Por Narcimária Luz
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Nzinga Ngola Bandi
Kiluanji a rainha do Ndongo independente. Conhecida como rainha Ginga, é
homenageada no Brasil nas Congadas e é o nome do movimento inicial e básico da
capoeira a Ginga.
Uma composição de Otis Redding de 1965
"Respect"(Respeito), recriada em 1967 por Aretha Franklin através de
uma interpretação com uma força expressiva inigualável, imprimiu a esse
clássico da música soul afro-americana, uma versão radical inspirada na efervescência
dos movimentos dos direitos civis e feminista da época.
Aretha Franklin
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"Respeito” atravessa os tempos, atualiza inquietações e questões urgentes
referentes a existência feminina em sociedades que se alimentam das relações
machistas, sexistas e preconceituosas que
incentivam atitudes desrespeitosas e de ódio contra as mulheres.
Sabemos que essas agressões que tendem a gerar
feminicídios, infelizmente acompanham a história da humanidade. Mas é
inconcebível nos acomodarmos ou mesmo aceitar de forma passiva as aberrações e
atrocidades que insistem em se manterem como imutáveis. Somos da geração de
mulheres que cresceram ouvindo canções como "Respect" e outras
canções que inspiraram insurgências femininas dramáticas,
capazes de afirmar agendas políticas contemporâneas fundamentais no mundo e no
Brasil.
No
âmbito dessas agendas políticas contemporâneas, há os mapas que abordam
aspectos da violência contra as mulheres e estatísticas que tentam compreender
as engrenagens perversas que vêm devastando a vida de tantas gerações. Uma
constatação: o conjunto dessas referências ficam frágeis se insistirem em
ignorar os direitos coletivos das mulheres.
" Xavante" foto Roberto Castro
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Sim, direitos coletivos! A noção de
direitos da mulher numa perspectiva individual, não consegue dar conta das
tensões e conflitos que caracterizam os valores civilizatórios,
territorialidades e comunalidades que organizam o viver cotidiano feminino
considerando a
diversidade
dos povos.
Homenagem as orixá das águas
Foto Hans Olubi
O
direito
individual é extensão de um tempo histórico e geopolítico urbano-industrial do
pós-guerra, totalmente alheio às reinvindicações legítimas daquelas que são
agredidas todos os dias pelo racismo institucionalizado, por exemplo.
Na
realidade brasileira o ideal de identidade nacional feminina para a elite que
está no poder, tende a se resumir a mulheres brancas, que vivem no centro sul, de
descendência europeia e de classe média ou alta. Mas o Brasil para desespero dessa
elite dirigente, é formado em sua maioria por uma população feminina
descendente de povos africanos e de povos indígenas também.
Escultura símbolo da sociedade secreta Ogboni. Casal unido por sucessão de elos representando continuidade e descendência.
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Essa descendência
feminina africana e indígena possuem valores civilizatórios que estabelecem
elaborações de mundo muito particulares, e que por isso mesmo, são
negligenciadas nos discursos saturados que orientam as políticas das
instituições do Estado. Nossas antepassadas africanas na Bahia do século XIX no
contexto da escravidão, identificavam as falácias desses discursos e costumavam
se referir a eles como: “conversa de branco” ou “para inglês ver”. Já percebiam
o quão distantes e totalmente opostos eles eram, em se tratando das distintas realidades
das mulheres das comunalidades africano-brasileiras.
É
comum os relatos de mulheres negras submetidas a laqueaduras sem serem consultadas,
violentando um direito ancestral: gerar filhos é PODER! Poder
que assegura a descendência e continuidade da existência civilizatória através
dos filhos. Num país que institucionaliza políticas genocidas e de abandono, as
mães negras têm esse direito negado. Outro problema ignorado pelo Estado:
lideranças religiosas que zelam pelo patrimônio da tradição africana terem seus
espaços sagrados violentados e sofrerem agressões e ameaças; mães em luto e
arrasadas pela violência institucionalizada pelos aparelhos do Estado que
ceifam a vida de seus filhos; ausência de políticas públicas de
saneamento básico visando a prevenção de
doenças que acometem a maioria das mulheres negras e suas famílias,
considerando também o comportamento racista no âmbito dos serviços públicos de saúde que pela displicência, tem condenado muitas mulheres a morte. Não podemos
esquecer também o direito ao território necessário que estrutura os vínculos de
sociabilidades das mulheres indígenas e quilombolas, direito que tem sido usurpado
por decretos arbitrários no Brasil. Outro aspecto importante é a
noção de “empoderamento feminino”, que precisa também acolher a perspectiva dos
direitos coletivos como falamos anteriormente e transcender a órbita
urbano-industrial eurocêntrica. Para além da desigualdade nas relações entre
homens e mulheres no que se refere ao poder, acesso a igualdade
de
salários no mercado de trabalho, ascensão em cargos eletivos no poder de
Estado, temos que considerar a trajetória de empoderamento feminino das nossas
antepassadas, que nos deixaram um legado de vanguarda.
Mãe Aninha Iyalorixá Oba Biyi
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Sempre
insisto em apresentar uma legenda que ilustra a força inesgotável do
empoderamento feminino das mulheres negras, protagonizando a expansão e
continuidade dos valores civilizatórios dos povos africanos no Brasil no âmbito
do contexto escravista e neocolonial.
Mãe
Aninha a Iyá Oba Biyi fundadora da comunidade-terreiro Ilê Axé Opô
Afonjá referência importante nas Américas anunciava com altivez no
início do século XX “A Bahia é uma Roma Negra”.
Ruth Landes
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Ruth Landes
,antropóloga americana que na década de trinta esteve no Brasil no seu livro A
Cidade das Mulheres, destacou que na Bahia:”... as mulheres negras encontraram
mais reconhecimento, do seu próprio povo... Uma distinta sacerdotisa chamou a
sua cidade de Roma Negra, dada a sua autoridade cultural; foi aqui que as
mulheres negras atingiram o auge de eminência e poder, tanto sob a escravidão
como após a emancipação. Controlando os mercados públicos, as sociedades
religiosas e também suas famílias”. (LANDES,1961:112)
Outra
legenda no contexto do empoderamento feminino na perspectiva africano-brasileira,
em do aprendizado que tivemos com o Mestre Didi. Na sua
convivência com Mãe Aninha, Mestre Didi, a ouviu dizer: “Quero ver nossas
crianças de hoje, no dia de amanhã de anel no dedo e aos pés de Xangô.” Naquela
época, Mãe Aninha já tinha percebido a importância de fomentar estratégias de
legitimação dos princípios e valores civilizatórios africano-brasileiros, no
âmbito das instituições do Estado, exigindo e assegurando
nesta relação o direito à alteridade civilizatória.
Esse
pensamento da Iyá Oba Biyi, é um manancial de altivez que mantermo-nos firmes
face ao desafio de tornar possível para as gerações sucessoras o acesso a
direitos coletivos que possam dar dignidade ao que somos como descendentes de
africanas e africanos. O “anel no dedo”, significa as possibilidades
de mobilidade social da população infanto-juvenil de descendência africana na
sociedade oficial -, e de outro, Xangô, orixá do fogo que assegura a vida no Aiyê,
a expansão de linhagens, da existência concreta ininterrupta, filhos,
descendência, ancestralidade, continuidade da comunalidade africano-brasileira,
presença transatlântica dos valores culturais.
Mãe
Aninha é um exemplo ímpar de empoderamento feminino, hoje ela integra a
corrente mítica das nossas mães ancestrais fontes de inspiração no que se
refere a
atualização e revitalização dos valores que caracterizam
a sociabilidade que vêm dinamizando as lutas de afirmação do patrimônio
africano no Brasil.
Tia Ciata Iyá Kekere
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Não
esqueçamos nossas ancestrais investiram toda a sua vida, sua existência na
continuidade do processo civilizatório africano. Não foram heroínas dentro do
enquadramento da historiografia neocolonial; não exerceram lideranças sindicais
se nos determos ao recorte limitado das lutas de classe; mas, podemos afirmar
que no âmbito de um contexto hostil colonial, investiram sua vida com sabedoria
e dedicação de forma visceral e comprometida com a expansão da pujança do continuo
africano-brasileiro.
Mãe Hilda Iyalorixá Igi Tolu
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Festa da Beleza Negra do Ilê Aiyê
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Então
empoderamento feminino é
sobretudo a afirmação do direito às formas de
elaboração de mundo, valores e singularidades histórico-políticas que
caracterizam a vida das mulheres brasileiras que se alimentam do
poder feminino ancestral. É preciso fomentar leis que sejam instrumentos que
rompam com os discursos saturados que invocam uma humanidade exógena ao que
somos como nação.
Salgueiro Porta bandeira e Mestre Sala.
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É
preciso reconhecer que só através do reconhecimento e legitimação de direitos
coletivos que carregam também a história das nossas antepassadas, fundadoras de
comunalidades, instituições, hierarquias, linguagens e valores ao longo dos
séculos submetidas a tantas adversidades, teremos a plenitude do empoderamento
feminino.
Salgueiro Ala das Baianas.
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Como
afirmou a memorável Mãe Beata de Yemanjá:
”Não basta tolerância, queremos respeito!”
R-E-S-P-E-I-T-O
é o que pedimos!
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