Por Marco Aurélio Luz
Elebogi ati Oju Oba
Cortejo Funerário ao Mestre Didi
O
que eu aprendi sobre Morte, orixá Iku foi na ambiência do culto aos Eungun,
ancestres e ancestrais masculinos , e do culto aos orixá, princípios e forças
cósmicas que regem o universo de acordo com nossa tradição religiosa nagô,
principalmente através da convivência com meu pai , o Alapini, sacerdote
supremo, Mestre Didi.
Foi
assim que aprendi que ye ati iku okan naa ni vida e morte são uma coisa só.
Quando viemos a esse mundo o aiye, já sabemos que um dia retornaremos ao orun, o
além.
Nós
só temos essa vida e temos que aproveitá-la da melhor maneira possível
aproveitando do destino que constitui nossa passagem, nossa viagem procurando o
nosso bem de estar nesse mundo.
De acordo com os itans os contos da cosmogonia,
escolhemos nosso destino antes de chegar nesse mundo. Pode-se escolher bons ou
maus destinos que regem Ori, a Cabeça e o Orí Inu o interior da Cabeça, nossa
parte interligada ao orun. A escolha depende da interação com Ajala, orixá
antigo que faz boas e más cabeças e pode ajudar em se optar por uma com um bom
destino que permita realizar a viagem sem muitas atribulações.
A
energia sagrada que dá dinamismo e impulsiona os destinos chamamos axé. O
conhecimento e o modo como se promove e se fortalece o axé é atribuição dos ilê
axé, as casas de axé onde se constitui a religião e se celebram os rituais
necessários e as iniciações sacerdotais.
O
axé é força vital circulante que pode aumentar ou diminuir conforme a
realização dos rituais que constituem a tradição religiosa.
Nessa
tradição quanto mais se cuida e se mantém os rituais necessários melhor será o
fluxo dos destinos. Manter a tradição é a forma de ter o axé dos destinos
individuais e comunitários fortalecidos.
Daí
que a participação comunitária é essencial na manutenção do ilê axé que garante
a dinâmica do ciclo vital.
A
comunidade é hierarquicamente organizada de acordo aos valores que visam a
proteger e expandir a tradição.
Iku,
Morte, orixá masculino não possui assentamento, está sempre em volta do mundo
realizando sua missão que é de promover as restituições. Vai-se para dar vez a
outros é como aprendemos.
As
restituições são das matérias que constituem nossos corpos de volta a terra,
ilé.
Um
itan, uma história conta que no inicio da criação, Oxalá pediu a colaboração
dos demais orixá para encontrarem a matéria capaz dele poder fazer os seres que
iriam habitar no aiye.
Oxalá suporta o mundo
Escultura de Mestre Didi
Depois
de muito procurarem e selecionarem encontraram o barro umedecido ou lama, enfim
água e terra. Após retirarem um pedaço que acharam ser a melhor matéria
primordial perceberam que a lama ficou vertendo água, ficou chorando. Então
resolveram devolver. Contudo um orixá, Iku resolveu levar um pedaço mesmo
assim. Oxalá ficou bastante satisfeito com a matéria, com a lama que iria
moldar a individuação dos seres, inclusive os seres humanos.
Todavia
quando contaram o que se passara ele então delegou a Iku a obrigação de
restituir a matéria para que sempre se tenha o necessário para garantir a
Existência.
Então
uma noção de justiça é de promover essa restituição. O orixá princípio dessa matéria
primordial, agua e terra é Nanan. Uma cantiga diz “ Salare Nanan olu odo” orixá
da justiça que promove as restituições. E ainda “Nanan iku re” Nanan é morte.
Fun
fun , a cor branca que representa a existência abstrata não concreta, não
individualizada, e azul escuro, equivalente a dudu a cor preta representa o
interior da terra onde se processa o mistério dos contínuos renascimentos.
Ibiri ati ejo Oxumaré
Escultura de Mestre Didi
Oxumare,
filho de Nanan rege o princípio dos renascimentos caracterizado pelo arco íris,
multiplicidade de cores diversidade da existência multiplicidade dos destinos
em contínuo ciclo vital, emerge da terra e a ela retorna.
Aqueles
sacerdotes que se dedicaram de “corpo e alma” através de sucessivas gerações na
manutenção e preservação da tradição fortalecendo o axé que permita o fluxo
tranquilo dos destinos serão cultuados como ancestrais e assim continuarão
colaborando com os rituais que constituem a religião. Nenhum ritual, mobilizador
de axé, se realiza sem a invocação dos ancestrais ilustres que integram a
constelação das entidades da comunidade. Nesse sentido os ancestrais nunca
morrem eles estarão sempre presentes na vida da comunidade religiosa.
No
culto aos Egungun a cada ciclo ritual do calendário litúrgico eles virão para
proteger e se divertir compartilhando a alegria da comunidade religiosa guardiã
das tradições em seu ritmo de existência para que esse mundo não se acabe.
Ao
encerrar convém ressaltar que por mais que se procure saber o que é Morte nós
não saberemos. Conviver com esse mistério do existir, esse não saber, é a
verdadeira sabedoria.
* Imagens da Internet
Alapini Àgbà Olori Òjè Ipikun Oiye! Mojuba iyn o!!!!
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