*

*

PRODESE E ACRA



VIDA QUE SEGUE...Uma
das principais bases de inspiração do PRODESE foi a Associação Crianças Raízes
do Abaeté-Acra,espaço institucional onde concebemos composições de linguagens
lúdicas e estéticas criadas para manter seu cotidiano.A Acra foi uma iniciativa
institucional criada no bairro de Itapuã no município de Salvador na Bahia, e
referência nacional como “ponto de cultura” reconhecido pelo Ministério da
Cultura. Essa Associação durante oito anos,proporcionou a crianças e jovens
descendentes de africanos e africanas,espaços socioeducativos que legitimassem
o patrimônio civilizatório dos seus antepassados.
A Acra em parceria com o Prodese
fomentou várias iniciativas institucionais,a exemplo de publicações,eventos
nacionais e internacionais,participações exitosas em
editais,concursos,oficinas,festivais,etc vinculadas a presença africana em
Itapuã e sua expansão através das formas de sociabilidade criadas pelos
pescadores,lavadeiras e ganhadeiras,que mantiveram a riqueza do patrimônio
africano e seu contínuo na Bahia e Brasil.É através desses vínculos de
comunalidade africana, que a ACRA desenvolveu suas atividades abrindo
perspectivas de valores e linguagens para que as , crianças tenham orgulho de
ser e pertencer as suas comunalidades.
Gostaríamos de registrar o nosso
agradecimento profundo a Associação Crianças Raízes do Abaeté(Acra),na pessoa
do seu Diretor Presidente professor Narciso José do Patrocínio e toda a sua
equipe de educadores, pela oportunidade de vivenciarmos uma duradoura e valiosa
parceria durante o período de 2005 a 2012,culminando com premiações de destaque
nacional e a composição de várias iniciativas de linguagens, que influenciaram
sobremaneira a alegria de viver e ser, de crianças e jovens do bairro de
Itapuã em Salvador na Bahia,Brasil.


sábado, 24 de maio de 2014

II MAIO NEGRO PARTICIPAÇÃO DO PRODESE


Decoração da sala Mestre Didi no Centro de Formação de Professores da UFRB

O PRODESE participou do Seminário  II MAIO NEGRO,evento promovido pelo Centro de Formação de Professores  da Universidade Federal do Recôncavo da Bahia- UFRB em Amargosa.A representação prodesiana, veio através da sua coordenadora  Doutora em Educação Narcimária Correia do Patrocínio Luz e do Doutor em Comunicação Marco Aurélio Luz, que  realizaram palestra na sala Mestre Didi, homenagem do Centro de Formação de Professores  da  UFRB ao saudoso Alapini,  artista, escritor e educador Deoscoredes Maximiliano dos Santos.




Mestre Didi
Grafite em homenagem ao Mestre Didi exposto na parede do Centro de Formação de Professores na UFRB

A temática proposta pela organização do evento foi: Ensino Superior Violências: Por uma Outra Epistemologia na Construção Curricular.

Plateia  
Destaque da esquerda para a direita a Professora Doutora Ana Rita Santiago Pró Reitora de Extensão da UFRB e o Professor Marcelo um dos organizadores do evento

Com o auditório lotado, a professora Rosângela Souza da Silva coordenadora da mesa, apresentou a Doutora Narcimária e  o Doutor Marco Aurélio Luz,destacando o currículo de ambos que constituem a importante trajetória desses dois  intelectuais e  escritores no cenário acadêmico.

Professora Rosângela Sousa coordenadora da mesa e uma das organizadoras do evento
Na mesa escultura Exu Odara de Marco Aurélio Luz
  
Após saudar o público, Marco Aurélio Luz  iniciou a sua apresentação com  a um trecho da série de programas de TV Negro Hoje (1981) Secneb/TVE, com o  filme de Nelson Xavier e Cecília Conde que se refere a diferença musical entre as crianças moradoras do morro de Mangueira e as propostas da escola local.
 O filme destaca a dinâmica cultural, gestual, das brincadeiras das crianças, em confronto com a apatia das crianças na escola submetidas  as ordens das professoras.

Professor Doutor Marco Aurélio Luz


Marco Aurélio  aprofundou então,as diferenças de formas de comunicação presentes na cultura africano-brasileira e a escola, um sistema de ensino da cultura européia.
Demonstrou que a primeira, se vale da tatilidade isto é, da combinação de todos os sentidos para constituir o acesso ao saber, ao sistema simbólico. Também a expressão corporal, se vale das danças e dramatizações, corpo em movimento estético promovendo beleza encantamento e alegria. A presença da variedade das cores constituindo códigos e repertórios. Odara, palavra nagô que quer dizer bom e bonito simultaneamente, a busca de estar bem neste mundo.
Nesse universo, a religião é fonte e desdobramento do saber, incluindo a relação entre esse mundo e o além, aiyê e orun respectivamente. As entidades do mundo dos ancestrais e das que governam a natureza. Nesse contexto onde o ser é, e o não ser também é,  acontece a interação com o mundo invisível e dos acontecimentos imponderáveis.
O mito é o discurso da sabedoria por excelência, da revelação oracular, do curso das oferendas, a restituição, a mobilização do ciclo vital do axé,  força e energia do universo, da existência.
Desde a religião se desdobram inúmeras instituições que convencionamos chamar de cultura negra.
Já na cultura europeia, predomina a hiper valoração da relação de um só sentido: a visão com o cérebro,
 um desdobramento da escrita como forma predominante de comunicação. Desde a religião que se sustenta no livro sagrado, até a escola religiosa ou laica derivada da estrutura dos mosteiros e conventos.
O solipsismo, o individualismo solitário, o sujeito e o livro impresso, o silêncio das bibliotecas, as aulas do professor como extensão da escrita e dos livros. A arquitetura encapsulando todos nas salas de aula, o exercício do corpo inerte nas carteiras em silêncio. Cores neutras, cinzas, visando afastar as emoções predomínio absoluto da razão, terreno do cartesianismo, da matemática, pura abstração "rainha das ciências", positivismo conteano.
 Aprofundando ainda esses entulhos ideológicos,  Marco Aurélio destacou a ideologia da superioridade dos discursos, o científico acima de todos, evolucionismo eurocêntrico onde brotam as discriminações os preconceitos e o racismo.
Todo edifício escolar voltado para atender aos comportamentos necessários a suprir as relações de produção industriais, atender aos valores do produtivismo, da incessante acumulação de capital.

Em 1804 foi proclamada a independência do Haiti com a derrota das tropas de Napoleão Bonaparte comandadas por seu cunhado Leclerc, frente as aguerridas forças militares dos quilombolas comandados por Dessalines. A França perdia a principal colônia, a mais lucrativa da Companhia das Índias Ocidentais.
Anteriormente dois fatos históricos relevantes da luta de libertação da escravidão aconteceram: a manutenção da independência do Ndongo (Angola) da rainha Ginga, frente aos portugueses e o quilombo-reino dos Palmares em Pernambuco. Esses fatores desestruturaram o tráfico triangular Europa-Angola-Pernambuco. Essa situação fez também com que os holandeses já instalados em Pernambuco, contivessem a sua cobiça.


Monumento em Angola, homenagem a rainha Nzinga Nbandi Kiluanji soberana do Ndongo e Matamba

Diante disso, os ingleses que já tinham perdido metade da Jamaica e percebiam a pujante presença de africanos e seus descendentes nas Américas,preocupados em não  "perderem os anéis" e "manterem os dedos" já controlando a política do mercantilismo, implementaram uma nova estratégia colonial. A primeira medida, visava cessar a vinda de africanos, fim do tráfico escravista; a segunda, o incentivo da imigração de europeus assentando colônias não só de exploração, mas também de povoamento como foi  o Brasil e a África do Sul. Veio a independência formal da colônia, dependência real para a Inglaterra, e então, a abolição da escravatura acompanhada da proclamação da República.
Durante o período escravista, a Inglaterra se sobressaiu também pela manufatura de bens necessários ao tráfico triangular, principalmente navios e armamentos. Ela continua como principal fornecedora de bens manufaturados, detentora do capital financeiro mantém as ex-colônias sob o jugo do capital. É o neocolnialismo
Depois da abolição da escravatura no Brasil, inicia-se a construção do edifício ideológico do racismo.
A Europa fornece os subsídios ideológicos para ¨cientistas¨ como Nina Rodrigues e Arthur Ramos, os mais famosos, elaborarem e divulgarem as  falsidades "científicas".
O primeiro, "um gênio do mal", médico psiquiatra, no início do século passado elaborou uma ideologia teórica em que aproximava a manifestação de entidades da religião africano-brasileira pelas sacerdotisas, à histeria, patologia que acometia o gênero feminino (hister significa útero).
A manifestação de entidades, um aspecto culminante da liturgia que realiza a aproximação desse mundo com o além e proporciona a comunicação do sagrado, constitui o âmago das religiões tradicionais.
Desqualificadas pelo ideólogo Nina Rodrigues, essa falsidade teórica ideológica, promove e alimenta a Razão de Estado na realização da política de embranquecimento . Mas não só tenta desqualificar a religião, mas também toda população negra.
Adiante em meados do século XX, o psicanalista Arthur Ramos reformula o preconceito, agora não mais o negro que possui uma tendência patológica,"mente fraca", mas sim, sua cultura especialmente  a religião que se assenta em "mitos neurotizados".
Ele cria programas de eugenia educacionais, juntamente com o educador Anísio Teixeira para retirar as crianças negras dessas religiões e tradições,na tentativa de fazê-las   renunciar a civilização de seus ancestrais, ou sofrerão a rejeição do establishment.
Uma vez superado esse entulho ideológico porém, é possível vislumbrar a riqueza cultural de nossa civilização africano-brasileira.

Após  abordagem do professor Marco Aurélio Luz, a professora Rosângela coordenadora da mesa, passou a palavra para a Doutora Narcimária.
Ela retomou a crítica da ideologia do recalque, porém focalizando diretamente no sistema oficial de ensino e sua política de embranquecimento  e suas  classificações racistas, em que a criança negra era destituída da sua alteridade civilizatória,para ser tratada na sociedade colonial como  " ingênuo".


Professora Narcimária C.P. Luz
.
Professora Narcimária.se referiu à fundação da Escola Normal da Bahia, sintomaticamente criada em 1835 logo após a chamada Revolta Malê ocorrida em Salvador e Recôncavo, com participação significativa dos nagô.
A Escola Normal que se propõe a formar as professoras, se constitui nos moldes da École Normal de Paris desde a arquitetura, aos métodos e conteúdos do ensino.
Essa instituição visava a formação de professores que contribuiriam para a construção de uma nova sociedade cujo caminho, já estava  traçado pelas elites coloniais da França e sobretudo da Inglaterra.
A Escola Normal então, é um esboço do papel da educação no neocolonialismo nascente. Livre da escravatura, a população negra e aborígine estaria "livre de tudo",longe dos direitos da cidadania emergente das revoluções burguesas. Esses direitos estarão apenas contemplando a elite neocolonial, que detém a propriedade dos meios de produção, o capital financeiro, produtivo e comercial e a burocracia que sustenta o bloco no poder de Estado garantidos pela força pública.
A epopeia de Canudos é um exemplo da sociedade em transformação com a proclamação da República.
Ilustrando com  textos e discursos de educadores como Isaías Alves e Anísio Teixeira, a professora Narcimária demonstrou  o alijamento do sistema oficial de ensino ao contínuo civilizatório africano-brasileiro, que sofre a rejeição das falsidades ideológicas produzidas pela academia, e que se espalham pelos órgãos de comunicação, Aparelhos Ideológicos de Estado, como diria Althusser em seus períodos de lucidez, e espalham pela sociedade estruturada pela política de  embranquecimento, estereótipos e preconceitos, enfim a malha do racismo.
.
O público então acompanhou a ilustração de  uma entrevista de Mãe Hilda Jitolú, fundadora do Ilê Aiyê e da escola que leva o seu nome, sua indignação e altivez ao enfrentar a discriminação sofrida por sua filha pela professora Carmem Teixeira(diretora da Escola Parque e irmã de Anísio Teixeira), quando pediu explicações sobre as avaliações do final do ano letivo e  em certo momento da conversa, a professora Carmem expressou:
"- É. Agora a gente não acha mais  empregada doméstica..."
Após  ilustrar a pedagogia do embranquecimento e as angústias que provoca entre gerações de descendentes de africanos, Narcimária se referiu a forma espiralada de estruturação do pensamento africano tradicional. Dá como exemplo a arquitetura urbana de Ilé Ifé cidade sagrada original do povo nagô yoruba. No centro o mercado  local das trocas de bens e de sociabilidade. Em frente o palácio do Oni. Depois em ordem de antiguidade as moradias das primeiras famílias e linhagens em forma sequencial de espiral.
Após ela cita algumas experiências educacionais pioneiras na constituição de , uma educação pluricultural que acolha as linguagens e os valores do contínuo civilizatório africano-brasileiro. 
Destacou primeiramente a Mini Comunidade Oba Biyi, experiência pioneira de Educação Pluricultural (1976-1986) realizada pela então SECNEB Sociedade de Estudos da Cultura Negra no Brasil no Ilê Axé Opô Afonjá.
A Mini Comunidade possuía o nome de Oba Biyi em homenagem a fundadora do terreiro Mãe Aninha. Seu nome sacerdotal do seu Xangô Afonjá, Oba Biyi significa o rei nasce aqui.


Mãe Aninha  Iyalorixá Oba Biyi

A experiência nasceu inspirada numa frase de criança,quando foi indagada  sobre o porquê de não frequentar a escola do bairro:
- Não gostam da gente lá .
Também no desejo expresso por Mãe Aninha de "ver as crianças de hoje, no dia de amanhã de anel no dedo e aos pés de Xangô..."
Quer dizer:o anel símbolo da formatura universitária e mantendo-se inserida na sua tradição.
Priorizando os valores e a linguagem comunitária, o curriculum da Mini Comunidade Oba Biyi, se estruturou a partir dos  contos dramatizáveis de Mestre Didi, que inspirava a  prática pedagógica. As formas estéticas e o conhecimento da cultura da comunidade, sobredeterminavam os planejamentos docentes e eram   assuntos de inúmeras reuniões pedagógicas onde se realizava formas de desrecalcar as professoras envolvidas na Mini. Em 2007 Deoscoredes M. Dos Santos e Marco Aurélio Luz publicaram o livro "O Rei Nasce Aqui OBA BIYI" que apresenta com detalhes essa primeira experiência de educação pluricultural no Brasil.



Mestre Didi no Festival de Arte Integrada da Mini Comunidade Oba Biyi




Auto coreográfico A Chuva dos Poderes de Mestre Didi

A experiência alcançou muito sucesso e inspirou várias outras, como o Odemodé Egbé Axipá(1999/2000-2002-2003) e a ACRA, Associação Crianças Raízes do Abaeté(2005-2012).
O Odemodé Egbé Axipá, atendeu  jovens das comunidades terreiro proporcionando a formação novas tecnologias através da parceria entre  o PRODESE, a Escola Técnica atual CEFET e o  Núcleo de Tecnologias-NETI do Departamento de Educação do Campus I da UNEB.
Sediada no Parque Metropolitano do Abaeté, a Associação Crianças Raízes do Abaeté na direção do ilustre educador Narciso José do Patrocínio, estruturou suas práticas socioeducativas envolvendo as linguagens da  capoeira, dança, teatro, grafite, música, inglês, biblioteca etc.


Iº Festival Afrobrasileiro  da ACRA 
Apresentação d o autocoreográfico "Itapuã a Canção do Infinito" de Narcimária Luz.
 Participantes com o professor Sidnei Argolo

Convém ressaltar as viagens de intercâmbio entre os integrantes da ACRA, e o grupo de capoeira ABOLIÇÃO em Oxford na Inglaterra se estendendo a um núcleo na cidade de Hamburg na  África do Sul, sob a coordenação do Contra Mestre Luís Negão idealizador da ACRA.
Por fim, a professora Narcimária ressaltou o impacto da experiência da Mini Comunidade OBA BIYI na FACED Faculdade de Educação da UFBA e no Departamento de Educação da UNEB, onde foram realizados inúmeras dissertações de mestrado e teses de doutorado além da implantação de disciplinas na graduação,pós-graduação, linhas de pesquisas e inspirando inúmeros seminários,palestras e mesas,a exemplo da mesa proposta para o II Maio Negro/2014: Ensino Superior Violências: Por uma Outra Epistemologia na Construção Curricular.

Participação do professor Marcelo abrindo o debate sobre a abordagem da mesa



Graduanda abrindo os trabalhos do evento com um texto produzido em sala sob a coordenação da Professora Rosângela 


Ao centro Professor Kleison Assis  que incentivou a homenagem ao 
Mestre Didi no Centro de Formação de Professores da UFRB




Lançamento do livro AGADÁ




A sanfona também regou o evento

Da esquerda para a direita:Professora kiki,Graduanda,Professora Rosângela,Professora Fernanda ambas organizadoras do evento,Professor Marco Aurélio e Professora Narcimária. 

Nenhum comentário:

Postar um comentário