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Por Marco Aurélio Luz
Hélio Gracie foi grande , mas não podemos esquecer de Waldemar Santana.
Num programa
de TV recente o Mestre de capoeira Boa Gente, lamenta que um feito histórico
não esteja devidamente registrado como merece. Segundo ele, a história
permanecerá incompleta sem a presença heróica de Waldemar Santana.
Um aluno de capoeira de Mestre Bimba,
meu amigo Muniz Sodré, o Americano, contou-me que em uma de suas lições o
mestre perguntou aos seus alunos o que fariam se tivesse pela frente alguém os
ameaçando armado com uma faca. Todos contaram suas bravatas demonstrando os
golpes que dariam para livrá-los de tal situação e ainda dominar o agressor.
Mestre Bimba nada disse, só ouviu.
Mas a ansiedade do grupo fez com que
ousassem a pergunta inevitável:
-E o senhor Mestre o que faria?
Ao que Bimba respondeu mais ou menos
assim:
-Eu? Eu saía correndo! Se insistisse
procurava uma esquina para surpreender escorando...
Imagem disponível no Google imagens Mestre Bimba, criador da Capoeira Regional
A capoeira nasce com a ginga para enfrentar um adversário melhor armado, procurando estratégias de contornar e evitar o combate de frente, para surpreender num momento mais favorável. É a inspiração da Rainha Ginga do Ndongo (Angola), a Rainha Invisível, na luta contra os portugueses escravistas, guerra de deslocamentos através dos kilombos, acampamentos militares que manteve a independência de seu território em 1.657.
Monumento em homenagem à Nzinga Bandi Kiluanji em Angola, a Rainha Ginga
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“Pois, pois”, como dizem os outros...
No ano de 1955 Waldemar Santana um dos
maiores lutadores que o mundo já viu discípulo de Mestre Bimba, morando no Rio
de Janeiro estava na ambiência da academia de jiu-jítsu de Hélio Gracie, até
então, tido como maior lutador do Brasil.
Waldemar Santana
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Vai que quis o destino que Waldemar
fosse enfrentar Hélio numa luta de vale tudo, com quimono e sem rounds e tempo determinado.
O público lotou o ginásio de esportes. Com toda imprensa apoiando Hélio,
envolvida pelas ideologias racistas só esperavam a confirmação da
"superioridade do branco descendente de inglês".
Em entrevistas em revistas e jornais
Hélio Gracie se gabava de além de ser o exímio lutador de jiu-jítsu e de ter já
vencido os mais temíveis lutadores do Oriente e do Brasil, era ele um Gracie,
descendente de ingleses por si só superior ao negro Waldemar que inclusive desonrara
a sua academia se prestando a lutar em lutas combinadas de exibição para ganhar
algum dinheiro.
O jornal Última Hora abriu espaço para
promover o desafio e diante das afirmações de Hélio Gracie, o “Leopardo Negro”,
Waldemar Santana o desafiou. Com a ideia de dar uma lição no jovem ousado,
Hélio logo aceitou.
Waldemar Santana também frequentava academia de capoeira no R.J.
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A luta tornou-se uma das mais longas que o mundo já viu. Sabendo que as
armas de Hélio eram as chaves do jiu-jitsu, Valdemar adotou a tática do tatu,
acocorado no chão enfeixado sobre si mesmo, não permitia uma sobra de membro
que pudesse favorecer as táticas do adversário. Quando esse dava uma brecha
tentando catar um braço, uma perna, um dedo, um pescoço, Valdemar punha-se de
pé e forçava Hélio a persegui-lo dando um e outro golpe no contra ataque, em
seguida, pronto novamente enroscado como o tatu. Depois de 3 horas e 45
minutos, considerada a luta de vale- tudo mais longa do mundo, com Hélio
exausto e desguarnecido Valdemar desferiu a meia lua de compasso, o pé voa na
cara do oponente. O adversário caiu desfalecido.
A vitória histórica de Waldemar Santana sobre Helio Gracie
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Um verdadeiro tsunami atingiu os entulhos ideológicos racistas espalhados pela mídia em geral. Todavia Nelson Rodrigues escreveu famosa crônica enaltecendo o feito.
“Há 20 e tantos anos que os Gracie
mantinham uma invencibilidade que parecia definitiva. Por isso há tanta gente
querendo dar rádio, televisão, e até ferro elétrico a Waldemar. E não há dúvida
de que ele bem o merece.
No dia de sua vitória, houve alegria universal,
sim. O fraco sentiu-se menos fraco, o humilhado menos humilhado, e o marido que
não pia em casa levantou, por 24horas
a
crista abatida. Todos nós somos cúmplice de Waldemar.”[1]
Waldemar Santana, filho da Bahia, a
Roma Negra, como disse Mãe Aninha, Iyalorixa Oba Biyi, entra para nossa
história, para nossa honra.