUE SEGUE...Uma
das principais bases de inspiração do PRODESE foi a Associação Crianças Raízes
do Abaeté-Acra,espaço institucional onde concebemos composições de linguagens
lúdicas e estéticas criadas para manter seu cotidiano.A Acra foi uma iniciativa
institucional criada no bairro de Itapuã no município de Salvador na Bahia, e
referência nacional como “ponto de cultura” reconhecido pelo Ministério da
Cultura. Essa Associação durante oito anos,proporcionou a crianças e jovens
descendentes de africanos e africanas,espaços socioeducativos que legitimassem
o patrimônio civilizatório dos seus antepassados.
A Acra em parceria com o Prodese
fomentou várias iniciativas institucionais,a exemplo de publicações,eventos
nacionais e internacionais,participações exitosas em
editais,concursos,oficinas,festivais,etc vinculadas a presença africana em
Itapuã e sua expansão através das formas de sociabilidade criadas pelos
pescadores,lavadeiras e ganhadeiras,que mantiveram a riqueza do patrimônio
africano e seu contínuo na Bahia e Brasil.É através desses vínculos de
comunalidade africana, que a ACRA desenvolveu suas atividades abrindo
perspectivas de valores e linguagens para que as , crianças tenham orgulho de
ser e pertencer as suas comunalidades.
Gostaríamos de registrar o nosso
agradecimento profundo a Associação Crianças Raízes do Abaeté(Acra),na pessoa
do seu Diretor Presidente professor Narciso José do Patrocínio e toda a sua
equipe de educadores, pela oportunidade de vivenciarmos uma duradoura e valiosa
parceria durante o período de 2005 a 2012,culminando com premiações de destaque
nacional e a composição de várias iniciativas de linguagens, que influenciaram
sobremaneira a alegria de viver e ser, de crianças e jovens do bairro de
Itapuã em Salvador na Bahia,Brasil.


sábado, 23 de outubro de 2010

PARTE III(continuação da entrevista do dia 13/10/2010)

Nesta terceira parte da entrevista,Marco Aurélio Luz responde a Márcio Nery de Almeida aspectos que tratam dos princípios masculino e feminino na dinâmica da tradição afrobrasileira.
Boa leitura!
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Márcio Nery de Almeida- - E porque existem duas qualidades de Oxalá, Oxalufan e Oxaguian? E porque existe essa diferença entre o velho e o novo?
Marco Aurélio Luz-
São aspectos do mesmo princípio. Oxalá é basicamente o princípio original da fertilidade, ou da gênese pelo lado do princípio masculino.Ele é o princípio do ar, existência genérica origem do existir. “No início do mundo era o ar”... é como principia uma das histórias da criação. Oxalá criou os seres que vieram a constituir a criação. Os seres humanos enquanto viventes estão ligados a Oxalá pela respiração, estamos todos debaixo do ALÀ o grande pano branco presente na procissão de seus rituais. Oxalá também detém o poder de gênese da criação representado pelo cetro OPA XÔRO, emblema fálico representando fertilidade masculina. No mesmo sentido em contato com o interior da terra o inhame novo possui essa simbolização relacionada à Oxaguian. Ele constitui também o poder de ação de Oxalá, que é um princípio muito antigo que se complementa de Orixá Oguian que é um princípio de possibilidade de atuação do poder de fertilidade masculina.
Opaxorô , com quadro ao fundo do pintor Ronaldo Martins durante lançamento de livros da EDUNEB
Foto Marco Aurélio Luz

Márcio Nery de Almeida-Eu peço que o senhor fale agora dos orixá dos princípios femininos.
Marco Aurélio Luz-Os orixá feminino tem haver com água e terra. São também elementos de constituição do princípio do mundo. Depois do ar ofurufu vieram as águas omi e a terra ilé. Os seres humanos conforme as histórias tradicionais são concebidas da água com a terra, o barro ou lama que será moldado por Oxalá e que é desprendido por um orixá que será o eleda , o criador da pessoa. Os orixá femininos constituem o mistério da concepção e da gestação.

Pintura de Ronaldo Martins, acervo de Narcimária Luz,
Foto Marco Aurélio Luz

A filosofia da tradição nagô é expressa por uma linguagem estética que magnífica os rituais sagrados. Os diversos repertórios dessa linguagem estética possuem uma simbologia. Assim a estética dos orixá femininos as Aiyaba, as nossas venerandas mães, seus emblemas e paramentos possuem formas ventrais, ovais, caracterizando a gestação, o mistério do ventre fecundado, a capacidade de abrigar o desenvolvimento do feto, do nascituro. Também o mistério da metamorfose de seu próprio corpo ser capaz de se transformar na gestação, e de alimentar o recém nascido. Esse princípio da fertilidade feminina que é homenageado e cultuado pela religião.
"BORBOLETAS"
Criação de Narcimária C. P.Luz.O fenômeno da metamorfose de transformação do corpo feminino está simbolizado nas borboletas.Também suas formas aludem ao obo obirin.
Foto Marco Aurélio Luz
O abebe emblema de Oxum e também de Iyemanjá tem a forma de um leque adornado com peixe ou pássaro no centro caracterizando o ventre fecundado. Iyemanjá significa Iye, mãe omo dos fihos eja peixes. Ela constitui o poder dos rios, dos estuários, do encontro com o mar, lugar de muita vida marinha. Já Oxum constitui o princípio das águas correntes, riachos, corredeiras e cachoeiras. Está relacionada com a capacidade de fertilização, com os ciclos menstruais, poder e mistério da Iya mi akoko, a mãe por excelência. Saias rodadas, gestos e movimentos de suas danças caracterizando esses atributos são outros elementos dessa simbologia.
Convém ressaltar por fim os valores característicos do culto a ancestralidade na cultura nagô. Quanto mais filhos, nascidos criados e desenvolvidos mais o ancestral será lembrado e cultuado. Então a fertilidade no sentido da expansão da vida, proporciona a preservação e circulação do axé da força vital, quando os princípios são cultuados e enaltecidos gerando a capacidade de continuação da existência.
"ABEBE"
Emblema de Oxum, recriação de Narcimária C.P.Luz
Foto Marco Aurélio Luz

Márcio Nery de Almeida - Agora eu gostaria que o senhor falasse um pouco de Iansã, sobre sua indumentária, sobre a dança...
Marco Aurélio Luz-
Iya mesan orun, mãe dos nove espaços do orun do além, Princípio do vento, ar em movimento, existência invisível ela é a rainha, quem comanda os egungun os ara orun habitantes do orun. Iyansan voa como vento e suas danças demonstram gestos que simbolizam esse poder, inclusive de movimentar o fogo e outros elementos. Um de seus emblemas o erukere, de crina de rabo de boi, da parte de trás, da parte poente do animal, simboliza o poder de atuação no comando dos ancestrais. Os espíritos ancestrais ensejam que Iyansan com o erukere limpe as situações malfazejas, com danças e música e cantos pertinentes. A cor de seus trajes suas vestes, suas jóias etc. é vermelho escarlate.
Além do culto aos orixás Iansã é venerada no culto aos Egungun, aos ancestres e ancestrais masculinos na tradição nagô um culto de primazia de poder masculino.

Márcio Nery de Almeida- E o senhor tem algum conto mítico para poder ilustrar?
Marco Aurélio Luz -É um conto que narra como ela adquiriu e perdeu esse poder... Ela adquiriu num contato com Ogun quando ainda ela comandava os homens. Porque Ogun caracteriza aspectos do princípio masculino por excelência. È o orixá que representa a agressividade masculina o poder da força física de ação de desbravamento e luta de enfrentamento do desconhecido, que o faz também conhecedor dos mistérios da floresta, e criador da tecnologia. Patrono dos ferreiros ele guarda o segredo da transformação do minério em metal. A espada agadá é seu emblema característico e o torna também impulsionador da civilização.
Então nessa época muito muito antiga, Iyansan levava os homens pelo dedo mindinho, como diz na história aterrorizando-os com um grande macaco. Ogun não estava nada satisfeito com isso. E foi ao babalawo para saber o que poderia fazer. O babalawo disse a ele que fizesse um preceito e que ele a assustasse. Depois do preceito, Ogun se veste com uma capa, uma espada, um chapéu e fica com uma fisionomia aterrorizante. Ela morre de medo e se retira e então, a partir daí o culto aos ancestrais masculinos volta para as mãos dos homens e os homens passam a ter esse poder de ter o controle dos egungun, dos ancestrais masculinos. São os homens os iniciados, são eles os sacerdotes desse culto. Todavia Iyansan é lembrada como aquela que foi a rainha e possui ainda poder sobre eles embora já não o exerça mais como levar os homens pelo dedo mindinho.

Para ler a entrevista na íntegra consultar o SEMENTES CADERNO DE PESQUISA.Salvador:EDUNEB, , Vol.03,nº 5/6 ,Jan/dez 2002

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