*

*

PRODESE E ACRA



VIDA QUE SEGUE...Uma
das principais bases de inspiração do PRODESE foi a Associação Crianças Raízes
do Abaeté-Acra,espaço institucional onde concebemos composições de linguagens
lúdicas e estéticas criadas para manter seu cotidiano.A Acra foi uma iniciativa
institucional criada no bairro de Itapuã no município de Salvador na Bahia, e
referência nacional como “ponto de cultura” reconhecido pelo Ministério da
Cultura. Essa Associação durante oito anos,proporcionou a crianças e jovens
descendentes de africanos e africanas,espaços socioeducativos que legitimassem
o patrimônio civilizatório dos seus antepassados.
A Acra em parceria com o Prodese
fomentou várias iniciativas institucionais,a exemplo de publicações,eventos
nacionais e internacionais,participações exitosas em
editais,concursos,oficinas,festivais,etc vinculadas a presença africana em
Itapuã e sua expansão através das formas de sociabilidade criadas pelos
pescadores,lavadeiras e ganhadeiras,que mantiveram a riqueza do patrimônio
africano e seu contínuo na Bahia e Brasil.É através desses vínculos de
comunalidade africana, que a ACRA desenvolveu suas atividades abrindo
perspectivas de valores e linguagens para que as , crianças tenham orgulho de
ser e pertencer as suas comunalidades.
Gostaríamos de registrar o nosso
agradecimento profundo a Associação Crianças Raízes do Abaeté(Acra),na pessoa
do seu Diretor Presidente professor Narciso José do Patrocínio e toda a sua
equipe de educadores, pela oportunidade de vivenciarmos uma duradoura e valiosa
parceria durante o período de 2005 a 2012,culminando com premiações de destaque
nacional e a composição de várias iniciativas de linguagens, que influenciaram
sobremaneira a alegria de viver e ser, de crianças e jovens do bairro de
Itapuã em Salvador na Bahia,Brasil.


sábado, 31 de julho de 2010

110 ANOS DO NASCIMENTO DE MÃE SENHORA -OXUM MUIWÁ

Mãe Senhora, a saudosa Oxum Muiwá

A propósito das comemorações dos 100 anos do Ilê Axé Opô Afonjá,comunidade tradicional de suma importância nas Américas pelo legado transatlântico dos valores da civilização africana que se expande até nossos dias,o blog da ACRA apresenta para seus visitantes um artigo valioso escrito pelo bisneto de Maria Bibiana do Espírito Santos, a saudosa Iyá Oxum Miuwá,sucessora da Iyá Oba Biyi Eugênia Anna dos Santos que fundou em 1910 o Ilê Opô Afonjá.
O Sr.José Félix dos Santos bisneto de Mãe Senhora, integra a hierarquia da comunidade Ilê Asipá onde é Otun Alagba, e Ogã no Ilê Axé Opô Afonjá.O artigo escrito pelo Sr. José Félix dos Santos Asipá, é um documento rico para comunicar as gerações de hoje, aspectos da nossa história da Bahia e do Brasil.Para os/as educadores/as que andam inquietos, buscando referências para atender a proposta da Lei 10.639/03 nas suas aulas,encontram aqui um repertório histórico precioso,ou melhor,a história contada por um descendente de africano/a de uma importante família originária de Oyó e uma das fundadoras da cidade de Ketu,estamos nos referindo a família Asipá.
Boa leitura!

*******************************************
Por José Félix dos Santos
Maria Bibiana do Espírito Santo, a Mãe Senhora, Oxum Muiwá, filha legítima de Félix do Espírito Santo e Claudiana do Espírito Santo, nasceu em 31 de março de 1900, na Ladeira da Praça em Salvador, Bahia.
Era descendente da nobre e tradicional família Asipá, originária de Oyó e Ketu na África, importantes cidades do império Yorubá. Sua trisavó, Sra Marcelina da Silva, Oba Tossi, foi uma das fundadoras da primeira casa da tradição nagô no Brasil o Ilê Axé Aira Intilé, candomblé da Barroquinha, depois Casa Branca do Engenho Velho, que deu origem aos terreiros do Gantois ( Ilê Axé Omi Iyamassê) e do Ilê Axé Opó Afonjá, do São Gonçalo do Retiro. Não se tem muita informação sobre a vida de Maria Bibiana, do nascimento até os sete anos, talvez em razão da pouca importância que se dá nas comunidades de candomblé, aos fatos e datas da vida secular e do pudor cerimonioso com que são tratados os fatos da vida pessoal dos seus membros, sobretudo aqueles tornados líderes, com uma posição e autoridade a serem preservados.
O que sabemos é que foi iniciada aos 7 anos de idade e, nesta época, já recebeu de sua mãe-de-santo, Eugênia Anna dos Santos, Mãe Aninha, Obá Biyi, a ‘’cuia’’ que pertencera à sua bisavó, Marcelina Oba Tossi. O merecimento excepcional obtido por Senhora em tão tenra idade, deveu-se à sua linhagem familiar e espiritual.
Senhora foi preparada por Obá Biyi para ser sua sucessora. No Axé Opó Afonjá foi a Ossi Dagã e nas ausências de Mãe Aninha, assumia os cuidados com o culto e com os filhos da Casa, auxiliando as tias e irmãs mais antigas no comando da comunidade.
Com a morte de Mãe Aninha e ‘’depois de realizadas todas as obrigações e preceitos de acordo com a liturgia da seita, e tudo regularizado dentro do Axé Opó Afonjá’’, em junho de 1939, Mãe Senhora assume ainda com o título de Ialaxé, a direção do terreiro – ‘’como era de direito, devido à sua tradicional família da nação Ketu, ao lado de Mãe Bada, Maria da Purificação Lopes, Olufan Deiyi, já idosa, mas reconhecidamente sábia e experiente, propiciando uma transição segura e tranqüila até a sucessão concluída com sua morte e luto ritual. Segundo Deoscóredes Maximiliano dos Santos, Mestre Didi, seu único filho biológico , Mãe Senhora torna-se de fato e direito a Ialorixá do Axé, em 19 de agosto de 1942.
No Ilê Agboulá, comunidade do culto aos Eguns de Ponta de Areia, ilha de Itaparica, exerceu sua liderança e recebeu o título mais elevado dado a uma mulher – Iyá Egbé.
Sua fé em Xangô era inabalável, e sua dedicação ao orixá de sua mãe-de-santo era ‘’maior até que ao seu próprio orixá’’ – que ela chamava de ‘’meu anjo da guarda.’’
Mesmo não residindo ‘’na roça’’ estava presente e tudo controlava com extremo rigor e pontualidade, empenhando todos os esforços para a fidelidade dos preceitos com entusiasmada dedicação.
Esta senhora de Oxum de forte personalidade, deu seguimento às comemorações e festas tradicionais de acordo com o calendário estabelecido por D.Aninha. Mantinha muitos dos hábitos instituídos por sua mãe-de-santo, como ter a sua manutenção econômica assegurada por atividade independente do sacerdócio.
Vivia o sacerdócio como uma missão. A partir de 1942, Senhora, já Ialorixá, começou a tomar providências importantes para neutralizar as reticências e oposições que por ventura ainda perdurassem no interior do egbé e a substituir cargos tornados vacantes por afastamento, morte ou para reforçar sua liderança.
Criou então os cargos de substitutos no quadro dos Obás de Xangô – os otuns e os ossi Obás – ou seja, os primeiros e segundos substitutos dos titulares, ampliando o quadro inicial dos 12 titulares para 36. E aprimorou a instituição, definindo suas funções e estendendo a escolha dos Obás para o âmbito social, além dos limites da comunidade religiosa.
Provavelmente já como fruto desta nova orientação no corpo dos Obás, Senhora e o Axé começaram a colher frutos importantes. Pierre Verger, que desde 1946 fixara residência na Bahia e, a partir de 48, fazia freqüentes viagens a África, já desenvolvendo pesquisas, tornou- se um interlocutor interessado na retomada das relações entre afro-brasileiros e africanos. Foi assim, que em 1952, D.Senhora, Oxum Muiwá, recebeu do Obá Adeniram Adeyemi, o Alafin (rei) de Oyó, na Nigéria, um edun ará e um xerê de Xangô, acompanhados de uma carta, tratando-a com o título de Iya Nassô.
Como explica Vivaldo da Costa Lima, num artigo intitulado “Ainda sobre a nação Queto” – Iyá Nassô é um título altamente honorífico, privativo da corte de Alafin de Oyó, isto é, o ‘’rei de todos os iorubás’’. A Iyá Nassô é quem, em Oyó, a capital da tradição política da nação dos iorubás, se encarrega do culto de Xangô, a principal divindade dos iorubás e o orixá pessoal do rei.
D. Maria Bibiana do Espírito Santo comungava do entusiasmo de Pierre Verger de verem reatadas as relações culturais com a África e recebia com freqüência a visita de intelectuais e embaixadores de países africanos como Daomé, Ghana e Senegal. O governo Senegalês conferiu-lhe, em 1966, a comenda do ‘’Cavalheiro da Ordem do Mérito’’, pelos relevantes serviços prestados na preservação da cultura africana no Novo Mundo.
D.Senhora de Oxum teve a satisfação de ver reconhecida a sua liderança espiritual, ainda em vida, em muitas homenagens que recebeu:
Em 1957, por ocasião do cinqüentenário de sua iniciação, foi homenageada com uma grande festa no barracão do Axé lotado dos filhos-de-santo, Obás e demais integrantes do egbé, delegações dos mais diversos candomblés da Bahia, personalidades da vida intelectual, muitas delas vindas do Rio de Janeiro e São Paulo, inclusive representações do presidente Juscelino Kubitscheck e do seu Ministro da Educação.
Em 1959, por ocasião do IV Colóquio Luso-Brasileiro, realizado pela UFBA, D.Senhora ofereceu no Axé um grande amalá de Xangô, numa festa pública dedicada aos congressistas. Durante a festa, o escritor Jorge Amado saudou seus convidados, em nome do terreiro e de sua ialorixá, dizendo “..Estais em vossa casa porque este terreiro de Xangô, este candomblé de Senhora, tem sido – permanentemente e sempre – uma casa da cultura e da inteligência baiana... somos orgulhosos deste templo e de seu significado. Aqui passaram e estudaram Martiniano do Bonfim, babalaô da casa, nosso Édison Carneiro, o feiticeiro Pierre Verger, e hoje nós, homens de cultura, somos os defensores do seu segredo e de sua grandeza, ao lado desta figura invulgar de mulher, feita de uma só peça, rainha, se a este título damos sua significação mais profunda...’’
Em 1965, Mãe Senhora recebeu o título de ‘’Mãe Preta do Brasil’’ e foi aclamada pelas comunidades religiosas afro-brasileiras, que lotaram o Maracanã, no Rio de Janeiro, com seus representantes, além de políticos e jornalistas.
Deixamos com Mestre Didi, seu filho e importante historiador da tradição da sua comunidade, a notícia do seu falecimento: ‘’No dia 22 de janeiro de 1967, Maria Bibiana do Espírito Santo veio a falecer pela manhã, ao nascer do sol. Mãe Senhora, assim, como todos os de sua família, morreu de repente, e talvez por isso pareceu impossível a muitos acreditar na notícia da sua morte. Tão forte ainda, aparentemente tão sadia, com aquela presença de rainha, sua força de comando, sua intimidade com os orixás!’’

sexta-feira, 23 de julho de 2010

ATINGIMOS A MARCA DE CEM POSTAGENS!

Crianças da ACRA no auto-coreográfico "Itapuã a Canção do Infinito" de autoria de Narcimária Luz.
O blog da ACRA atingiu essa semana a marca de 100 postagens!
Não é fácil!Mas a cada semana, nos sentimos motivados a apresentar para o público contribuições que indiquem uma ética de futuro,como diz o poeta Beto Guedes "para merecer quem vem depois".
De outubro de 2009 para cá crescemos, ousamos mais nos traços das linguagens, nos temas que aquecem debates e atravessam fronteiras, interagimos mais com as expectativas da ACRA...
Para nós, cada fim de semana se torna um desafio à procura de temas, questões, imagens, etc. que possam comunicar com vigor perspectivas que indiquem caminhos de superação a anomia que vem tragando a vida nas sociedades contemporâneas.
A vocês visitantes do blog ACRA, agradecemos a escuta e o incentivo para que prossigamos encontrando novas elaborações comunicacionais que consolidem essa iniciativa.
Saibam que a utopia que nos move nessa direção carrega um pouco da sabedoria guerreira milenar expressa pelo guarani Kaká Werá Jecupé
“[...] no caminho do guerreiro, cabe você discernir o que foi tecido pelos fios divinos e o que foi tecido pelos fios humanos. Quando você principia a discernir, você se torna um txucarramãe-um guerreiro sem armas. Porque os fios tecidos pela mão do humano formam pedaços vivificados pelo seu espírito. Essa mão gera todos os tipos de criação. Muitas coisas fazem parte de você para se defender do mundo externo, geradas pela sua própria mão e pelo seu pensamento. Quando você descobre o que tem feito da sua vida e como é a sua dança no mundo, desapega-se aos poucos das armas, que são criações feitas para matar criações. De repente, descobre-se que, quando paramos de criar o inimigo, extingue-se a necessidade das armas” (Terra dos Mil Povos.São Paulo:Editora Fundação Peirópolis,1998,p.113).
Parabéns Crianças Raízes do Abaeté!
Parabéns Equipe PRODESE/ACRA!

A FORMAÇÃO DE PESQUISADORES NEGROS

Esse é o título do artigo do Professor Doutor Henrique Cunha Júnior, educador com o qual a equipe PRODESE vem dialogando e compondo algumas iniciativas visando superar a ideologia do racismo que tende a orientar as práticas institucionais da Educação Básica até a Universidade. Henrique Cunha Júnior é graduado em Sociologia e Engenharia Elétrica. Mestrado em Engenharia Elétrica, Mestrado em História - Université de Nancy I (1981), Doutorado em Engenharia Elétrica pelo Instituto Politécnico de Lorraine (1983). Prestou concurso de professor efetivo na USP em 1990. Apresentou tese de Livre Docência na EESC - USP em 1993. Prestou concurso com tese de Professor Titular na Universidade Federal do Ceará em 1994. Atualmente é Professor Titular da Universidade Federal do Ceará. Tem experiência na área de Engenharia Elétrica em maquinas elétricas, sistemas de controle, automação industrial, tração elétrica e ensino de engenharia elétrica. Trabalha em Pós-Graduação e Pesquisa em Educação Brasileira, FACED-UFC, nos seguintes temas Africanidades, Afrodescendência, Espaço Urbano, Relações Étnicas e História e Cultura Africana e Afrodescendente.
A seguir introduzimos o artigo, instigando o/a leitor/a para conhecer o texto na íntegra na página http://www.comciencia.br/reportagens/negros/17.shtml
Lembramos que no dia 30 de julho (sexta-feira) teremos o prazer de receber o Professor Doutor Henrique Cunha Júnior na Universidade do Estado da Bahia Departamento de Educação do Campus I ,realizando a Conferência "O Estado atual das pesquisas sobre as Populações Negras no Brasil".

Boa leitura!
*********************************************

A história da formação social brasileira é a história do escravismo criminoso que produziu ao longo de quase 300 anos a imigração massiva de africanos. Como os processos de invasões européias no continente africano encontraram fortes resistências, as regiões de exploração e lutas variaram e se alternaram no tempo, fazendo com que os cativos africanos para aqui trazidos viessem de diversas regiões e culturas.
Dado o imenso desenvolvimento técnico e social, para época, vivido pelos diversos países africanos, o Brasil absorveu e se beneficiou de mão-de-obra portadora de todas as técnicas e conhecimentos utilizados nos diversos campos da produção no país. O conhecimento produtivo do Brasil Colônia é fundamentalmente africano, nas áreas de mineração, produção de ferro, agricultura, produção de açúcar, manufaturas, tecelagem, construção.
O mesmo se dá no campo da política, se considerarmos que os quilombos foram à forma mais sistemática da produção de contestação do estado escravista. Não paradoxalmente, as artes e a cultura se fundam também sobre as mesmas heranças africanas. Até as literaturas e as músicas ditas eruditas são realizadas por africanos e descendentes de africanos. Basta nomearmos os marcos das nossas artes e da nossa literatura para constatarmos tal evidência.
A produção da pesquisa científica no Brasil é iniciada nos finais do século XIX e início do XX, aí também, vamos encontrar a participação ativa de afrodescendentes. Há casos extremos como o do engenheiro Teodoro Sampaio, que filho de escrava, depois de formado na Escola Politécnica do Rio de Janeiro, volta à Bahia para comprar a liberdade de sua mãe. Tornou-se geógrafo, sanitarista, pesquisador, está entre os fundadores da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo.
A contradição que nos preocupa é a de que, mesmo em face de inúmeras evidências históricas, ainda ser necessária a discussão sobre a pesquisa que trata da população negra e sobre a formação de pesquisadores negros. Os argumentos da história não são suficientes para a consciência de que existe um erro se perpetrando na composição do corpus de pesquisadores brasileiros, nas temáticas eleitas pela ciência brasileira e, sobretudo nas políticas científicas e de formação de pesquisadores no país.
Surpreendente não é apenas a ausência de políticas nesta área, como também a falta de preocupações democráticas com a implantação destas. Num país que forma 6000 doutores por ano, temos que menos de 1% são negros e menos das teses 1% tratam temas de interesse das populações afrodescendentes."Ninguém discrimina ninguém, a razão disso é que o negro é pobre", dizem. Errado, a razão é que os métodos de discriminação estão tão institucionalizados que não incomodam às consciências críticas.
É tido natural o negro não entrar nos programas de pós-graduação. Examinando o histórico de cerca de dois mil mestres e doutores negros existentes no país, vemos que a faixa etária das candidaturas e os regimes de trabalhos estão fora dos perfis privilegiados pelas políticas e pelos programas de pós-graduação. A média dos pesquisadores negros ingressa no mestrado aos 35 anos, trabalha e precisam participar do sustento da família, o que é incompatível com o número e valores das bolsas.
Os programas favorecem quem, em iniciação cientifica e artigos? Os pesquisadores negros vêm de ensino universitário noturno, que não dá oportunidades para a iniciação científica. As disciplinas de base dos temas pretendidos pelos pesquisadores negros não existem nas graduações. A única fonte de formação tem sido o próprio movimento negro.
Os programas rejeitam pesquisadores militantes dos movimentos negros. Bancas de entrevista não conseguem superar a relação patroa-empregada existente nas nossas relações sociais cotidianas, tornando as entrevistas tensas e as pesquisadoras negras antipáticas. Fato mais notado entre as mulheres: "quem é antipático não entra, as negras 'muito da exibida' não entram".
Mas, para os que entram, não há orientadores conheçam os temas, o que alimenta a dificuldade em se ter sucesso na pesquisa no tempo determinado. A universidade brasileira não confessa a sua ignorância nos temas de interesse dos afrodescendentes, sendo que única responsabilidade do insucesso fica por conta dos pesquisadores negros. O problema é grave, mais grave ainda é que nada disso tem sido questionado pela sociedade democrática acadêmica...
Continue a leitura através da página http://www.comciencia.br/reportagens/negros/17.shtml

O perigo de uma única história - Parte 1

Os graduandos/as do 7º semestre do curso de Pedagogia do Departamento de Educação do Campus I, tiveram o privilégio de assistir na disciplina Processos Civilizatórios e Pluralidade Cultural uma palestra da escritora nigeriana Chimamanda Ngozi Adichie. A palestra foi apresentada através de um vídeo inédito, selecionado pelo Professor Magno Santos e professora Hildália Fernandes para compor o encontro temático envolvendo a abordagem de Chimamanda:“O perigo de se contar uma única história”.
A riqueza do debate, desenvoltura do encontro e projeções de uma ética que estabeleça princípios para a formação dos/as educadores/as, visando o respeito e o direito à alteridade civilizatória característica dos povos, fundamentou o encontro/aula sob a responsabilidade do Professor Magno e Professora Hildália.
Pela importância e força do pensamento desenvolvido pela escritora Chimamanda Ngozi Adichie, solicitamos aos professores que nos desse acesso ao vídeo para compartilharmos no blog da ACRA.
Mas quem é Chimamanda Ngozi Adichie?Ela é uma jovem escritora nigeriana que nasceu em Abba e cresceu na cidade de Nsukka onde fica a Universidade da Nigéria. Aos 19 anos foi estudar nos Estados Unidos onde se graduou em Literatura e posteriormente o Mestrado em Estudos Africanos.
“Sua primeira novela, Purple Hibiscus (Hibisco roxo), foi publicada em 2003. A segunda novela, Half of a Yellow Sun (Meio sol amarelo), foi assim chamada em homenagem à bandeira da Biafra, e trata de antes e durante a guerra de Biafra. Foi publicada pela editora Knopf/Anchor em 2006, e ganhou o Orange Prize para ficção em 2007.”
(Cf. http://pt.wikipedia.org/wiki/Chimamanda_Ngozi_Adichie)
A seguir a primeira parte do vídeo “O perigo de se contar uma única história” por Chimamanda Ngozi Adichie.

O perigo de uma única história - Parte 2

Continue acompanhando as reflexões de Chimamanda Ngozi Adichie.
Mais informações sobre Chimamanda Ngozi Adichie confiram na Universidade de Yale http://www.yale.edu/macmillan/african/students08.shtml

sábado, 17 de julho de 2010

SEMINÁRIO ACRA


ACRA
ASSOCIAÇÃO CRIANÇAS RAÍZES DO ABAETÉ
PRODESE
PROGRAMA DESCOLONIZAÇÃO E EDUCAÇÃO

Gingando e Aprendendo

“Acredito em Educação como um caminho valioso para superarmos as desigualdades sociais, a desesperança que toma o planeta... A Educação para mim é uma forma de aplacarmos o ponto de interrogação que temos sobre o futuro. Estamos vivendo uma sociedade que valoriza o ter mais que o ser... O dinheiro é a máxima da vida agora, e esse valor coloca a vida por um fio...”
(Narciso José do Patrocínio)

DATA:24 DE JULHO DE 2010
LOCAL:ACRA
HORÁRIO:8 ÀS 12:30 HS

JUSTIFICATIVA

O Seminário visa estabelecer um espaço de análise e reflexão sobre o cotidiano da ACRA, dando destaque as perspectivas de condutas técnico-administrativas e sócio-educativas que organizam as atividades desenvolvidas na instituição. Apelaremos para a metáfora da roda de capoeira, na tentativa de estruturar a metodologia do Seminário, que tem como objetivos:
1-Sumariar as referências sócio-históricas da territorialidade de Itapuã
2-Destacar a importância da ACRA como rede de alianças comunitárias;
3-Apresentar a filosofia do Projeto Dayó: compartilhando a alegria socioexistencial em comunalidades africano-brasileiras (RECRIÁFRICAS em Candeias, ODEART, Cordel das Cri-onças, Banda de Congo Mirim/Cariacica Espírito Santo,Projeto AGBON);
4-Conhecer os impactos do Dayó nas comunalidades onde atua a equipe PRODESE;
5-Caracterizar as atividades desenvolvidas pelos educadores/as na ACRA;
6-Destacar o reconhecimento institucional da ACRA através das premiações e editais;
7-Identificar os principais obstáculos à consolidação das metas institucionais da ACRA;
8-Propor “espaços de ginga” para a superação dos obstáculos;
9-Compor um documento que estabeleça diretrizes que estruture, organize e promova as iniciativas institucionais da ACRA junto a outras instituições em Itapuã.

GINGANDO NA RODA

Ética do Futuro e Educação
Professor Narciso J. Patrocínio
Itapuã: África Viva
Narcimária Luz
Perspectivas de Educação através da Capoeira
Professor Rupi
Perspectivas de abordagem Língua Inglesa na ACRA
Professor Abílio
"Nro ojù Onà: Pensando Caminhos"
Professora Rosângela Accioly
Compondo linguagens e valores para a Educação Infantil através dos Contos Indígenas e Afro-brasileiros.
Daniela Cidreira dos Santos
Comunidades Virtuais
Paula Cristina Grejianin e Maurício do Patrocínio Luz
Itapuã: tecendo redes de alianças comunitárias através da ACRA
Jackeline Pinto Amor Divino
Orquestra de Ritmos e Sons
Professor Sidney Argolo
Grafitagem
Professor Tárcio Vasconcelos
Perspectivas de abordagem da Língua Espanhola na ACRA
Professora Rosângela Accioly
Valorização da cultura negra numa perspectiva de resgate da identidade das crianças e adolescente no âmbito da ACRA
Sara Soares
Vivências da equipe de Técnico- administrativa da ACRA
Naiara Bittencourt, Caroline Nepomuceno e Célia Santos
Composição das diretrizes de fomento à dinâmica técnico-administrativa e socioeducativa da ACRA
TODOS/AS

“E aprendi que se depende sempre, de tanta gente diferente gente, toda pessoa sempre é a marca das lições diárias de outras tantas pessoas”.
(Gonzaguinha)

CONFERÊNCIA

CONVITE

A Universidade do Estado da Bahia através do Departamento de Educação do Campus I, Programa de Pós-Graduação em Educação e Contemporaneidade e o Programa Descolonização e Educação convidam para a conferência
''O Estado Atual das Pesquisas Sobre as Populações Negras no Brasil''
Conferencista: Professor Doutor Henrique Cunha Júnior
Data: 30 de julho de 2010
(Sexta-Feira)
HORÁRIO: 08h às 12h
LOCAL: Auditório do Programa de Pós Graduação em Educação e Contemporaneidade
Estrada das Barreiras s/n, Universidade do Estado da Bahia, Cabula
(40 VAGAS)
INSCRIÇÕES: Até 28/07 das 9h às 11h, das 14h às 16h e das 18h às 20h no NETI /DEDC I
(ENTREGA DE CERTIFICADO E SORTEIO DA COLEÇÃO SEMENTES CADERNO DE PESQUISA DO PRODESE)

sexta-feira, 16 de julho de 2010

SHOW TRILHAS INSTRUMENTAIS


O cantor e compositor Amadeu Alves, filho ilustre de Itapuã, estará participando no dia 24 de julho às 19 horas no Pelourinho,Centro Histórico de Salvador do Festival LADCBA. A participação de Amadeu no Festival compõe o " SHOW TRILHAS INSTRUMENTAIS".A seguir alguns aspectos que informam um pouco da história musical de Amadeu que vem desenvolvendo como diretor da Casa da Música localizada no Parque Metropolitano do Abaeté, um trabalho valioso.

*******************************
"Um show de música instrumental, com temas autorais que revelam o potencial criativo de um artista baiano, nascido no poético e tradicional bairro de Itapuã. Amadeu Alves, trás em suas canções, experiências de vida e influencias de diversos músicos brasileiros e de outras nacionalidades. Cresceu ouvindo Banda de Pífanos de Caruarú, Quinteto Violado, Orquestra Armorial, Novos Baianos, Gilberto Gil, Egberto Gismonti, Hermeto Pascoal, Inti-Illimani, Kala Marka, Pat Metheny, Beatles, Led Zepelin, Pink Floyd, dentre tantos outros nomes da música mundial. Sua musicalidade tem uma forte ligação com a cultura popular, da formação em meio aos sambas de beira de praia e festas de largo de Salvador, uma bagagem ancestral com raízes fincadas nas tradições culturais nordestinas, na música dos povos Andinos e Latino-Americanos em geral, e é antenada com as novas formas de produção artística.
Um show de um compositor e instrumentista que trabalha com trilhas sonoras de circo, teatro e dança, já se apresentou em palcos em diversas cidades brasileiras, na Itália, e na Dinamarca, premiado pelo Troféu Caymmi e em festivais em Santa Catarina, Espírito Santo e Ceará, e que considera a autenticidade uma condição básica para legitimar a atuação de quem quer trilhar uma carreira musical.
Amadeu vem, junto a uma banda formada por violão, bandolim, flauta, teclado, baixo, bateria e percussão, contar histórias de vida através das suas Trilhas Instrumentais."
Para ouvir as composições de Amadeu Alves, acesse www.myspace.com/amadeualves

sexta-feira, 9 de julho de 2010

V BATIZADO INTERNACIONAL DE CAPOEIRA DA ACRA E GRUPO ABOLIÇÃO OXFORD

CONVITE

Crianças da ACRA com Mestre Olavo e Professor Rupi

Como já divulgamos anteriormente, a ACRA realiza todo ano momentos de intercâmbio, tendo a capoeira como linguagem de aproximação com culturas diversas.
No dia 10 de julho sábado, as crianças e jovens da ACRA e do Grupo Abolição Oxford da Inglaterra, irão vivenciar a roda dedicada ao V Batizado de capoeira da ACRA 2010. O Batizado será conduzido pelo Mestre Olavo,Mestre Dayola,o Contra Mestre Luís Negão e o Professor Rupi.É essa hierarquia composta por essas personalidades, que estará habilitando crianças e jovens na roda de capoeira, dando-lhes um nome ou “apelido” que irá caracterizá-lo no grupo.Haverá também,entrega de cordões cujas cores representam a graduação conforme o tempo de formação dos alunos/as na capoeira.
ANOTEM NA AGENDA:
V Batizado da ACRA 2010
Local: Parque Metropolitano do Abaeté S/N(em frente à lagoa do Abaeté)
Horário: das 9 às 12 h

***************************

Conseguimos identificar no youtube, um registro inédito e importante com o Mestre Bimba tocando com o berimbau o hino da Capoeira Regional.

Vale a pena conferir.





SANTUGRI

Momento de confraternização no Batizado de Capoeira 2009.
Na foto,a juventude ACRA e Abolição Oxford com Mestre Olavo no centro e à direita (em pé de calça vermelha)o Contra Mestre Luís Negão.

O jogo cria a roda, a roda cria o jogo, o mundo dá volta...
Volta no mundo Camará!
E o que é a roda?
“Não é nada, não é nada, a roda. Se o vazio ou o traço? Bom, do vazio Deus fez este mundão todo. Não é nada o traço? Mas a criatura só existe quando deixa marca, traça. Para mim, o traço, o vazio, a roda é tudo. Não é nada, não é nada, é tudo. Gosto, moço. Nela meu corpo é meu - parece que nele nem corre sangue, corre mel. Meu corpo, meu corpo/foi Deus quem me deu/na roda da capoeira/Rarrá!/grande e pequeno sou eu. Meu nome é Santugri, moço. Posso dizer que o nome está ligado a meu segredo. Muito mais não posso contar, nem se quisesse, porque eu mesmo não sei. Mas posso dizer isto sim, que este meu nome foi causa de mudança.
Foi minha sorte moço, pois o som dessa palavra casava fácil com meu corpo, repercutia bem na roda. Santugri (...) faz parte de mim, queira ou não. Passarinho não canta por gosto, canta por obrigação. Eu jogo capoeira por cerimônia, por destino. É minha sina, minha sorte. Morrendo, moço, não quero ir pra lugar nenhum - a roda é meu paraíso”

(Muniz Sodré)
Vale a pena ler Santugri de autoria de um bom capoeira, Muniz Sodré, conhecido na roda como Americano,nome dado pelo seu Mestre,o saudoso e legendário Bimba.
A seguir outro vídeo inédito com Mestre Bimba abordando aspectos sobre o berimbau.
Confiram.

IMPORTÂNCIA DO BATIZADO NA CAPOEIRA?

Batizado 2009.
Jovens da ACRA e do Grupo Abolição Trust da África do Sul
No batizado de capoeira,a roda passa a ser o espaço e tempo que faz nascer o capoeirista,e é na roda que vai se confirmar sua natureza,seu nome,sua força, sua importância para assegurar o ritmo e a cadência,tudo isso é compartilhado no círculo com o Mestre e outors graduados.
Geralmente esses nomes/apelidos são escolhidos conforme o jeito de ser, de jogar a capoeira, características físicas, maneiras de se relacionar no grupo, a forma como o aluno/a se comunica, o lugar onde mora, etc.
Para o/a aluno/a que é considerado novato/a na capoeira, o batizado é um momento de muita emoção, pois confirma a sua inserção no grupo e autoriza a sua participação pela primeira vez na roda ritmada pelo toque do berimbau.
Jogar pela primeira vez não é tão simples assim. O Mestre indica um/a aluno/a mais experiente na capoeira, ou que já tenha maior graduação na roda, para ser padrinho/a do novato/a.O padrinho ou madrinha fica com a responsabilidade de encorajar seu afilhado/a jogar com a técnica e alegria necessária para que esse momento seja ímpar.
O novato/a tem a oportunidade de jogar com vários/as capoeiristas. Após essa ginga,o Mestre vai ao centro da roda e anuncia publicamente o nome/”apelido” do novato/a pelo qual será conhecido na capoeira.
O batizado, portanto, é um momento também de graduação do capoeirista, e de acordo com o seu tempo de prática e habilidades adquiridas receberá um cordão. Para cada nível de maturidade na dinâmica da roda, o Mestre gradua seu/a aluno/a dando-lhe um cordão de uma cor que é amarrada na calça do graduado/a.
As cores da graduação: sem cordão é novato, verde aluno/a batizado, azul graduado e assim sucessivamente. O Mestre usa o cordão branco.
Acompanhem outro vídeo inédito de uma roda de capoeira nos anos 1950 com dois grandes Mestres da Capoeira,estamos nos referindo a Mestre Bimba e Mestre Pastinha.


domingo, 4 de julho de 2010

A AFIRMAÇÃO DAS MEDIDAS AFIRMATIVAS

Foto Ronaldo Martins
Em 15 de outubro de 2004 foi publicado no jornal Folha Dirigida entrevista de Marco Aurélio Luz concedida a jornalista Clarissa Borges. Devido à atualidade e importância do tema que também faz parte das reflexões da equipe de educadores/as da ACRA, aproveitamos o espaço do blog para divulgar as perspectivas de análise do professor entrevistado. Clarissa Borges abre a entrevista com o Professor Marco Aurélio Luz, tendo como ponto de partida a Lei 10.639/2003, que estabelece a obrigatoriedade do ensino de História da África e Cultura Afro brasileiras. Marco Aurélio Luz é formado em Filosofia e Direito pela UFRJ é Doutor em Comunicação e fez Pós Doutorado na Sorbonne, Université de Paris V. Na Bahia desde 1973 entrou em contato com comunidades africano-brasileiras. Recebeu títulos da tradição africana,atuou como professor nas Univerdidades Federal do Rio de Janeiro e Federal Fluminense.Quando veio morar na Bahia nos anos de 1980, passou a atuar como Professor na Graduação e Pós-Graduação da Faculdade de Educação da Universidade Federal da Bahia-UFBA,onde criou a Linha de Pesquisa Identidade Negra e Educação. O professor Marco Aurélio Luz é autor de livros sobre a cultura afrobrasileira como “Agadá: dinâmica da civilização africano brasileira”, “Cultura Negra e Ideologia do Recalque”, “Cultura Negra em Tempos Pós Modernos” e “Do Tronco ao Opa Exin”. Ele faz parte também de diversas sociedades de ciência e cultura afrobrasileira. Em entrevista à FOLHA DIRIGIDA, o professor dá uma aula sobre a cultura e os valores das tradições afrobrasileiras.

****************************

Folha Dirigida – O que significa a lei que impõe o ensino de história e cultura afro-brasileiras nos currículos do ensino médio?
Marco Aurélio Luz –
Essa lei procura atender a uma pretensão das comunidades afro - brasileiras, no sentido de resgatarem o seu passado e sua história, para alimentar sua auto-estima, sua identidade e seu conhecimento. Há um grande recalcamento, uma grande repressão do ensino e do conhecimento dessas riquezas culturais, porque a África não foi só o berço da humanidade, mas também berço das civilizações. Hoje em dia, com essa abertura para a pluralidade e diversidade humana, nós estamos atendendo a esse reclame, que vem desde a década de 70, quando os primeiros movimentos negros e afro-brasileiros reivindicaram a presença da continuidade africana no Brasil.
Folha Dirigida – como se dá a aplicação dessa lei? A cultura afro – brasileira está sendo ensinada nas escolas de forma satisfatória?
Marco Aurélio Luz –
Aí temos um problema muito grave. O interessante para nós é tomarmos consciência dos valores, das linguagens e das instituições que foram implantadas no Brasil e dão continuidade à tradição africana.
Não se pode pensar na África com um enquadramento de economia ocidental e em termos como desenvolvimento, terceiro mundo e coisas que tais que vão deslocando o eixo de compreensão de uma tradição própria, de uma civilização própria do continente. O temor que eu tenho é que a África seja percebida por esse ângulo economicista, esse ângulo das referencias e comparações com o mundo ocidental e com o mundo colonial. Então, é preciso nos deslocar para compreender o que está na alma do nosso povo, que são os valores, as linguagens e a identidade da tradição africana.
Folha Dirigida – Há algum tipo de adaptação a ser feita na educação de modo geral para que a cultura africana seja passada da forma desejada?
Marco Aurélio Luz –
São poucas as instituições que se preocupam, porque as tradições afro-brasileiras foram muito recalcadas, principalmente na constituição do Estado Republicano, de uma Razão de Estado de inspiração positivista essa da ‘’Ordem e Progresso’’ essa ordem de perceber a vida simplesmente por esse viés da produção econômica. Nessa época, instituições como os terreiros foram reprimidas politicamente, foram colocadas como uma coisa a ser destruída, bem como a capoeira. Essas instituições, a muito custo, conseguiram chegar até hoje aqui. Em termos de se assumir uma identidade, há um hiato muito grande ainda entre o povo brasileiro, que tem essas tradições, e o Estado, que só possui uma visão simplesmente economicista ligada ao capitalismo internacional e às leis que regem esse sistema. É difícil, mas por outro lado há uma pressão que vem das comunidades afro-brasileiras e indígenas. Espero que haja uma possibilidade de interação entre essas comunidades e que elas possam participar, inclusive, da mobilidade social que a escola proporciona, mas sem destruir a própria identidade.
Folha Dirigida – No Brasil, existe uma tendência em tratar a África como um todo homogêneo, como se fosse um único país, um único povo. Isso prejudica o entendimento da cultura africana? De que forma nós podemos conhecer a verdadeira cultura africana que importa para nós?
Marco Aurélio Luz –
Atrapalha porque você tem que tomar primeiro como referência os povos que aqui chegaram e deixaram legados. Então, o que nos interessa é a emergência do respeito à alteridade, do respeito ao outro, e o outro assumir a sua própria identidade e permitir que haja uma coexistência pacífica entra as diferenças do nosso contexto. Fazendo um levantamento sobre as nossas origens vai-se fazendo a ponte de referencia com a África. Interessa-nos uma referencia com a África que traga subsídios para reforçar a consciência da nossa identidade, a consciência do que somos. A África é uma multiplicidade de povos e nós não vamos conseguir conhecer tudo isso. No entanto, podemos saber um pouco sobre a origem dos povos que constituem atualmente a cultura brasileira.
Folha Dirigida – que tipo de conseqüências sociais o desconhecimento da origem africana traz para o povo brasileiro e para os afro-brasileiros mais especificamente?
Marco Aurélio Luz -
O problema é que esse sistema positivista, industrial, tem movimentos de forças centrípetas e centrífugas. Ele atrai para o centro dele, e aqueles que não vão para esse centro sobram. Esse centro totalitário exige comportamentos bem dentro das tradições européias, como se fosse um funil. Quem vai sobrando a essa identificação vai sendo arremessado por uma força centrífuga para a margem do sistema. Nessa margem, a pessoa passa por uma série de vicissitudes porque é alijado da participação social, política e econômica. A sobrevivência ao sistema ocorre através de mecanismos sedutores e marginais ao sistema. Os nossos jovens, por exemplo, são muito reprimidos, por isso sofrem uma situação de repressão e contra repressão muito aguda.É exatamente porque o sistema não reconhece, não dá a possibilidade desses jovens assumirem totalmente a sua identidade e serem acolhidos pelo sistema. Essa rejeição faz com que nós tenhamos uma sociedade tão dividida e tão violenta.
Folha Dirigida – Quais exemplos de medidas efetivas o governo deve tomar no sentido de contribuir para o resgate das tradições africanas?
Marco Aurélio Luz –
O governo sua Razão de Estado, tem que sair dos limites de uma ideologia falsa de que o problema que afeta o povo se restringe a luta de classes. Também esse conceito de raça é um conceito equivocado que já está totalmente ultrapassado. Mas esse falso conceito de raça que veio preencher a ideologia evolutiva europocêntrica de superioridade e inferioridade que constitui o racismo, agora está sendo usado para operacionalizar políticas de Estado de “igualdade racial”... Na verdade o que alimenta as identidades diferentes são as culturas, através de valores e linguagens que estruturam o modo de ser, viver e entender o mundo trata-se de uma luta de afirmação existencial defendendo e honrando um legado ancestral. Uma vez os governos percebendo essas diferenças, eles tem que acolhe-las no seu espaço institucional. Por exemplo, no ensino público, oferecer elementos que façam com que as crianças e os jovens se sintam em casa. O principal é atentarmos para o acolhimento do exercício do respeito à alteridade e o acolhimento do espaço a que toda população deve ter, o direito de ter no sistema escolar aspectos e características da sua cultura, por que essa cultura é, de certa forma, majoritária do povo brasileiro.
Folha Dirigida – Existe alguma diferença entre os termos negro, afro-descendente ou afro-brasileiro para designar o descendente africano?Existe sentido em usar essas palavras?
Marco Aurélio Luz –
O termo negro tem uma conotação que abrange uma relação de etnicidade para diferenciar dos povos da África do Norte, que é uma África mais formada pelos povos árabes e tem o islamismo como referência. Mas há o Egito, por exemplo, que tem uma população hoje de pele mais clara. Ali se formou o berço das civilizações o Egito antigo negro faraônico. Então, falar de África negra é só uma questão de situar uma marcação étnica geográfica. No caso de ‘’afro-descendente’’ seria uma manobra estratégica, de modo que, existindo uma população de pele mais clara, embora também descendente de africanos, não ficasse a margem de uma política que se falasse em negro. Mas isso ainda não é o suficiente porque, além daqueles que vivem nesse universo serem afro-descendentes, há também uma característica ora mais de europeu ou indígena na sua fisionomia, nos seus aspectos morfológicos. E, no entanto, tem que se alcançar isso também. Conheci um senhor no interior de SP no início da década de 70, um líder local que abrigava o presépio da Folia de Reis em sua casa, onde era o ponto de partida e chegada da Companhia e onde se celebrava e comemorava a festa de Reis no dia 6 de janeiro; pois bem certa feita prosando comigo ele, negro da pele bem negra, vendo seus netos lourinhos de pele clara brincando no pátio me comentou: -“ esses não vão passar por sofrimentos que eu passei. E não vendo prá sinhô nenhum, não tem jeito maneira”. Eles eram frutos do casamento dele com uma imigrante italiana que gerou o filho de tez amorenada que também se casou com uma descendente direta de italianos gerando os netos lourinhos.
Folha Dirigida – O que o senhor acha do sistema de cotas para negros nas universidades, adotado em alguns Estados, como forma de reparação social?
Marco Aurélio Luz –
É uma coisa que você tem que ter cuidado. Quase todo mundo é a favor das cotas porque realmente há um hiato de possibilidade de participação por razões econômicas, sociais, consequência da política de barragem, da política de abandono. O fato de estar na Universidade pode abrir muitas possibilidades para a própria comunidade negra se reforçar. Mas se essa comunidade entrar na Universidade tal e qual ela está, sem assumir um novo currículo, uma nova maneira de assumir a cultura afro-brasileira, essas pessoas que entrarão por cotas podem vir a se tornar almas no exílio. A cota tem que ser conjuntamente aplicada com essas referencias a cultura, a identidade própria, a valorização da tradição, enfim da civilização. São necessárias muitas políticas nesse sentido.
Folha Dirigida – Que posição deve tomar a comunidade afro-descendente frente a frente a esse contexto de não respeito a sua cultura?
Marco Aurélio Luz –
Eu acho que as instituições da sociedade civil já vinham batalhando há muitos anos sobre isso. Agora, essas políticas devem abandonar o conceito de raça e ir para o contexto de identidade, que tem conteúdo cultural. Cultura é toda uma maneira de ser, é o ser da pessoa. Por exemplo, nas tradições afro-brasileiras, você aprende muito através da culinária litúrgica. Então, é uma condição diferente. È isso que faz a diferença. A baiana de acarajé, por exemplo, tem muito fundamento, não só pela instituição de pessoas que vendem aquela comida, mas porque acarajé é uma comida que faz parte da comida do orixá e tudo o mais referente a uma rica e complexa visão de mundo.
Folha Dirigida – O senhor participou do desenvolvimento do projeto piloto de educação pluricultural Mini-Comunidade Oba Biyi. Como foi essa experiência?
Marco Aurélio Luz
– Essa Mini-comunidade começou realmente com as crianças freqüentando a casa do casal Juanita e Mestre Didi, no Ilê Axé Opô Afonjá (terreiro de candomblé localizado no Bairro de São Gonçalo, em Salvador). Havia muitas crianças lá. Certa feita indagadas, elas responderam que não freqüentavam a escola porque a escola não gostava delas. Isso fez com que o Mestre Didi propusesse à sociedade civil do Opô Afonjá a constituição de uma escola que fizesse com que as crianças se sentissem amadas e abrigasse na sua linguagem e constituição os valores da comunidade. Assim foi lançado esse projeto de educação pluricultural. No inicio foi muito difícil, mas, no final, conseguimos constituir um currículo a partir dos contos narrados por Mestre Didi. Esses contos eram dramatizados pelas crianças, dos menores até os de 14 anos. Era o que a gente chamava de desenvolvimento integrado. Passados dez anos, estamos escrevendo um livro sobre essa experiência de educação pluricultural a partir dos valores afro-brasileiros.
Folha Dirigida – Essa experiência pode servir de modelo para o sistema oficial de educação, principalmente nas escolas públicas?
Marco Aurélio Luz –
Eu acho que seria fundamental, porque a adesão das crianças foi fantástica. Essas crianças assumiram os valores da comunidade, hoje são lideres da comunidade e tudo mais transitando com facilidade “da porteira para dentro e da porteira para fora” como um dia se referiu Mãe Senhora Iyalorixá Oxun Muiwa.. Por outro lado, eu tenho certo pessimismo em relação ao recalcamento já constituído. É um problema muito sério de rejeição, pois a gente vive com medo de ser usado, de ser manipulado, de ser deturpado. Realmente eu acho que não é uma questão de vontade política, é uma questão de o próprio fluir do continuo civilizatório que possa vir oferecendo alternativas como essa experiência de educação Pluricultural africano-brasileira.

PORANDUBA:HISTÓRIAS, NOTÍCIAS E PERGUNTAS QUE VÊM DO CORAÇÃO DA FLORESTA

A ACRA tem o prazer de comunicar aos educadores/as, que já está disponível nas livrarias uma importante obra organizada pela socióloga e artista Rute Casoy,parceira valiosa nos caminhos que o PRODESE vem inaugurando.
O mais recente desafio de Rute e sua equipe de educadores/as no Rio de Janeiro, é "PORANDUBA,roda de histórias indígenas".Aproveitem e visitem o site da Roda de Histórias indígenas:http://www.rodadehistoriasindigenas.com.br/parcerias.htm.
A seguir, a professora Narcimária nos apresenta suas impressões sobre PORANDUBA.

Por Narcimária C.P. Luz

Na dinâmica das comunalidades africano-brasileiras quando nos deparamos com algo belo, magnífico, emocionante e importante para fortalecer os laços comunitários, costumamos usar a expressão odara.
Odara, que significa simultaneamente bom e bonito, constitui a infinitude do repertório técnico e estético de linguagens, que estruturam modos e formas de comunicação de comunidades tradicionais africano-brasileiras. Esses modos e formas de comunicação são atravessados por um universo simbólico singular, que dá forma às narrativas de elaboração de mundo,promovendo a participação direta,pessoal, ou intergrupal, constituindo:hierarquias,instituições, repertório de mitos, contos, cantigas, códigos de cores, música polirrítmica, vestuário, códigos de gestos, compondo danças e dramatizações, culinária, estruturação de territorialidades,etc.
Através da ética da coexistência, vimos nas Américas um intercâmbio profícuo de valores de civilização entre os povos indígenas e africanos, a exemplo: do Quilombo dos Palmares; comunidades que reverenciam o caboclo considerado ancestral, fundador da terra; participação de indígenas e africanos/as na independência da Bahia, e que até hoje são celebrados através da simbologia do caboclo e da cabocla sempre no dia 02 de julho.
Então,quando nos aproximamos do riquíssimo acervo organizado por Rute Casoy intitulado “Poranduba”,reagimos com alegria dizendo: odara!
“Poranduba” é um documento que aborda a sofisticada simbologia milenar dos povos da floresta, suas elaborações ético-estéticas, de modo especial, as recriações de linguagens e valores que imantam as comunalidades indígenas brasileiras.
“Poranduba na língua tupi quer dizer história, notícia ou pergunta”
A estrutura, forma e conteúdo do livro apela para uma estética original provocando o leitor/a lidar com texturas, cores, dobras, ilustrações, poesias, narrativas, músicas, que envolvem as simbologias características do imaginário de distintos povos. Rute Casoy concebeu um acervo singular que reúne narrativas valiosas sobre os princípios fundadores das comunalidades indígenas em destaque: a transcendência do viver, importância do corpo comunitário, enfim, as estratégias de continuidade da tradição herança dos/as antepassados/as.
As belas narrativas contidas em Poranduba transportam conhecimento e emoção. Impressiona o afeto e criatividade que envolvem todo o livro,e isso pode ser notado através das vozes daqueles/as que assumem as narrativas para encantar,contar e cantar as histórias,notícias e perguntas que vêm do coração da floresta.
Tudo muito belo e útil!
Odara!
Sobre isso Daniel Munduruku comenta:
“O projeto Poranduba é desafio de beleza. Por meio dele-e o caminho é sempre meio-se chega à essência da cultura indígena brasileira. Digo isso porque sei que o que dá sentido ao ser indígena é a ancestralidade presente nas narrativas tradicionais de nossa gente. É ela-a ancestralidade-que lembra o tempo todo do nosso pertencimento aos eventos que movem o cosmos em direção ao seu criador... É pelas narrativas ancestrais que sabemos quem somos e para onde vamos e isso nos torna gratos e festivos, motivando-nos a pintar o corpo e a criar canções e passos de danças que permitem unir-nos à obra da criação divina. Ouvir essa narrativas é, portanto, ser partícipe; é estar integrado com palavras sábias que vêm de muito longe atravessando o tempo como a nos lembrar que somos fagulhas na grande fogueira cósmica. É trazer a força do mundo para dentro de cada ouvinte como uma música a ser deliciada”
As histórias, notícias e perguntas que vêm do coração da floresta, são apresentadas através de alguns povos, a saber: bororo, desana, guarani, kaiapó, kaingang, karajá, kamaiurá, kaxinawá, krenak, kuikuro, macuxi, mawé, munduruku, nambikwara, taulipang, tikuna, tukano, waijãpi, wapixana e xavante. Rute Casoy reconhece a existência de centenas de povos indígenas,mas teve o cuidado de dedicar-se a aprofundar aspectos do universo mítico simbólico de alguns deles,evitando a superfície que folcloriza e apequena o riquíssimo patrimônio milenar dessas civilizações.
O livro acompanha quatro CDs, e cada um, acumula histórias e músicas dramatizadas dedicadas a comunicar aspectos relacionados a temas como: ”criação e amor”; ”metamorfose e magia”; ”fogo, água, céu e terra”; ”plantas e animais”.
Uma observação: conheço, compartilho e venho ao longo da minha carreira estabelecendo intercâmbios profícuos com amigos/as educadores/as “indígenas” do Brasil e América Latina (integro a Alliance pour um Monde Responsable, Pluriel et Solidaire e a Rede de Artista em Aliança pelo Reencantamento do Mundo. Esses intercâmbios se alicerçam no patrimônio de linguagens dos POVOS DA FLORESTA E AFRICANO-BRASILEIROS.
Rute Casoy organiza PORANDUBA, enaltecendo os valores e linguagens da floresta com a cumplicidade de lideranças “indígenas” como Ailton Krenak, Daniel Munduruku, Kaká Werá Jecupé, Cristino Wapixana, Álvaro Tukano, Fabiano Kaxinawá, Pajé Kaba Biboy Munduruku. Essas personalidades expoentes das comunalidades da floresta,protagonizam de modo extraordinário as narrativas características da história do seu povo.
É importante destacar também,a importância da trilha sonora que dão vida as narrativas contidas nos CDs, e que foram cuidadosamente criadas para os contextos de cada tema/história por Pedro Bernardes e Thiago Queiroz.Pude realizar essa audição com crianças, e fiquei feliz em perceber a curiosidade, prazer,e emoção ao ouvir cada história.
Rute Casoy teve o cuidado em apresentar minuciosamente no final do livro aspectos metodológicos importantes desdobramentos da sua trajetória na Roda de Histórias Indígenas:.um coletivo aberto que existe desde 1995.Tem como missão ressignificar a brasilidade,alimentar o imaginário,provocar reflexão,diálogo intercultural e solidariedade,através da narração de histórias e seus desdobramentos,em vivências lúdicas e criativas “
Para os educadores/as que acreditam na linguagem lúdico-estética como um canal valioso para transmitir conhecimentos e afirmar o direito à alteridade civilizatória dos povos indígenas, eis aqui uma obra impostergável para compor sua práxis.
Sabemos que a Lei 11.645/08 de 27 de março de 2008 institui a obrigatoriedade do ensino sobre história e cultura dos povos indígenas, e é bom identificar na composição poética milenar que Poranduba carrega, alicerces teórico-metodológicos capazes de promover espaços criativos de aprendizagem para crianças, jovens e adultos.
Poranduba transcende e recusa o recalque que insiste em estabelecer uma relação fixada nos conceitos finitos, a saber: “redescobrimento”, ”deslumbramento diante do outro”, ”identidades híbridas” e “sem fronteiras”.
Poranduba reconhece,legitima,afirma valores e linguagens milenares que atravessam a floresta, e vêm até nós, educadores/as, ainda confinados aos valores do mundo urbano-industrial e etnocêntrico anunciar outras perspectivas de vinculação humana.
Acreditamos que PORANDUBA se constituiu num legado fundamental para as gerações sucessoras, já que permite o conhecimento da história que caracteriza o que somos,nossas origens, nossos/as ancestrais e um dos suas principais heranças, a base de uma ética de futuro, para que a existência do planeta e todas as formas de vida que ele carrega, se expanda, deixando florescer o direito à alteridade das civilizações.

CASOY,Rute.PORANDUBA:roda de histórias indígenas. Rio de Janeiro:NAU Editora,2009.