segunda-feira, 27 de dezembro de 2010

FELIZ 2011!!!



Foto de Marco Aurélio Luz

Há um provérbio afrobrasileiro que diz:
“Coisas boas recebidas devem ser ingeridas”.
Que o ano novo traga muitas "coisas boas", saborosas e viçosas.
Que essas "coisas boas"que constituem os mistérios do existir,fortaleçam nosso espírito e corpo dando-nos saúde,paz,amor,harmonia e prosperidade.
Não esqueçam também,de compartilhar essas "coisas boas" com o próximo.
Ingerir "coisas boas" juntos, com certeza nos dará mais conforto e alegria.
O blog da ACRA pretende continuar disponibilizando aos visitantes o acesso as "coisas boas", capazes de anunciar outras perspectivas de vida para além da arrogância, onipotência, egoísmo, competição, ganância, vaidade e mediocridade...
Precisamos (re) aprender a ingerir tudo que possa

gerar VIDA,

expandir VIDA,

promover VIDA!


FELIZ 2011!

IIº FESTIVAL AFROBRASILEIRO DE ARTE E EDUCAÇÃO DA ACRA

No dia 16 de dezembro a ACRA realizou o seu IIº Festival Afrobrasileiro de Arte e Educação.Foi uma tarde muito simpática,agradável e divertida marcando mais um ano de continuidade das atividades envolvendo crianças,jovens,pais e educadores/as.
A festa culminou com homenagens aos educadores/as,pais e convidados/as que receberam um xequerê confecccionado pelas crianças sob a orientação do professor Sidney Argolo.
Em seguida foi oferecido um lanche sugerido pelas crianças no processo de organização do evento.
Awon xekeré instrumento produzido pelas crianças da ACRA sob a orientação do professor Sidney
Foto Marco Aurélio Luz

Professor Narciso Presidente da ACRA e a Sra. Damiana do Pandeiro artista local que prestigiou o evento.

Ao fundo grafite produzido pelas crianças da ACRA sob a orientação do professor Tárcio


Apresentação do Maculêlê sob a orientação do Professor Rupi



Professor Sidney Argolo



Apresentação do grupo de flauta sob a orientação do professor Renato


Apresentação do grupo de dança Hip Hop coreografias criadas pelas crianças



ITAPUÃ QUEM TE VIU, QUEM TE VÊ

Praia de Itapuã imediações do Farol

Foto Narcimária Luz


POR ROSÂNGELA ACCIOLY


O livro “Itapuã quem te viu, e quem te vê” de autoria da professora Narcimária Luz publicado pela EDUNEB Editora da Universidade do Estado da Bahia, apresenta uma visão poética da história do bairro de Itapuã, destacando o valor das diferentes civilizações que constituíram o bairro. A autora apresenta através de uma perspectiva pluricultural de educação, uma riqueza de detalhes sobre a presença dos tupinambá, portugueses, africanos e mais recentemente nos anos de 1940 a influência dos Estados Unidos. A narrativa utilizada pela autora, cria personagens que delinearão o encontro entre essas civilizações trazendo reflexões acerca das mudanças sócio-históricas que ocorreram ao longo do tempo na territorialidade de Itapuã, Salvador-Ba.

A oralidade como base da comunicação africano-brasileira, é explorada pela professora para compor narrativas que dão ao texto a estrutura de um auto-coreográfico. É assim, que nos deparamos com dramatizações poéticas que refletem os valores de civilizações,que apelam para contos, músicas,provérbios,etc. Esse belíssimo livro, recorre as histórias dos ancestrais, para anunciar a visão de mundo tupinambá, africana,européia e sua extensão urbano-industrial através dos EUA.Todo esse universo cênico é muito representativo para as crianças,pois de maneira lúdica o público leitor aprende: sobre os conflitos e tensões dessas civilizações que atravessaram o tempo em Itapuã;como essas civilizações coexistem; e vínculos comunais afrobrasileiros que se mantêm afirmando o direito à alteridade.

Os valores das civilizações aborígine e africana aparecem de forma contagiante e corajosa através de personagens que vivenciam aspectos da ancestralidade e a relação com o universo simbólico que transborda nas sociabilidades engendradas na relação com o mar, as dunas, mata, lagoas, rios, fauna característica de Itapuã, etc. Em “Itapuã quem te viu,e quem te vê”,podemos identificar modos de insurgência dos africanos/as e a afirmação do seu modo de viver face à imposição dos valores europocêntricos via Portugal e Estados Unidos.
O auto-coreográfico apresenta narrativas em que as crianças e jovens descendentes dos tupinambá e africanos se vêm para além das representações da historiografia oficial que tratam desses povos como escravos, incivilizados, primitivos, incapazes de história, tecnologias, literatura, arquitetura, farmacologia, matemática, idiomas, etc. Esta é uma grande sacada que ergue novos horizontes de abordagem da história das populações tupinambá e afrobrasileira na Bahia voltada para o público infanto-juvenil.


ITAPUÃ


Ilustração de Marcelo Luz


Dentro desse contexto, tudo se inicia a partir das personagens a “pedra que ronca” ITAPUÃ, e da pedra que carrega no seu interior a fartura de peixes PIRABOCA, ambas constituem o mito inaugural dos tupinambá.










PIRABOCA


Ilustração de Marcelo Luz


A outra personagem é o Farol de Itapuã, que se opõem a força mítica local e representa a imposição das forças portuguesas nas ações de conquista, exploração, opressão e expansão das relações coloniais na Bahia.






FAROL


Ilustração de Marcelo Luz


A personagem Plakafor revela-se na sedução dos tempos modernos que vão trazendo os valores capitalistas representando no século XX uma nova ordem mundial pautada no“Time is Money”.




PLAKAFOR


Ilustração de Narcimária Luz


Como não poderia deixar de ser, a autora resgata a riqueza da presença tupinambá e africana numa abordagem cosmogônica que traz: O Ojixê(mensageiro),um pássaro que dá força e coragem para iniciar o auto-coreográfico.Tem também Agemó (camaleão), o apalô que na tradição nagô é responsável pelas narrativas que asseguram as gerações futuras o acesso as histórias que caracterizam a formação da comunidade .




AGEMÓ


Iustração de Marcelo Luz


Essas são as personagens responsáveis por conduzir a linguagem lúdica nas teias da narrativa.Representando os tupinambá aparecem os curumins são as crianças,e a liderança do avô Aracê, guerreiro que zela pelos saberes de seus ancestrais.A presença africana está representada pelos awon Omodê, assim são chamadas as crianças do povo Nagô e Ologbon,também liderança comunitária e guerreiro que zela pelos saberes de seus ancestrais.
Esta perspectiva abre novos horizontes que vão sendo delineados pelos personagens utilizando a linguagem lúdico-estética como recurso teórico-metodológico que pode e deve ser usado pelos/as professores/as baianos, pois não é apenas a história do bairro de Itapuã que é abordada, mas a história da Bahia.


A adoção desse livro na s escolas baianas irá fortalecer o patrimônio civilizatório tupinambá e afrobrasileiro. “Itapuã quem te viu, e quem te vê” fala a todo o tempo da presença africana a partir da tradição nagô e dos povos inaugurais. Em todo o auto, respiramos esses universos, seus vínculos de sociabilidade, cuidados com a natureza, sua estruturas hierárquicas, enfim, valores e linguagens que, sobretudo reivindicam a alteridade civilizatória presente nas nossa comunalidades na Bahia.
Com certeza, um dos objetivos em realizar este grandioso trabalho é o de encorajar as novas gerações de educadores/as no sentido de aprofundar seus conhecimentos sobre as perspectivas de linguagens afrobrasileira em uma proposta pluricultural que se sustenta através das tradições que expandem o universo mítico simbólico do patrimônio civilizatório afrobrasileiro.
A publicação é um dos desdobramentos do estágio pós-doutoral da autora no campo da Comunicação e Cultura na Escola de Comunicação da Universidade Federal do Rio de Janeiro com apoio do CNPQ, - Conselho Nacional de Pesquisa e Desenvolvimento Científico e Tecnológico e da FBN-Fundação Biblioteca Nacional.





OLOGBON
Ilustração de Marco Aurélio Luz

Rosângela Accioly e´formada em Pedagogia,pesquisadora do PRODESE-Programa Descolonização e Educação,Professora da rede municipal de Lauro de Freitas e educadora da ACRA.

O livro está sendo vendido na EDUNEB-Editora da UNEB,LDM da Faculdade de Educação da UFBA e livraria do Aeroporto.

domingo, 19 de dezembro de 2010

IPAC DISPONIBILIZA LIVROS GRATUITAMENTE NA INTERNET

Foto disponível em www.ipac.ba.gov.br
Por Felipe Dieder

As cinco publicações sobre patrimônios intangíveis da Bahia estão disponíveis para download.
De importância fundamental para a memória e a difusão de bens culturais imateriais do estado, cinco publicações do Instituto do Patrimônio Artístico e Cultural (IPAC) sobre patrimônios intangíveis da Bahia já estão disponíveis para download gratuito nos sites da autarquia estadual, www.ipac.ba.gov.br, e da Secretaria de Cultura (SecultBA), www.cultura.ba.gov.br. Lá estão, na íntegra, os livros sobre a Festa de Santa Bárbara e o Desfile dos Afoxés, manifestações culturais que ocorrem em Salvador, o Carnaval de Maragojipe na cidade de mesmo nome, no Recôncavo baiano, a Festa da Boa Morte em Cachoeira, e o Pano da Costa que, segundo historiadores, foi o principal produto africano exportado e consumido na Bahia nos séculos 18 e 19. Ao acessar o site do IPAC, os interessados devem procurar o link downloads, que fica na barra superior da página principal do site oficial do instituto, buscar a sessão Cadernos do IPAC e escolher quais dos livros deseja. Os arquivos são obtidos em PDF (Portable Document Format) e podem ser salvos em qualquer microcomputador ou pen-drive.
As versões impressas variam de 90 a 120 páginas, cerca de 20 ilustrações e fotografias em cada exemplar que tem formato de 21 por 29,7 centímetros, fechado. “A distribuição dos livros impressos está sob coordenação do gabinete do IPAC, através do endereço eletrônico ouvidoria.ipac@ipac.ba.gov.br”, alerta Moniz. Três dos Cadernos do IPAC, o Desfile dos Afoxés, Festa da Boa Morte e Carnaval do Maragojipe, são complementados com documentários em DVD, que se encontram colados nas contracapas de cada exemplar das publicações. Os documentários foram produzidos com apoio do Instituto de Radiodifusão da Bahia - Irdeb, através da TV Educativa.
Para elaboração dos dossiês que permitem o registro de Patrimônios Imateriais da Bahia, o IPAC disponibiliza equipes formadas por historiadores, sociólogos, antropólogos, fotógrafos e museólogos, entre outros profissionais, que realizam coleta de documentos e fotos, entrevistas e pesquisas. Ao final, são analisados os dados e elaboradas justificativas, fazendo com que todo o material passe a integrar o dossiê. O IPAC deve realizar ainda estudos sobre o Ofício dos Vaqueiros, Ofício dos Mestres Organistas e sobre a Festa do Bembé em Santo Amaro da Purificação. Todos devem ganhar publicações exclusivas e vídeodocumentários.

(Contatos ASCOM/IPAC: (71) 3116-6673, 3117-6490, ascom,ipac@ipac.ba.gov.br.
Acesse: www.ipac.ba.gov.br Facebook: Ipacba Patrimônio Twitter: @ipac_ba)

COLEÇÃO HISTÓRIA GERAL DA ÁFRICA EM PORTUGUÊS

“Publicada em oito volumes, a coleção História Geral da África está agora também disponível em português. A edição completa da coleção já foi publicada em árabe, inglês e francês; e sua versão condensada está editada em inglês, francês e em várias outras línguas, incluindo hausa, peul e swahili. Um dos projetos editoriais mais importantes da UNESCO nos últimos trinta anos, a coleção História Geral da África é um grande marco no processo de reconhecimento do patrimônio cultural da África, pois ela permite compreender o desenvolvimento histórico dos povos africanos e sua relação com outras civilizações a partir de uma visão panorâmica, diacrônica e objetiva, obtida de dentro do continente. A coleção foi produzida por mais de 350 especialistas das mais variadas áreas do conhecimento, sob a direção de um Comitê Científico Internacional formado por 39 intelectuais, dos quais dois terços eram africanos.”
http://www.unesco.org/pt/brasilia/dynamic-content-single-view/news/general_history_of_africa_collection_in_portuguese/back/20527/cHash/fa3a677a3d/

domingo, 12 de dezembro de 2010

CORPO E IMAGEM DOS TERREIROS/DEBATE

No dia 18 de novembro,aconteceu o evento “Corpo e Imagem dos Terreiros” contemplado pela seleção pública de debates presenciais do Programa Cultura e Pensamento 2009/2010. O debate foi realizado no CEAO –Centro de Estudos Afro-Orientais,que teve a curadoria dos fotógrafos Denise Camargo e Paulo Rossi.A Mesa do debate além da participação de Marco Aurélio Luz também teve Bauer Sauer,Adenor Gondim ,Aristides Alves e Marcelo Bernardo da Cunha.
Nosso colaborador Marco Aurélio Luz apresenta para o blog da ACRA um breve relato da sua participação nesse evento.
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No centro Marco Aurélio Luz,à esquerda Aristides Alves e à direita Marcelo Bernardo da Cunha.

Marco Aurélio Luz iniciou o debate,trazendo como reflexão um trecho da carta de Accioly Neto(um dos chefões da revista O Cruzeiro) que gerou uma escandalosa reportagem nos anos 1950,cujo efeito principal foi alimentar o preconceito às religiões afro-brasileiras:

O que há é o seguinte : nosso chefe acredita QUE JOSÉ MEDEIROS SERÁ O ÚNICO FOTÓGRAFO BRASILEIRO CAPAZ DE REALIZAR UMA FAÇANHA SEMELHANTE – eu quase que participo da mesma opinião, muito embora os rapazes cá de casa digam que TAMBEM ELES PODERIAM FAZER O MESMO...Muito bem, você será capaz de nos trazer uma reportagem ao menos semelhante ao de Clouzot ? Bem sei que agora a coisa está mais difícil depois do escândalo da Paris-Match. Mas nada existe de impossível quando há dinheiro para gastar, e vocês estão autorizados a gastar o que for necessário para conseguir o que queremos. PARA LAVAR NOSSA CARA TÃO DURAMENTE ATINGIDA PELA REPORTAGEM DE CLOUZOT. (“nossa cara” quer dizer, nossa honra de revista que realiza as melhores reportagens do Brasil ). Você é capaz negróide amigo ? Pois então mãos à obra para construir o maior cartaz da reportagem brasileira. Veja se Arlindo o auxilia, se esse paulista peçonhento e prosa p’ra chuchu sabe fazer alguma cousa a não ser descobrir tramas comunistas inexistentes...”

(In Álvaro Kassab, “1951, o ano em que Clouzot, O Cruzeiro e intelectuais rodaram a baiana”. Jornal da Unicamp Ed. 259 de 19/07 a 1/08 de 2004. O trecho dessa carta tem origem na documentação da pesquisa do professor Tacca, ”Entre Paris Match e O Cruzeiro Imagens do Sagrado” de 1983.)

Clouzot foi um conhecido cineasta francês que publicou a reportagem “Les Possédes de Bahia” que foi reproduzida em seguida pelo jornal A Tarde.
A reportagem da revista O Cruzeiro foi intitulada “As Noivas dos Deuses Sanguinários”. Essas reportagens que deram o que falar e até morreu gente, se tornaram também um ponto de referencia para reflexões do fato pelos mais distintos ângulos.
Cabe-nos aqui procurar compreender como é construída a ideologia do preconceito pela linguagem desses meios de comunicação de massa.
Primeiramente cabe destacar que essa ideologia, que podemos assim dizer que se trata de uma tentativa de genocídio ideológico, já estava instalada nos arquivos da Razão de Estado da República principalmente a partir dos trabalhos acadêmicos de Nina Rodrigues e seu seguidor Arthur Ramos dentre outros.O primeiro utilizou-se das teorias da psiquiatria da época para projetar o conceito de histeria sobre a manifestação de entidades sagradas pelas sacerdotisas. Com isso visava depreciar a religião afro-brasileira fonte da cultura e da identidade do povo afro descendente. O segundo utilizou-se de um mito “recolhido” na África pelo tal Coronel Ellis, agente do colonialismo britânico e, da psicanálise da época, para dizer que a narrativa que se refere à origem dos orixás da religião é uma expressão do complexo de Édipo e, portanto a religião afro–brasileira e sua cultura eram “nevrosadas” e “atrasadas”. Convém sublinhar que antes disso esse mito era completamente desconhecido pela comunalidade das tradições nagô.

Um dos ângulos do auditório do CEAO e o público atento às contribuições do debate.

Essas construções ideológicas visavam dar instrumentos ao poder de estado para combater a forte presença das milenares tradições civilizatórias africanas herdadas pela ancestralidade afro brasileira procurando desqualificá-las e com isso projetar políticas genocidas visando a realização da política de embranquecimento iniciadas no tempo de D. João VI, uma estratégia para garantir a continuidade do modelo colonial.
Então as matérias da imprensa de que estamos tratando agora tem os mesmos objetivos, e além de tentar ganhar dinheiro com o aumento da tiragem visam alimentar o genocídio ideológico fortalecendo os estereótipos de “selvagens”, “bárbaros”, “primitivos” para garantir a continuidade neocolonial. Como na época, após a “segunda guerra mundial”, a ideologia do racismo da superioridade e inferioridade de “raças” humanas estava em baixa, a tática racista de então é de atacar as linguagens e os valores de civilização concentrados na religião.A tática então é operacionalizar a ideologia da imagem, especificamente a fotográfica. A fotografia ao nível da razão de estado ganha status de veracidade. “Ver para crer”, a relação olho cérebro é hipertrofiada e é a base da vigilância e das comprovações dos fatos no âmbito do Estado.


"No reino de Ossaiyn" Foto Narcimária Luz

Assim impulsionados pelo voyeurismo que caracteriza a semântica das descobertas, as reportagens quebram segredos e os transformam em “furos de reportagem”.
Na verdade a fotografia é uma construção da técnica de uma determinada sociedade. A ela é falsamente atribuída valor de veracidade, mas na verdade o resultado da foto passou pelas demandas institucionais ao fotógrafo, por suas projeções ideológicas, pelos efeitos de laboratório e de edição. Essa realidade, entretanto é oculta para o receptor para que se produza o efeito de falsidade ideológica.
No caso tanto o cineasta francês, quanto o fotógrafo brasileiro invadiram um espaço sagrado limitado, reservado apenas aos que tem poderes para lidar com determinados aspectos da liturgia. São sacerdotisas e sacerdotes com preparo e iniciação para tanto. Aqui se trata de forças invisíveis expressas através de representações simbólicas que integram uma cosmogonia que constitui uma sabedoria milenar desse acervo civilizatório.

"No reino de Ossaiyn" Foto Narcimária Luz


Sem considerar nada disso fotografou-se o fotográfavel, o visível e recortaram-se as imagens que interessavam capazes de provocar sensacionalismo e rejeição. Levaram esses recortes de imagem para outro contexto, o da presença colonial européia nos aparelhos ideológicos com seus valores discriminatórios dando as imagens uma outra significação reforçadas pelos textos.
Mãe Senhora Iyalorixá Oxun Muiwa nilê Axé Opo Afonjá e Iyanassô apontou novos caminhos deixando-se fotografar com toda sua majestade pelo o então fotógrafo Pierre Verger que recebeu o ijoye, o título de Oju Oba.

"No reino de Olokun" Foto Narcimária Luz


A partir de então a fotografia e os recursos de imagens cinematográficos ou eletrônicos podem ser técnicas aliadas para desmitificar o preconceito e para “louvar o que merece ser louvado” como expressa a música de Gilberto Gil. Já há muitos desses trabalhos em circulação e para tanto é exigida uma nova postura, o fotógrafo tendo de se situar num outro continente cultural envolvido por uma outra bacia semântica, onde o sagrado é envolvido por segredos e mistérios e como disse Mãe Senhora:- “metade se fala metade se cala”; e parafraseando podemos dizer; metade se fotografa, metade fecha-se o olhar.

sábado, 11 de dezembro de 2010

Imagens Humanas Parte I

Apresentamos um vídeo especial com João Roberto Ripper,fotógrafo carioca que desenvolve trabalhos abordando as questões urgentes sobre direitos humanos.Ripper é um dos responsáveis pela Agência Escola Imagens do Povo na Favela da Maré no Rio de janeiro dedicada a formação de jovens fotógrafos.No vídeo, temos a oportunidade de conhecer o autor João Roberto Ripper comentando seu trabalho e pontos da exposição, sua primeira mostra intitulada “Imagens Humanas”.Essa Mostra foi resultado de trinta e cinco anos de encontros com realidades de populações de vários cantos do Brasil.A curadoria ficou sob a responsabilidade de Dante Gastaldoni que dedicou-se a selecionar do acervo de mais de 150 mil fotos as que compuseram a exposição em junho no Rio de Janeiro.


segunda-feira, 6 de dezembro de 2010

PRODESE PARTICIPA DA ENCICLOPÉDIA INTERCOM DE COMUNICAÇÃO

A produção científica desenvolvida ao longo dos anos no âmbito do PRODESE, agora faz parte da Enciclopédia de Comunicação organizada pela Sociedade Brasileira de Estudos da Comunicação-INTERCOM. A professora Doutora Narcimária C. P. Luz foi convidada para contribuir com o Vol. I que apresenta 1.242 páginas que tratam de aspectos do conhecimento comunicacional (conceitos, categorias analíticas, expressões e referencias). Narcimária Luz colabora na Enciclopédia de Comunicação com o verbete “Ritos de Sociabilidade”, conceito vem estruturando seus estudos e pesquisas no campo da Comunicação e Cultura.
“O Primeiro volume da Enciclopédia Intercom de Comunicação, denominado de Dicionário Brasileiro de Conhecimento Comunicacional contou com a participação de mais de 300 autores-colaboradores que redigiram mais de mil verbetes. Os textos abordam conceitos relativos às áreas de propaganda, jornalismo, relações públicas, entretenimento, teleducação, bibliologia, fonografia, quadrinhologia, fotografia, cinematografia, radialismo, televisão, videologia e cibermidiologia” (http://www.almanaquedacomunicacao.com.br/noticias/329.html)
O coordenador da Enciclopédia, Professor Doutor José Marques de Melo comentou sobre a importância da obra: “... Mobilizamos mais de mil pessoas, que trabalharam voluntariamente, no Brasil inteiro. O resultado desse mutirão intelectual esta, aqui, demonstrado, pretendendo ser um marco na consolidação do campo das Ciências da Comunicação, no Brasil, e um passaporte para a nossa inserção soberana na comunidade internacional da área. De posse desse referencial teórico, a INTERCOM ganha mais credibilidade, na arena mundial, atuando como difusora das identidades brasileiras, nesse campo vasto, porém, segmentado. Constituído, sobretudo, por microcomunidades que ora cooperam entre si, ora disputam espaco para assegurar a projeção já conquistada, sua vanguarda vem atuando, organicamente, para garantir mais recursos para o ensino e a pesquisa... A Enciclopédia INTERCOM pode ser um divisor de águas na história do pensamento comunicacional brasileiro, na medida em que habilita os membros da nossa comunidade acadêmica a assumir o perfil de intelectuais orgânicos.”
Vale à pena conferir a Enciclopédia em sua primeira versão, disponível em arquivo digital no endereço http://www.fundaj.gov.br/geral/ascom/Enciclopedia.pdf. A versão impressa será lançada em 2011.A professora Doutora Narcimária C. P. Luz está organizando para 2011, um ciclo de Conferências e Festivais desdobramentos da produção científica do PRODESE-Programa Descolonização e Educação, trazendo professores/as e pesquisadores/as, abordando aspectos no campo da Comunicação e Cultura.

“A MORTE VIOLENTA DO OUTRO NÃO PODE CONVERTER-SE EM FANTÁSTICO SHOW DA VIDA”.

Essa é uma das reflexões desenvolvidas por Muniz Sodré no artigo “Reality show em tempo real” publicado no Observatório da Imprensa dia 30/11/2010.
Trazemos para o espaço do blog ACRA essas e outras reflexões importantes sobre as narrativas midiáticas que vêm conduzindo as impressões sobre os acontecimentos no Rio de Janeiro. Muniz Sodré em artigo , tece comentários que tratam da ética do jornalismo que como ele mesmo diz” A mídia é aqui também objeto de preocupação”.
Destacamos uns fragmentos do artigo, mas convidamos nossos/as visitantes a ler na íntegra o texto disponível em: http://www.revistaforum.com.br/noticias/2010/11/30/reality_show_em_tempo_real/
Comenta Muniz:
“(...)Evocativa de Robocop, conhecido personagem cinematográfico, a máquina televisiva associou-se à metáfora da "máquina de guerra", usada pela mídia para caracterizar as ações policiais. Com ela, a cobertura converteu-se numa espécie de "Tropa de Elite 3", produzindo efeitos de identificação projetiva, segundo os quais estariam entrando em ação aqueles que o colunista Merval Pereira designou como "centenas de capitães Nascimento encarnados em cada um dos soldados do Bope" (O Globo, 26/11/2010).Como num filme ou numa telenovela, constrói-se uma polaridade (os bons contra os maus), da qual se alimenta a narrativa midiática. O texto de Destak é explícito: "Éramos nós atirando, acenando com bandeiras brancas sobre lajes e nos escondendo dos tiros dentro de casa, contra eles, que fugiam ou nos afrontavam. (...) A cidade se uniu diante da TV, tentando torcer por si". Essa polaridade ("nós" contra "eles") é tão falsa quanto a polaridade entre polícia e bandido, já que, na corrupção cotidiana, não raro um termo equivale ao outro.
E ainda:
Há algo de socialmente obsceno nesse transbordamento do espetáculo. É moralmente inadmissível essa assimilação de uma tragédia urbana, com mortes e sofrimento, a um show de TV. Nem faz justiça ao comportamento da polícia: o Bope sentiu-se prejudicado, em plena ação, pela cobertura televisiva; o secretário de Segurança enfatizou que "não há nada a celebrar". O comedimento da polícia é uma crítica implícita à falta de consciência crítica dos jornalistas. Como poderia manifestar-se essa consciência?Antes de tudo, no questionamento desse modelo de jornalismo, que confunde a informação responsável do fato com a exposição obscena (em seu sentido radical, esta palavra de origem latina significa postar-se diante da cena – ob-scenum – sem as devidas mediações culturais) dos acontecimentos. Simplesmente mostrar não é informar...”
Acompanhem o artigo na íntegra em :http://www.revistaforum.com.br/noticias/2010/11/30/reality_show_em_tempo_real/

segunda-feira, 29 de novembro de 2010

UM SONHO: ”SER MESTRE DE CAPOEIRA COMO MEU PAI"



Por Narcimária C.P. Luz


A imagem que abre essa postagem apresenta o encontro de dois arcos de berimbau fincados na areia da praia diante do sol, aludindo a um belo portal que acena para o infinito, o horizonte, o mistério, o que não sabemos...
Reparem que há entre esses arcos, uma luz que nos anima a continuar, não desistir, não ter medo de tentar ser feliz, de SONHAR nos encorajando a insistir na proposição de uma ÉTICA DO FUTURO para as gerações sucessoras.
O berimbau é um ancestral!

O berimbau dá a cadência e dinâmica da roda!

O berimbau é a força da roda de capoeira!

BERIMBAU é RODA/RODA é VIDA!!!

Ê, volta no mundo camará!


Ê, Ê volta o mundo dá volta camará!

Berimbau fala, comunica linguagens que exalta um corpo livre em permanente movimento, em transcendência e mais do que isso, capaz de realizar e expandir o modo próprio africano de existir e manter a identidade profunda do grupo e da comunidade. Essa é a sabedoria do viver, legado dos nossos/as antepassados/as!Esse belo portal feito de arcos de berimbau é uma das formas que a ACRA escolheu para demonstrar seu pesar pela perda trágica de um futuro Mestre de capoeira que tinha apenas 10(dez) anos de idade. Estamos nos referindo a Joel da Conceição Castro, filho do Mestre de capoeira “Ninha”.
O coração de Joel pulsava na cadência do berimbau, que lhe animava a viver intensamente a alegria da roda de capoeira, de onde transborda muita VIDA, VALORES DE CIVILIZAÇÃO, e todo CONHECIMENTO milenar africano que a roda faz circular.
Seu sonho? ”Ser Mestre de capoeira como meu pai” Joel morava no bairro Nordeste de Amaralina, em Salvador e morreu de forma trágica atingido por uma bala perdida na cabeça quando se preparava para dormir. As informações dadas pelos pais e vizinhos de Joel é que domingo em torno das 23 hs havia uma ronda da Polícia Militar no bairro e ocorreu um tiroteio, que atravessou a janela da casa do pequeno Joel atingindo-o.
Interrompeu-se um sonho!
O silêncio foi quebrado por gritos de socorro, dor e a agonia de não deixar a impunidade vigorar. “Com faixas, cartazes e ao som do toque do berimbau e roda de capoeira, os familiares, vizinhos, amigos da escola e do bairro, velaram o corpo do menino que era torcedor do Bahia, e por isso, foi enterrado junto com a bandeira do time. Após o momento do adeus, todos os presentes saíram em uma caminhada rápida pelo bairro, como forma de protesto pelo crime que chocou os moradores do local. (...) Joel estudava na 3ª série da Escola Municipal Maria Amália Paiva, no Nordeste de Amaralina. ‘Ele era um dos nossos melhores alunos’, destacou Mestre Mico que junto com o pai de Joel desenvolve trabalhos na Associação de Capoeira Gingado Baiano. ’Nosso trabalho é resgatar as crianças da rua e dar uma ocupação’, frisou.” (Cf.www.coreio24horas.com.br)
Mestre Ninha pai de Joel, iria viajar para a Itália em 2011 com ele. É importante destacar aqui uma mensagem da professora Naiara Bittencourt que circulou entre educadores/as da ACRA, expressando sua tristeza diante da crescente violência que vem ceifando a vida de crianças e jovens:
“Meu coração está dilacerado. Ligo a televisão para assistir as notícias do dia e vejo desgraça, tristeza... Meu Deus onde vamos parar? Por que tamanha violência e brutalidade com nossas crianças e jovens? Sou uma futura pedagoga e sinceramente... A cada dia que passa fico mais triste com a sociedade que estou inserida. Tráfico de drogas, polícia, justiça, paz, engano, vidas cortadas, choro, mãe, pai, tios, decapitação, sonhos... Quando me lembro da seguinte pergunta: '' o que faremos com a nossa juventude negra? '', feita há alguns meses atrás por Silvio, no auge desse desabafo, penso que não sei o que fazer. Será que os meus estudos, meus pensamentos por uma sociedade igual é impossível?Amigos e amigas és aqui um desabafo, um choro de alguém muito, muito triste com esse mundo!”
Não vamos utilizar esse espaço para desenvolver reflexões e argumentações de cunho sociológico, antropológico, jurídico, ou mesmo estatístico (dentro do esquadrinhamento do discurso acadêmico) sobre a dinâmica da violência que vem tragando o direito à existência em diversas comunalidades da Bahia e do Brasil. Queremos neste momento apenas registrar a nossa dor e comoção diante dos fatos que vêm se expandindo ao nosso redor, e nos deixando impotentes, angustiados/as.
Na ACRA as crianças, os jovens, pais e educadores/as indagam constantemente: O que fazer?Como assegurar aos nosso/as filhos/as o direito de ser, de sonhar, de ser feliz, de crescer com dignidade, ter direito à vida?
A ACRA aproveita o espaço do blog e convida todos/as vocês para pensar conosco essas questões (e outras que podem ser sugeridas pelos/as nossos/as visitantes), com o intuito de sugerir perspectivas de políticas públicas que cessem a dor e agonia que paira sobre as territorialidades afrobrasileiras, que infelizmente são as mais agredidas por essa dinâmica da violência.A seguir apresentamos um vídeo que tem o pequeno Joel com seu pai Mestre Ninha onde ele expressa o desejo e sonho de menino de ser como o pai, “um mestre de capoeira”.
Joel estava animado de ir para Itália em 2011 com o pai atendendo a um convite, para apresentar todo o seu talento e destreza na roda de capoeira herança de nossos ancestrais africanos.



Fica aqui nosso carinho para a família de Joel através de um forte abraço das crianças, jovens, pais e educadores/as da ACRA.

O SONHOU NÃO ACABOU.
NOSSAS CRIANÇAS E JOVENS CONTINUAM A SONHAR.
Parafraseando o saudoso poeta Gonzaguinha:
"...Nunca se entregue nasça sempre com as manhãs.../Fé na vida,fé no homem/Fé no que virá..."

domingo, 28 de novembro de 2010

PARA QUE TODOS SAIBAM:"TODO MENINO É UM REI"

SAUDADES!!!
UMA HOMENAGEM AO PEQUENO E PRECIOSO JOEL

Ê, volta no mundo camará...
Ê, Ê volta no mundo camará!
"Todo menino é um rei
Eu também já fui rei
Mas quá!
Despertei!
(...)
Por cima do mar da ilusão
Eu naveguei!
Só em vão
Não encontrei
O amor que eu sonhei
Nos meus tempos de menino
Porém menino sonha demais
Menino sonha com coisas
Que a gente cresce e não vê jamais
(...)
A vida que eu sonhei
No tempo que eu era só
Nada mais do que menino
Menino pensando só
No reino do amanhã
A deusa do amor maior
Nas caminhadas sem pedras
No rumo sem ter um nó
(...)Todo menino é um rei
Eu também já fui rei..."
(Letra e música de Nelson Rufino e Zé Luiz)
Descanse em paz Joel.
Saiba que o seu sonho se multiplicou nos corações de todas as crianças e jovens da ACRA.

UM CANTINHO DA ÁFRICA ENCANTADA EM SALVADOR/BA:100 ANOS DE ILÊ AXÉ OPÔ AFONJÁ

POR SÉRGIO BAHIALISTA



Foto disponível em http://saquinhosdecheiros.blogspot.com/2009/05/novos-tecidos-africanos-e-um-saco.html

Cordel banhado em dendê
Te convida a pendurar
Todo seu imaginário
Sua força e seu encantar
Nesse pedacinho da África
Que começarei a versar

Primeiramente inicio
Dizendo para vocês
Que aqui cumpro uma missão
Assumida de uma vez
Com nossa ancestralidade
Todo dia, ano e mês


Falar do lugar encantado
Do São Gonçalo do Retiro
É adentrar selva encantada
Linda que sempre me refiro.
Opó Afonjá tira o pano
Em suas Iyalorixás me miro

Tudo começou pela
Resistência à intolerância
O Terreiro da Casa Branca
Na luta contra ignorância
Criou a Eugênia Anna
Dos Santos que conclama
Seu povo à sua bonança.


http://modovestir.blogspot.com/2008/09/tecidos-africanos-estampas-e.html


E em 1910
Fundou o belo Terreiro
Ketu do Ilê Axé
Opô Afonjá, guerreiro.
E fincou sua Arkhé
Iniciando Bela fé
Na roça foi pioneiro

As Religiões tão belas
De Matriz Africana
Sempre nos ensinam a cuidar
Da Natureza tão bacana
O único verde de lá
Está no belo “Afonjá”
Nessa Salvador tão sacana

No seu templo principal
O Santuário de Oxalá
Reina ao lado da nossa
Querida Mãe Iemanjá
E a casa de Xangô
Espalha justiça e amor
Para todos que vão lá

Lá também foi fundada
A primeira escola-Terreiro
A escola municipal encantada
Acolheu seus filhos guerreiros


Valorizou seu mundo ancestral
Com o nome tão genial
Da Mãe Aninha, tão pioneiro


Nessa Comunidade Obá Biyi
O encanto negro foi regado
Pelo Mestre que assumiu
Missão de regar o legado
Do Povo da sua África
Para os pequenos chegados


http://modovestir.blogspot.com/2008/09/tecidos-africanos-estampas-e.html


Este forte é Mestre Didi
Que trouxe nos seus contos
Todo encanto dos orixás.
Para as aulas, mais pontos
Trazendo o mundo mítico
Africano em seus recontos

As nossas crianças negras
Sempre quiseram ser
Reconhecidas pela negritude
Que carregam em seu viver
Graças a Oba Biyi o sonho
Concretizou-se nesse querer


Na Oba Biyi todos querem
Seus filhos de anel no dedo


E aos pés de Xangô
Revelando seu segredo
E da escola terreiro serem
Guerreiros e viverem
Sua África sem medo

Suas sacerdotisas nesses
100 anos de história
Construíram força e beleza
Que ficarão na memória
De quem preza pelo sagrado
Africano, seu legado
De honra e muita glória.

Até 1938
Mãe Aninha comandou
Mãe Bada de Oxalá


Tomou após a que passou
Até 41 foi a hora (1941)
Depois a Mãe Senhora
O reinado carregou



Logo depois Mãe Ondina
De Oxalá assumiu
Consolidando toda força
Que o ancestral ali construiu
Abrindo “caminhos d`Áfricas”
Encantos míticos e mágicas
Que todo povo negro viu

A missão de levar adiante
O legado magistral
Depois que Mãe Ondina
Foi para o Orum ancestral
Foi passada para ela
A guerreira Mãe Stella
De Oxossi, a missão tal.

Mãe Stella foi quem usou
As armas do escrever
Para defender seu povo,
O canto d`África do viver.
Escreveu com brilhantismo
Afrontando o sincretismo
Firmando a fé que tanto crê


Assim Mãe Stella pregou
A necessidade do registro
Pra combater os lapsos
De memória tão sinistro
Firmar que o candomblé
Segue só a sua fé
Afirmando o ser bonito

E com espírito lutador
Mãe Stella criou o Museu
Ilê Ohun Lailai
A Maravilha que nasceu
Tradução disso? Sem briga:
(Casa das coisas antigas)
Guarda o Axé que ali cresceu

Paz, beleza e sagrado
São palavras que reinam lá
O Palácio de Xangô
Senhor da Justiça, já!
Reúne aos seus pés os filhos
Da grande Mãe Iyá

Aqui só deixei um pouquinho
Daquele lugar encantado
Pra te deixar curiosa (o)
Para conhecer aquele lado
E viver uma das Áfricas
Que aqui tem chão marcado

Como uma missão dada
Pra mim é missão cumprida
Saio mais leve dos versos
Dessa escrita merecida
Pois Afonjá vive pra dizer
Como é que faz pra viver
Nessa vida tão sofrida

Oke Arô e aquele Axé
Para todo ser vivente
Do Orum e do Ayie
Que vive tão plenamente.
Usem esse Cordel no educar
Para assim logo acabar,
Com intolerância indecente.




domingo, 21 de novembro de 2010

ANGOLA JANGA! VIVA ZUMBI!

PÁSSARO MENSAGEIRO DA LIBERDADE
TELA DE JANUÁRIA PATROCÍNIO

PARABÉNS JORGE!


Viva Zumbi!

Por Marco Aurélio Luz

Escutando atentamente o conteúdo da música de autoria de Jorge Benjor em homenagem a Zumbi dos Palmares, procuramos realçar as referências que são feitas aos povos africanos que instituíram o quilombo. Muito antes do tráfico escravista europeu, esses povos compunham o antigo império do Congo. A letra alude também, a uma princesa que é exposta num leilão. A essa afronta a libertação vem “quando Zumbi chegar”.
Mas a liberdade que Zumbi representa, não é uma categoria vazia nem se restringe a escapar ao flagelo da escravidão mas sobretudo, trata-se de devolver o lugar de princesa, rei e rainha africanos na “Angola Janga” o nome pelo qual era chamado por seus integrantes, o quilombo dos Palmares. Convém destacar, que quilombo era o nome dado aos acampamentos militares da guerra de movimento para o combate as tropas dos portugueses realizados pela rainha Ginga Ngola Kiluanji do reino do Ndongo.
Assim, a Angola Janga estabelece a reposição de uma nova territorialização de continuidade, das identidades livres, religiosas, étnicas e sócio-culturais.
A liberdade de manter íntegras suas linguagens próprias e seus valores que emergem do fluxo contínuo do processo de civilização africano no Brasil e nas Américas, honrando a memória de seus ancestrais.

sábado, 13 de novembro de 2010

CORPO-IMAGEM DOS TERREIROS

Abrimos o espaço do blog para divulgar o projeto “Corpo,Imagem dos Terreiros” contemplado pela seleção pública de debates presenciais do Programa Cultura e Pensamento 2009/2010.A curadoria do projeto está sob a responsabilidade dos fotógrafos Denise Camargo e Paulo Rossi.A produção e execução está sob a responsabilidade de Fabiane Beneti.
Segundo Denise Camargo trata-se de”... Um diálogo entre pesquisadores de diversas áreas, representantes das comunidades religiosas, curadores e fotógrafos, o debate Corpo-imagem dos terreiros apresenta a fotografia no contexto dos rituais religiosos de matriz africana. Discute um repertório crítico e visual para pensar a formação dos terreiros, a experiência ritual e a produção de imagens. O objetivo é discutir a produção de imagens fotográficas, no contexto dos rituais religiosos de matriz africana e gerar um repertório capaz de pensar, criticamente, essa manifestação cultural brasileira. E é um dos desdobramentos do debate on-line Representações imagéticas das africanidades no Brasil, contemplado com o Programa Cultura e Pensamento 2007, disponível em www.studium.iar.unicamp.br/africanidades.”
O evento é gratuito,tem certificado para os participantes presenciais e on-line e os debates serão transmitidos ao vivo no site: www.oju.net.br/corpoimagem.
As organizadoras do evento orientam que para participar basta encaminhar uma mensagem para oju.cultural@gmail.com,informando no assunto seu nome completo e o nome da cidade do debate a que você assistirá. A resposta automática é a sua inscrição.
A seguir a programação que ocorrerá dia 18/11 no Centro de Estudos Afro-Orientais-CEAO.
PROGRAMAÇÃO
18/11 das 18h30 às 20h30 – Salvador (UFBA/CEAO – Auditório Milton Santos, do Centro de Estudos Afro-Orientais – Praça Inocêncio Galvão, 42, Largo Dois de Julho)
EXPOSITORES:
Marco Aurélio Luz(colaborador assíduo e importante parceiro do nosso blog),Adenor Gondim ,Aristides Alves e Marcelo Bernardo da Cunha.

PROJETO MOVIMENTA BRASIL VISITA A ACRA

Logo do Projeto Movimenta Brasil

No dia 4 de novembro às 15 horas a ACRA recebeu a visita de Tainá Garcia, professora de Educação Física com especialização em Educação Física Escolar e Pilates. O encontro contou com a presença do Diretor Presidente da ACRA Narciso José do Patrocínio, professoras Caroline Nepomuceno, Jaqueline Divino e da colaboradora Célia de Jesus.
A professora Tainá atua desde 2001 em prol de comunidades socialmente desasistidas. Tem experiência em trabalho comunitários no Rio de Janeiro e em Salvador – BA, onde ministra voluntariamente há três anos aulas de Pilates para pessoas com necessidades especiais na visão.
A professora Tainá apresentou o Projeto Movimenta Brasil,que tem como objetivos: traçar caminhos entre as empresas alemãs interessadas em ajudar projetos sociais no Brasil; dar condições para a implantação de infra-estrutura para as atividades esportivas brasileiras; realizar intercâmbios entre o Brasil e Alemanha.
Quando for firmado o acordo entre as empresas alemãs e os projetos sociais brasileiros, o Movimenta Brasil prestará asessoria e mediará o intercâmbio entre as instituições interessadas no projeto.Na sua visita a ACRA além de nos apresentar o Projeto Movimenta Brasil, Tainá conheceu nossa perspectiva de “esporte na ACRA”, que durante certo tempo desenvolveu atividades de futebol, natação e dança, mas por problemas de infra-estrutura e recursos para manter tais atividades não poderam ter continuidade.
No encontro, foi destacado o interesse da Acra em participar como parceira do Projeto Movimenta Brasil,através dos laços já existentes com entidades e empresas que se interessem em promover arte, cultura, esporte e lazer.
A professora Tainá destacou que poderemos contar com sua ajuda profissional para a realização de atividades relacionadas a saúde física das crianças,jovens da ACRA garantindo que numa próxima visita realizará uma palestra sobre o Pilates e o benefício de suas técnicas.
No mais, o saldo da visita foi bastante positivo, pois nos possibilitou discutir novos rumos para o futuro das nossas atividades em 2011,além da importância de manter estratégias que possam firmar as proposições socioeducativas frente às nossas crianças, jovens e suas famílias.
Tainá posteriormente nos escreveu comentando sobre a visita a ACRA:
“Gostaria de agradecer o calor e simpatia com que fui recebida hoje na ACRA. Espero mesmo que possamos firmar essa parceria.”

CORDEL PENDURADO NA EDUCAÇÃO-PARTE II

Acompanhem a segunda parte do vídeo com Sérgio Bahialista conversando sobre a Literatura de Cordel.Semana que vem apresentaremos"ÁFRICA ENCANTADA EM SALVADOR",cordel de autoria de Sérgio Bahialista.Não percam!

Boa escuta!

segunda-feira, 8 de novembro de 2010

"Cordel Pendurado na Educação"- Parte 01

Sérgio Bahialista numa das suas apresentações em evento do PRODESE em julho de 2010 na UNEB

Apresentamos essa semana,aspectos da Literatura de Cordel e sua importância na constituição de linguagens inspiradas no viver cotidiano que caracteriza a diversidade cultural brasileira.
Para conversar com vocês sobre a riqueza do repertório de cordel, temos o prazer de apresentar a uma entrevista com o renomado educador e integrante da equipe de pesquisadores do PRODESE,Sérgio Ricardo Santos da Silva ,mais conhecido como Sérgio Bahialista.Vocês terão acesso a primeira parte do vídeo com Sérgio Bahialista que é: Pedagogo; Psicopedagogo; músico; Coordenador Pedagógico de EJA do NETI – Núcleo de Educação do Trabalhador da Indústria, no SESI – Serviço Social da Indústria; pesquisador do Programa Descolonização e Educação – PRODESE/UNEB – Universidade do Estado da Bahia; Cordelista; integrante da Rede de Arte-Educação Ser-tão Brasil.

Numa das suas contribuições registradas na publicação do PRODESE/SEMENTES Caderno de Pesquisa(Vol.6,nº8 de 2005), Sérgio comentou: “o cordel pode ser uma excelente ferramenta paradidática na sala de aula,não só pela sua importância cultural e pela rica estrutura de ritmo,métrica e rima,como também para promover debates e discussões a respeito das formas de falar e pensar de nosso povo e reatar definitivamente os laços do aluno com a verdadeira cultura brasileira.”


Continuem acompanhando na próxima semana, a segunda parte do vídeo que apresenta outros aspectos da Literatura de Cordel através do educador Sérgio Bahialista.

PRODESE/ACRA NO I CONGRESSO INTERNACIONAL DE LÍNGUAS E LITERATURAS AFRICANAS E AFRO-BRASILIDADES

Professoras Caroline e Naiara frente ao quadro em exposição no evento de autoria do artista Pedro Lima

Nos dias 21 a 24 de outubro na cidade de Seabra-Bahia, ocorreu o I Congresso Internacional de Línguas e Literaturas Africanas e Afrobrasilidades organizado pela Universidade do Estado da Bahia Campus XXIII. O evento contou com a participação de professores,escritores do país e do exterior, estudantes de pós-graduação e graduação. O CILLAA mobilizou a cidade de Seabra, e os moradores apresentavam grande satisfação em sediar o evento.
Caroline e Naiara com Professor Gildeci ,Diretor da Campus XXIII- Seabra/UNEB e Presidente do CIALLAA
As professoras e pesquisadoras Caroline Nepomuceno e Naiara Bittencourt integrantes do grupo de pesquisa Descolonização e Educação-PRODESE e da Associação Crianças Raízes do Abaeté-ACRA,participaram do evento apresentando aspectos das pesquisas que vêm realizando,expondo dois pôsteres com suas produções científicas sobre as atividades na ACRA e inquietações referentes à temática do evento.Cabe registrar também a participação do professor Abílio Manuel Marques que ensina de Inglês na ACRA,que apresentou o tema “O preconceito Lingüístico na sala de aula de uma escola em Lauro de Freitas”.
Professor Abílio apresentando seu estudo no evento
Do conjunto de temas discutidos, destaque para:”Aplicabilidade da Lei 11.645/08”;'' África e Africanidades''; ''Politicas Públicas e Ações Afirmativas'';'' Literaturas: Afrobrasileiras, Angolanas, Cabo-verdenses e Moçambicanas'';"Literatura e espaços Identitários''. Foi sem dúvida alguma,dias de intensas trocas de conhecimento e aprendizagens através da convivência com outras culturas.
Graduandos guineses do curso de Letras da UNEB Campus I e graduandas brasileiras do curso de Pedagogia UNEB/Campus I
No I Congresso Internacional de Línguas e Literaturas Africanas e Afrobrasilidades- CILLAA,foi enfatizado a necessidade da promoção de uma educação de qualidade, pautada na diversidade cultural,compreendendo o patrimônio da comunidades afrobrasileiras como basilares na formação do povo brasileiro. O CILLAA, assim chamado carinhosamente pelos participantes do evento, possibilitou a percepção de que “a África esta em nós”,e isso foi explorado através da riqueza das narrativas orais, literaturas,e dos depoimentos de luta e resistência que circularam nas rodas de discussão.

Naiara Bittencourt, Vilma Reis Coordenadora Executiva do CEAFRO e Caroline Nepomuceno

A professora Caroline Nepomuceno comentou:” um dos pontos marcantes e que causou sentimentos de esperança e perseverança ,são os esforços de superação dos valores que tendem a normalizar, hierarquizar e privilegiar grupos dominantes eurocêntricos,que detém o poder de disseminar seus interesses através do currículo escolar. Aqui,está o desafio: a implementação da Lei 11.645/08,que trata da inclusão no currículo escolar de abordagens alicerçadas no patrimônio civilizatório aborígine e africano no Brasil.”
Caroline Nepomuceno explorou no sua apresentação no âmbito do CILLAA o tema da sua pesquisa
Compondo perspectivas de linguagens africanas e africano-brasileiras para o ensino da matemática”.Segunda a pesquisadora,a recepção das pessoas foi muito positiva, todos mostraram-se curiosos com a temática, pois a grande maioria, não tinha ainda contato com a Etnomatemática e muito menos com a Afroetnomátematica,.Um exemplo foi a observação feita pelo Professor Dr. Amarino Oliveira de Queiroz(Universidade Federal do rio Grande do Norte-UFRN): “Muito bom esse recorte! A Afroetnomatemática é novidade para mim, darei uma pesquisada.” Outro comentário foi Sandra Rejane Ferreira graduanda em Pedagogia e Coordenadora do Núcleo de Práticas Pedagógicas da Faculdade Montessoriana-FAMA, que se mostrou muito receptiva ao tema:” Nossa! Que coragem a sua, é muito difícil trazer essa temática para a sala de aula, ainda mas nessa perspectiva matemática.”

Participantes do I CILLAA e Caroline Nepomuceno apresentando seu pôster
Face a esses comentários a professora Caroline comentou: “o saldo foi muito positivo, colher e semear frutos em meio a uma temática tão debatida durantes esses anos, possibilitando novas práticas, novas ações, novos olhares.”
E ainda:
Durante uma oficina, da qual fiz parte: Educação Quilombola nas aulas de Língua Portuguesa, com as professoras do Centro Educacional de Seabra Catiane de Araújo e Najara Maria Queiroz, foi maravilhoso ver como existem mulheres engajadas na luta pela valorização da educação quilombola, e ver todas as práticas utilizadas por elas no fazer pedagógico. É como se ‘desse um gás’ na gente, um impulso de energia no nosso caminhar, mostrando que é possível colocar nossas propostas em práticas obtendo um resultado positivo.” Afirma Caroline Nepomuceno.
O pôster apresentado pela Professora Naiara Bittencourt,trouxe como inquietação formas de superação da “pedagogia do silêncio” ainda em voga nas salas de aula: “Cala a boca menino/a! propondo linguagens criativas através do legado africano-brasileiro”.

Professores participantes do CILLAA assistem a exposição do tema de estudo de Naiara Bittencourt

Sobre as impressões do CIALLAA, Naiara Bittencourt comentou:”O que nos deixou profundamente felizes foi a apresentação dos nossos trabalhos. Foi um momento de perceber o quanto nos sentíamos seguras ao explanar nossas pesquisas, foi um momento de troca de conhecimento, pois todos os ouvintes nos davam sugestões, foi um momento para defender nossas idéias, quando contestadas. Saímos do CILLAA, com um sentimento de que para mudar o currículo, nosso trabalho, como futuras pedagogas, deverá ser intenso junto a comunidade,escutando-a e aprendendo com ela.As comunidades são células importantes na constituição da identidade cultural de nossas crianças e jovens. Claro, que as dificuldades apareceram a todo o momento, mas o que seria de nós se não tivéssemos correndo nas '' nas veias'' o desejo pela mudança?”

domingo, 31 de outubro de 2010

CONTINUAÇÃO DA ENTREVISTA DO DIA 23/10/2010

Galinha d'angola,uma das referências simbólicas da ancestralidade africano-brasileira

Concluimos essa semana, a entrevista concedida pelo Professor Marco Aurélio Luz(M.A.) a Márcio Nery de Almeida(M.N.).Para conhecer a entrevista na íntegra consultar o SEMENTES Caderno de Pesquisa,Vol. 3,nº5/6 de 2002 pela Editora da UNEB.
Boa leitura!

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MN- Eu agora vou tocar num ponto que considero delicado. Delicado porque já vi muitos posicionamentos contra e a favor, não sei se de correntes mais “progressistas” ou das que mantêm genuinamente a tradição africana, que é o sacrifício de animais. Qual é a opinião do senhor a respeito disso?

MA-Na tradição para o animal ser sacrificado, tem que ter condições muito específicas dentro da liturgia. Ele se apresenta como uma compreensão, uma elaboração de circulação de axé, no que se refere à restituição. Uma pessoa, ou uma comunidade está atravessando determinado problema e precisa reforçar o seu orixá. Há na natureza substâncias que, utilizadas liturgicamente, resultam em acionar axé, promover força de existência.
A conquém ou galinha d`angola é uma ave de profunda significação litúrgica.Pano da Costa do Marfim.Acervo de Narcimária Luz,foto Marco Aurélio Luz

Quando se oferece um animal a um orixá, a um ancestral quer-se reforçar o axé desse orixá ou desse ancestral. Refere-se ao orixá de uma pessoa, ou um orixá ligado a uma comunidade que uma vez reforçado, vai também reforçar a comunidade. Por isso as entidades compartilham essa integração de axé das oferendas com as pessoas. As pessoas comem determinadas partes. Então, há uma comunhão entre as forças da natureza e aquelas pessoas. Agora, para isso, não é preciso ser uma quantidade enorme de animal, mesmo porque não são só animais que compõem as oferendas, são folhas, vegetais e outros elementos, substâncias que entram, que vão ser transformados em alimento pela culinária litúrgica, é uma culinária de símbolos, que expressa a visão de mundo, vai ser repartida entre os fiéis, convidados, sacerdotisas e sacerdotes, é uma confraternização.

MN- Não é só matar por matar o animal...
MA-
Não, não, muito longe disso!...Não...muito pelo contrário! Vai ser uma elaboração muito grande em relação à vida, porque ali você está elaborando o viver e o morrer, uma elaboração muito delicada, muito sutil, muito vivenciada. Ali você não tem o frango do super mercado de que você come um pedaço de perna e come como se nem tivesse um frango ou uma galinha ali. A idéia de galinha está muito longe encoberta pela coxinha... Muito diferente da tradição religiosa, você tem o animal inteiro, com quem você entra em contato... . Você vai viver a dramaticidade natural da situação do viver e do
morrer e, por isso são poucos animais. É uma certa hipocrisia a crítica a esse ato porque nessa sociedade industrial é que o animal é reduzido simplesmente a um animal seriado para morrer e que vai ser engordado de acordo com a necessidade do mercado econômico que exige produção em massa. Vão ser dados a eles alhos e bugalhos para ele alcançar rapidamente determinado peso. Até coisas que comprometem a saúde humana de quem consome, são dadas a esses animais, e os deformam. Eles têm uma vida completamente voltada para isso. São presos ou confinados, vivem uma vida como carne. Eles não vivem uma vida de animal. Eles não têm uma identificação de animal. A eles é projetada uma identificação de carne, um produto de uma cadeia de produção. Não se cria o animal como animal, aquilo é criado como a produção de um bem unicamente para dar lucro, que vai favorecer uma atividade econômica. Então é uma hipocrisia se colocar a favor dessa sociedade que faz isso e lança no mercado diariamente uma enorme quantidade, porque são mortos industrialmente e chegam para o consumidor sem nenhum aspecto daquele bicho que foi e você nem se lembra do que ele é ou que deixa de ser. Então, todas as referências de uma vida social que esteja ligada a isso estão esmaecidas ou apagadas, é simplesmente uma atividade de ir ao super mercado e consumir, assim como você compra uma pêra você compra um animal e tudo mais que é oferecido é tudo produto. Assim como se consome chiclete se consome um animal. Está tudo ali reduzido a condição de produto para o consumo. Não há nada ali que faça pensar na condição da vida animal. Ao contrário da situação da oferenda em que a pessoa que está oferecendo se identifica com aquele animal, fala com ele dá recados e elabora a restituição que integra a dinâmica do ciclo vital, a circulação de axé. Na comunidade terreiro inclusive não é permitido maltratar ou matar qualquer animal. Embora como vimos no início da entrevista a função do caçador do predador acompanha a natureza humana, algo característico da espécie, há diferentes contextos...Agora o que não podemos é aceitar a hipocrisia das críticas vindas do preconceito...

GALO, pintura de Chico da Silva, acervo e foto de M A Luz

MN-Para encerrar a nossa conversa, eu vou tocar noutro ponto polêmico e que é uma coisa que eu também concordo: aqui na Bahia é muito difundido que Iansã é Santa Bárbara, quando a gente bem sabe que Iansã não é Santa Bárbara, que Iansã é um princípio é uma outra elaboração. No entanto, aqui a gente observa, excetuando as comunidades terreiros ou litúrgicas, as pessoas que consideram que consideram Iansã como Santa Bárbara têm isso tão arraigado dentro delas que já não mais conseguem dissociar uma coisa da outra. Por um lado eu considero válido para a pessoa, para o devoto que assim acha, mas por outro lado considero prejudicial dentro do contexto cultural. O que o senhor acha?

MA-Isso aí são duas coisas: uma é a situação individual das pessoas que têm suas vidas e eu não vou entrar no mérito de aconselhar “faça isso ou aquilo”. Não é o caso. Mas em relação a um posicionamento estratégico de resguardar a continuidade da tradição, a gente vem lutando por esclarecer, de levar a um conhecimento maior sobre o que é uma religião e o que é a outra religião, e marcamos que hoje em dia, apesar do preconceito de muita gente atrasada, é possível viver a liberdade de culto e se ter religiões diferentes existindo num mesmo contexto como o brasileiro. Não precisamos mais estar colocando a imagem de santo perto do peji, um altar perto do peji, isso só prá dizer: “Somos católicos”... . Há alguns anos, fez-se o senso aqui na Bahia e o IBGE perguntou a uma veneranda Iyalorixá que era considerada a principal, qual era a religião dela. Ela falou: “Eu sou católica!” Todo mundo se dizia católico... Ainda mais ela que viveu todo o transcurso da perseguição policial, que viu terreiros invadidos, levarem instrumentos sagrados, perseguirem e prenderem pessoas, baterem em sacerdotisas e sacerdotes, impedirem o culto, criticarem na imprensa, nas universidades, Dizerem que era coisa do demônio, dizer que era coisa que não prestava, e que era um atraso e tudo mais, e você saber que aquilo na verdade era um legado de seus ancestrais que tanto sofreram para trazer essa riqueza da tradição até nós, até aquela comunidade e tantas mais e ela ter aquela responsabilidade , aquela obrigação, de manter , fazia-se qualquer coisa no sentido de preservar a religião. Então se esse terreiro é dedicado a Oxossi, quer que eu bote aqui alguma coisa do católico que faça referência a Oxossi? Eu boto aqui um São Jorge na entrada e, se vierem, eu digo que sou católico, que estou aqui cultuando da minha forma, mas não vou deixar que ninguém de fora se aproxime lá de dentro, onde está o chamado quarto do orixá, mas aqui na frente que é uma parte pública mostro para quem chegar que está aqui, que sou católico e eu não vou renegar isso, tenho batismo, vou à missas e levo as iyawo, e se um dia acontecer de chegada a hora, para se r enterrado, que um padre venha. Mas isso tudo foram formas da comunidade conseguir ir caçando um jeito de viver. Mas isso ficou arraigado como disse, nesses comportamentos e em determinados espaços públicos em que a comunidade não podia encontrar-se só podia através do catolicismo. Então a comunidade: “... Vamos à festa de Nossa Senhora da Conceição, à festa de Santa Barbara, à festa de S. Cosme e Damião, como é que eu vou? Vamos nos reunir todos juntos e fazer uma consagração, então todos juntos podem compartilhar dessa sociabilidade, de um encontro, de uma referência de Identidade de sua comunidade. Vamos aos encontros da terça-feira da Benção de S. Francisco no Terreiro de Jesus, tem samba, tem bloco afro...
MN- Utilizando outro referencial...

MA-Ter um espaço e um tempo em que fosse possível você se reunir. Precisava botar um disfarce.

MN- Estratégias que hoje em dia a gente vê que não tem tanta necessidade...

MA- Tem sido uma luta, mas não tem tanta necessidade e é isso que estamos agora tentando fazer, afirmar a auto-estima, o orgulho de uma tradição brasileira de ter o direito de poder existir sem disfarces dessa ordem por conta de uma repressão.
Agora é preciso que se diga as associações simbólicas não foram feitas ao acaso e o vetor das aproximações é sempre da simbologia africana. è evidente que se faz a associação de Iyansan com Santa Bárbara é porque é uma santa cuja imagem é de uma jovem guerreira vestida de vermelho e com uma espada. Aproxima-se então de atributos do orixá. São Jorge, cuja imagem é de um cavaleiro montado a cavalo caçando uma fera. São atributos que recaem em Oxossi. Em algumas regiões do Brasil é associado à Ogun por ser um guerreiro com armadura e com instrumentos de metal...

MN- Não foi uma coisa arbitrária...

MA- Não foi. São Jerônimo está associado a Xangô. Sua imagem é do santo vestido de vermelho sentado numa pedra, com um leão ao lado, um livro de leis na mão. Então Xangô que é o princípio que regula a sociedade, é rei, legislador, apoiado numa pedra, Xangô Jakutá, o lançador de pedras e o leão símbolo da realeza...O Senhor do Bonfim associado a Oxalá. Assim como Jesus padecendo na cruz, as histórias da tradição contam que Oxalá teimando em visitar Nanan no reino de Xangô, foi confundido, esteve preso e passou necessidade, apanhou, até que se fizesse a justiça e fosse reparado. A igreja branca fica no alto de uma colina.
Enfim, você vê que isso são associações simbólicas que vão não ao sentido de descaracterizar Iyansan para Santa Bárbara, mas no sentido de através da imagem de Santa Bárbara preservar a simbologia de Iyansan.
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Pelo conjunto de aspectos abordados nessa entrevista e sua importância no contexto do direito à alteridade civilizatória,destacamos a seguir, um capítulo da Constituição da Bahia dedicado a Cultura e Educação.